No 30º aniversário da MEDEL – Magistrats Européens pour la Démocratie et les Liberté
Em junho de 1985, um grupo de magistrados europeus – juízes e procuradores – fundou a MEDEL – Magistrats Européens pour la Démocratie et les Libertés, baseados na forte crença de que uma Europa unida não se poderia limitar à liberdade de mercado, mas tinha de ser fundada nos direitos fundamentais e no Estado de Direito, em sociedades democráticas.
Trinta anos depois, a Europa mudou de maneiras que eram então dificilmente imagináveis – regimes totalitários caíram, a democracia alastrou, as fronteiras foram abertas e vários novos Estados-Membros aderiram à União Europeia. No entanto, a proteção e promoção dos direitos fundamentais continua ainda hoje a ser, como era então, uma luta contínua e essencial, visto que nem sempre a evolução no sentido de uma administração democrática se deu como deveria.
Por uma Europa baseada na solidariedade
No preâmbulo da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, é afirmado que “a União funda-se nos valores indivisíveis e universais da dignidade humana, liberdade, igualdade e solidariedade” e que “o gozo destes direitos implica responsabilidades e deveres para com os outros, a comunidade humana e as futuras gerações”.
Solidariedade não deve ser uma palavra sem sentido – as políticas europeias devem respeitar este princípio consagrado na Carta. Nessa medida, as instituições europeias e os governos não devem impor aos Estados-Membros e às populações políticas antidemocráticas que violam direitos fundamentais – nomeadamente direitos sociais que foram conquistados após longos anos de luta – ou condições que possam levar à humilhação de nações inteiras, privando-as das suas riquezas nacionais e da esperança de construir uma vida digna no seu país.
As instituições europeias não podem promover reduções de salários e cortes de benefícios sociais para os trabalhadores e não podem prejudicar o futuro das gerações futuras, mantendo-se em silêncio quando as empresas usam paraísos fiscais – alguns no seio da UE – e os bancos e os lucros financeiros são mais protegidos do que os povos europeus.
A Europa precisa de um “New Deal”, que poderia assumir a forma de uma garantia jurisdicional dos direitos sociais fundamentais.
Como a MEDEL apontou em 2012, no manifesto de Vilamoura, os problemas atuais da Europa não surgiram devido à implementação dos direitos sociais – a crise económica não pode justificar uma reconsideração das conquistas sociais.
Por uma Europa baseada na dignidade
A Europa deve ser um lugar de diversidade cultural e de liberdade para todos, independentemente da sua origem, nacionalidade, origem étnica, religião ou orientação sexual.
As políticas europeias devem contribuir ativamente para a criação de condições sociais justas e iguais para todos aqueles que vivem e trabalham na Europa, incluindo os imigrantes que aqui procuram uma vida melhor e um futuro de paz. As instituições europeias não podem continuar a assistir passivamente à tragédia se desenrola nas suas praias.
Como a MEDEL afirmou em 2013, o foco da política europeia de imigração não deve ser exclusivamente a segurança, mas principalmente razões humanitárias, que exigem a adoção de regras claras e justas sobre imigração ao nível europeu.
A luta pela dignidade é uma luta por toda a humanidade.
Por um Espaço Comum de Justiça
O respeito pela democracia e pelo Estado de Direito e a proteção e a promoção de um Poder Judicial independente estiveram sempre entre os principais objetivos da MEDEL. Só com um Poder Judicial independente, administrando um serviço de justiça acessível e eficaz, os direitos fundamentais dos cidadãos podem ser ativamente protegidos e assegurados.
Como a MEDEL sublinhou no apelo lançado em Maio de 2014, o direito a aceder a tribunais independentes também é um direito fundamental. A Europa unida deve ser construída com base nos direitos dos cidadãos, aplicados por uma justiça independente e não sobre a desregulamentação orientada pelos mercados.
Estes direitos fundamentais e as liberdades democráticas só serão preservados através de uma estrita separação entre o Poder Executivo e o Poder Judicial. Todas as medidas que afetem as liberdades, incluindo as medidas de vigilância e interceção de dados, devem ser controladas por juízes.
Da mesma forma, juízes, não árbitros, devem ser competentes para julgar os litígios entre as empresas e os Estados-Membros da União Europeia. O projeto de Tratado de Comércio Transatlântico e Parceria de Investimento (TTIP), que estabelece tribunais de arbitragem nesses casos, levaria à anulação de leis democraticamente votadas e aprovadas.
Numa Europa cada vez mais integrada, a falta de regras comuns sobre a independência do Poder Judicial é uma séria ameaça para os direitos dos cidadãos. O Poder Judicial na Europa deve dar um passo em frente – da cooperação à integração.
Os magistrados europeus – juízes e magistrados do Ministério público – estão agora habituados a interagir diretamente entre si, seja ao aplicar a legislação europeia diretamente, seja no acompanhamento da jurisprudência dos tribunais europeus do Luxemburgo e de Estrasburgo.
Tendo alcançado a confiança mútua nas suas relações, agora é o momento de ir para além do regime de cooperação entre parceiros, com o objetivo de alcançar uma integração completa da administração da justiça na Europa.
Normas-padrão mínimas para salvaguardar a independência do Poder Judicial, abrangendo aspetos como o governo e a responsabilidade do Poder Judicial, a nomeação dos juízes, o papel e a autonomia do Ministério Público, são regras essenciais para garantir o acesso à justiça, visando um maior nível de independência judicial e um livre acesso à justiça.
Somente dessa forma, os cidadãos europeus podem ter a certeza de que os seus direitos estão protegidos num verdadeiro Espaço Comum de Justiça.
Atenas, 23 de maio de 2015