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Um feminicídio nunca vem só

Um feminicídio nunca vem só

O feminicídio é uma palavra horrível.

Soa mal e significa pior. Mas tem uma vantagem: especifica quem foi

a vítima do crime quando é importante saber quem foi a vítima do crime. Uma mulher. Não é facto anódino. Uma …

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Requisição civil: o pior ainda está para vir

Requisição civil: o pior ainda está para vir

Enfermeiros preparam novo protesto, ‘imune’ a serviços mínimos ou imposições do Governo: faltar ao trabalho e bloquear hospitais

A greve dos enfermeiros só vai parar temporariamente enquanto durar a requisição civil. Nas redes sociais está já a ser discutida a retaliação ao Governo, desta vez sem possibilidade de decretar serviços mínimos ou impor o regresso ao trabalho. O plano é aproveitar os cinco dias consecutivos, ou dez alternados, que a lei permite que possam faltar sem justificação para paralisar os serviços. Especialistas em direito administrativo garantem que não há como o impedir.

Ainda sem pormenores sobre que enfermeiros, em que número e quais os serviços a bloquear, a estratégia consiste em utilizar um direito dos trabalhadores contra o próprio Estado. A lei permite anualmente cinco faltas seguidas ou dez intercaladas sem justificação formal – alegando uma reunião na escola do filho, uma indisposição ou uma avaria no carro, por exemplo eos enfermeiros planeiam utilizar esses dias para faltas ‘cirúrgicas’ que impeçam a normal prestação de cuidados. Basta a ausência de um numa equipa de cirurgia para que a intervenção fique por realizar.

As faltas ao trabalho, mesmo que concertadas por um número elevado de enfermeiros, não são uma greve e, como tal, não são suscetíveis à imposição de serviços mínimos nem permitem a requisição civil – que na enfermagem não era

Marinho e Pinto e Rogério Alves, ex-bastonários da Ordem dos Advogados (OA), têm posições opostas sobre o braço de ferro entre António Costa e a bastonária dos enfermeiros, Ana Rita Cavaco. “O primeiroministro e a ministra da Saúde têm toda a razão. A Ordem dos Enfermeiros está a portar-se como um sindicato, o que lamento”, diz o atual eurodeputado, lembrando que a uma ordem profissional estão legalmente vedadas condutas e comportamentos de natureza sindical. Marinho e Pinto recorda-se de que no seu mandato à frente da OA houve um movimento de advogados que queria levar a cabo uma greve às defesas oficiosas. “Até tinham razão, mas opus-me já que a paralisação iria causar prejuízos aos cidadãos.” E defende: “Uma ordem deve defender a credibilidade pública e não o economicismo das reivindicações sindicais.” Em sentido contrário, Rogério Alves entende que o Governo está a baralhar o plano político com o jurídico ao ameaçar a Ordem dos Enfermeiros com uma queixa na Justiça. “Não encontro fórmula jurídica que ponha em causa a posição da senhora bastonária.” O advogado é perentório: a Ordem dos Enfermeiros “não extravasou” as suas competências legais. “A greve foi convocada pelos sindicatos e a Ordem tem tido uma posição pública de compreensão e solidariedade para com os enfermeiros.” H.F. decretada desde 1976, quando a contestação da classe encerrou o Hospital de Santa Maria, em Lisboa. Ou seja, não haverá forma de travar o protesto.

“As instituições não terão como se preparar. Organizadas em teia, as faltas podem levantar suspeitas, mas o processo [para o provar] é tão burocrático que é impossível agir em tempo útil”, garante Dantas Rodrigues, especialista em Direito Administrativo. Opinião semelhante tem Henrique Salinas: “O problema será sempre a prova e a carga burocrática é gigantesca. Os enfermeiros obtêm o resultado que pretendem e não sei como é que, neste caso, o Governo os vai buscar a casa. Será dramático”, alerta.

A estratégia foi inicialmente pensada durante o protesto de zelo dos enfermeiros parteiros em 2017 e foi recuperada nos últimos dias nas redes sociais – onde nasceram os maiores protestos da enfermagem, a greve cirúrgica e o boicote nos blocos de partos – assim que surgiram os primeiros sinais de que a requisição civil poderia avançar. A Associação Sindical dos Enfermeiros Portugueses (ASEP) e o Sindicato Democrático dos Enfermeiros (Sindepor), que convocaram a greve cirúrgica, e a própria Ordem já receberam várias comunicações informais de que as faltas ao trabalho podem mesmo ser o próximo passo logo que termine a requisição civil imposta, para já, até ao final do mês em sete hospitais – Centro Hospitalar Universitário de São João, Centro Hospitalar Universitário do Porto, Centro Hospitalar de Entre o Douro e Vouga e Centro Hospitalar de Tondela-Viseu.

A acusação de incumprimento dos serviços mínimos é vista pelos sindicatos como um argumento preparado pelo Governo para justificar o fim da paralisação e já mereceu uma queixa na Procuradoria-Geral da República por boicote à greve. Em causa está o que dizem ser uma interpretação abusiva do Ministério da Saúde sobre os serviços indispensáveis. Os únicos números revelados até agora pela ministra Marta Temido – que os hospitais se recusaram a dar ao Expresso – indicam apenas que nos dois primeiros dias de greve foram canceladas 645 cirurgias, 57% do total agendado, sem precisar quantas em oncologia ou pediatria.

Os relatos de operações adiadas a doentes com cancro, por exemplo, têm-se sucedido. Um médico colocou até no Facebook o relato do caso de uma doente sua, com 76 anos, que estava internada para uma operação a um cancro do cólon e teve de ir para casa aguardar por uma nova data.

As denúncias não demovem os sindicatos, que garantem que os cancelamentos foram ‘armadilhados’, com a marcação para o mesmo dia de vários doentes que já estavam no limite do prazo máximo para serem operados. Ou seja, mesmo que não houvesse greve, seria impossível realizar todas as cirurgias no tempo previsto. Por isso, alegam, a responsabilidade pelo incumprimento dos prazos não lhes pode ser atribuída e, como tal, a requisição civil é ilegal. O advogado do Sindepor, Garcia Pereira, interpôs já um procedimento cautelar, uma intimação para proteção de direitos (no caso, à greve) no Supremo Tribunal Administrativo. A diligência não suspende a requisição dos profissionais, mas obriga o juiz a pronunciar-se sobre a legalidade da medida do Governo, no prazo máximo de 14 dias. Vera Lúcia Arreigoso

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A CADA 20 MINUTOS É FEITA UMA NOVA QUEIXA

A CADA 20 MINUTOS É FEITA UMA NOVA QUEIXA

Em 2018, as denúncias de violência doméstica atingiram um dos valores mais altos de sempre. Governo promete €300 mil para mudar cultura machista junto das crianças
Texto Carolina Reis e Hugo Franco
ano passado, a Procuradoria-Geral da República iniciou 29.734 inquéritos por crimes de violência doméstica. São 81 por dia, três por hora, um a cada vinte minutos. É um dos valores mais altos de sempre e representa um aumento de 11% em relação a 2017, ano em que foram apresentadas 26.713 queixas.

“É muito positivo que estejam a aumentar as denúncias. É o resultado de campanhas maciças de sensibilização. Espero é que não venham a morrer na praia”, diz ao Expresso Helena Martins Leitão, a procuradora que integra o grupo de peritos do Conselho da Europa que acompanha o cumprimento da Convenção de Istambul, no que diz respeito à prevenção e combate à violência contra as mulheres, que Portugal ratificou em 2014. Mas a maioria dos processos acaba mesmo por não chegar a tribunal. Foi o que aconteceu com a denúncia feita por Sandra Cabrita, mãe da menina de dois anos morta esta semana pelo pai (ver texto ao lado). É uma das 20.990 queixas arquivadas no ano passado.

Em 2017 (último ano para o qual há dados finais, uma vez que todos os processos já foram concluídos), das 26.713 queixas apresentadas apenas 4465 (17%) deram origem a uma acusação do Ministério Público (MP). Dessas, 1457 terminaram em condenação, mas a esmagadora maioria dos agressores ficou com pena suspensa.

Só 119 homens foram condenados a prisão efetiva (8%) – ver infografia. A falta de provas e o facto de as vítimas muitas vezes desistirem de testemunhar em tribunal por medo das represálias são os principais motivos que levam a uma elevada taxa de arquivamento. “As falsas denúncias situam-se entre os 2% e os 3% e são facilmente detetáveis durante a investigação criminal”, assegura Daniel Cotrim, psicólogo e assessor técnico da direção da Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV).

Numa altura em dispararam as denúncias, subiu também o número de mulheres assassinadas pelos companheiros ou ex-companheiros. No ano passado, depois de três anos consecutivos a descer, os femicídios voltaram a aumentar. Morreram 28 mulheres às mãos dos homens. Este ano, só nos primeiros 40 dias, já foram mortas dez.

Há mais mulheres a ganhar coragem para apresentar queixa e romper com o agressor, o que faz aumentar o nível de violência e risco. Dalila Cerejo, do Observatório Nacional de Violência e Género (ONVG), lembra que os homicídios no contexto da violência doméstica ocorrem habitualmente depois de as mulheres decidirem romper a “complexa teia de agressões” de que são alvo durante anos. “Não é por acaso que os homicídios surgem na fase de separação e quando os homens perdem os mecanismos de controlo.” Ficar sem a mulher é sentido como um “terramoto” que ameaça a “honra do macho latino”. A especialista traça três perfis de agressores em contexto doméstico e lembra que a grande maioria não tem qualquer distúrbio ou patologia. “Só exercem o seu poder no espaço da casa, da intimidade.” Fora dela, aparentam ser cidadãos comuns.

A violência é fruto de uma cultura patriarcal e machista. “É uma herança da ditadura. Mas está em curso uma mudança. É perigoso o discurso de que há ineficácia no sistema. Isso retira confiança às vítimas. Até tenho medo de pensar qual seria a realidade se nada tivesse sido feito”, diz Sofia Neves, investigadora do Observatório da Violência no Namoro.

Elisabete Brasil, do Observatório de Mulheres Assassinadas, salienta que este crime assenta numa grande discriminação que a sociedade ainda legitima, às vezes sem se aperceber. Para inverter a tendência é necessário que se intensifique a aposta na educação. “É a chave, o grande motor para a mudança. Temos de começar a ensinar as crianças na área da igualdade de género, da tolerância, dos Direitos Humanos.” Para a ativista, é urgente fazer um investimento na formação de professores. “As políticas públicas são mais bonitas no papel do que na sua execução.”

Manuel Lisboa, diretor do ONVG, concorda e diz que é precisa uma avaliação mais precisa do que está a ser feito. “Há melhorias significativas, mas há coisas que têm de ser alteradas para que todo o sistema funcione em rede.” Alertando que há “muitas mulheres que estão a morrer aos poucos”, o sociólogo sublinha que se vive “uma guerra civil quotidiana”. E sublinha que este é um problema “social e cultural” que levará “várias gerações” a ser resolvido. “Quanto mais cedo for feita a intervenção melhor. Prevenir no namoro é prevenir na idade adulta. A Estratégia Nacional terá de ser avaliada para se saber o que está a funcionar”, sustenta Sofia Neves.

Num ano que começou negro – e obrigou a uma reunião de urgência do Governo com o MP – o Executivo anunciou uma nova equipa técnica multidisciplinar que irá reforçar medidas, já existentes, no âmbito deste crime, como a formação das forças de segurança e dos magistrados ou os mecanismos de proteção das vítimas nas 72 horas após a queixa. Será avaliado o impacto das medidas aplicadas aos agressores. Neste momento, cumprem pena 680 reclusos pelo crime de violência doméstica.

Fonte oficial do gabinete da ministra da Presidência e da Modernização Administrativa, que tutela esta área, adianta que a aposta é “num trabalho de prevenção integrado, que abrange não só ações de sensibilização para crianças e jovens, bem como programas de prevenção”.

O Governo salienta que em 2018 foram formados, ao abrigo de diferentes projetos, mais de dois mil professores e que a disciplina Cidadania e Desenvolvimento, comum a todos os níveis de ensino, tem a igualdade de género, a violência contra as mulheres e a “masculinidade violenta” como temáticas obrigatórias. E foram apoiados 19 projetos na área da violência no namoro em centros educativos e escolas.

A guerra que matou Lara

Meses depois de ter sido arquivada a queixa da mãe contra o ex-companheiro, a PSP foi chamada para resolver novo conflito

A PSP voltou a casa de Sandra Cabrita, dois meses depois de a empregada comercial ter desistido da queixa-crime contra o ex- -companheiro Pedro Henriques por coação e ameaças agravadas. Foi uma nova discussão por causa da guarda da filha Lara, de dois anos, que levou a polícia ao andar no Seixal.

O caso seria sanado sem recurso a tribunal, mas mostra que a paz entre o ex-casal foi efémera.

A 20 de janeiro de 2018, Sandra Cabrita tinha ido à PSP de Cruz de Pau para retirar a queixa por ameaças e coação. A mulher ficou com a guarda provisória de Lara e, por estar esperançada de que o ex-companheiro viesse a ter “um comportamento mais correto”, disse à polícia que queria desistir da denúncia que tinha feito em dezembro de 2017.

O procurador encarregado do processo, Joaquim Pedro Pereira, não aceitou a desistência da queixosa, já que os crimes de coação e ameaças agravadas são públicos e não dependem de queixa. Mas acabou por arquivar rapidamente a denúncia, alegando não haver “indícios” que sustentassem as suspeitas. Apesar de o caso ter sido classificado de “elevado risco” pela PSP, o procurador argumentou que Sandra Cabrita “não chegou, inclusive, a confirmar a factualidade denunciada” e, além de arquivar o processo, retirou-lhe o estatuto de vítima, impossibilitando qualquer tipo de proteção policial. Antes de retirar a queixa, Sandra Cabrita disse por duas vezes à PSP que era vítima de violência “psicológica e social” e que sofrera “ameaças de morte” que foram estendidas à mãe: “Eu posso não ficar com a menina, mas vocês também não ficam, eu mato-vos, a ti e aos teus pais”, ter- -lhe-á gritado o ex-companheiro. Pedro Henriques tinha armas de fogo, roubou a Sandra cartões de crédito e chegou a raptar a filha durante 20 minutos no shopping do Seixal enquanto a mãe se encontrava a levantar dinheiro no Multibanco.

Perante este cenário, a polícia gizou um plano de segurança à mulher que, no entanto, nunca chegou a entrar em ação.

Um ano depois, e numa altura em que a guarda da criança continuava a ser discutida no Tribunal de Família, Pedro Henriques matou a ex-sogra na passada segunda-feira, após mais uma discussão no momento em que entregava a criança.

Nessa mesma noite, Sandra Cabrita e o pai refugiaram-se durante três horas na esquadra de Cruz de Pau. “Ela sabia que Pedro ia matar a filha por temer perder o caso em tribunal. Estava aterrorizada”, conta uma fonte policial.

A mulher estava igualmente revoltada com o rumo que o caso estava a tomar no Tribunal da Família e Menores do Seixal. Sandra queria ficar com a filha em regime de exclusividade, alegando que o ex-companheiro não tinha condições psicológicas e monetárias para tomar conta de Lara. Mas os argumentos não pareciam estar a surtir efeito. “Garantiu que o juiz desvalorizava sistematicamente tudo o que que dizia”, revela a mesma fonte.

Nessa noite, madrugada e manhã, a operação policial acabou por falhar em toda a linha, apesar de uma caça ao homem “de grandes proporções” feita por agentes da PSP e inspetores da PJ que tentaram tudo para encontrar Lara ainda viva.

As autoridades estavam convencidas de que Pedro Henriques se encontrava algures na Margem Sul, a poucos quilómetros da residência da ex- -companheira. Estavam equivocadas, pelo menos em parte.

Às 8h35 de terça-feira, o ex- -segurança ligou para o INEM a anunciar que a criança estava morta na mala do carro junto ao McDonald’s e à estação de comboios de Corroios e que se iria matar. O carro foi encontrado com o corpo da bebé na bagageira. Não tinha sinais de violência. Lara terá sido asfixiada pelo pai, que fugiu do local do crime abandonando o carro e a filha.

A triangulação das antenas de telemóvel indicou que, afinal, se encontrava na região de Tomar, a 200 quilómetros do local. Quando chegaram a Castanheira de Pêra, a casa dos pais de Pedro Henriques, já o duplo homicida tinha posto termo à vida, deixando um bilhete a culpar a mulher pelos crimes.

A morte de Lara, a décima vítima de violência doméstica deste ano, chegou ao Parlamento e o Ministério da Justiça, a Administração Interna e a PGR prometeram “agilizar”, dar “formação” e “aperfeiçoar” a luta contra este crime. HUGO FRANCO e RUI GUSTAVO

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Contas à moda do Tribunal

Contas à moda do Tribunal

O convite aos senhores juízes do Tribunal de Contas (TC) segue implícito: oferece-se visita ao país real, o país daqueles quem vivem e sobrevivem fora da geometria do Campo Pequeno e de outros Paços em volta.

Qualquer ju…

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