1. A Diretiva 4/2020 da PGR publicada na semana passada vem reafirmar, no essencial, o teor da Diretiva 1/2020 da PGR, sendo certo que, o teor desta última motivou, inclusivamente, a intervenção de Sua Excelência o Senhor Presidente da República, bem como um pedido de audição Parlamentar da Senhora PGR.

  2. Nos termos da nova Diretiva é possível emitir ordens dirigidas a processos concretos, para além dos casos previstos no Código de Processo Penal.

  3. A Diretiva 4/2020 da PGR não reconhece qualquer autonomia técnica e tática aos titulares dos processos para que estes possam conduzir as investigações, já que permite, a todo o tempo, a interferência dos superiores hierárquicos, que poderão ordenar a realização de diligências ou impedir que as mesmas se efetuem. Trata-se de uma funcionalização e menorização clara de quem tramita tais processos no dia a dia.

  4. Os titulares dos processos são as pessoas que melhor conhecem os mesmos, em especial quando as investigações apresentam um elevado volume ou complexidade, pelo que eventuais intervenções hierárquicas apressadas (eventualmente condicionadas por fatores externos ao processo) poderão comprometer ou fragilizar as investigações, conforme demonstram alguns casos recentes, designadamente o processo de Tancos.

  5. A Diretiva não é compatível com o conceito de Ministério Público como uma Magistratura e viola frontalmente o novo Estatuto do Ministério Público.

  6. O novo Estatuto do Ministério Público distingue claramente a intervenção dos superiores hierárquicos no âmbito penal e não penal, entre outros, artigos 75º, nº1, alíneas g) e h) e 97º, nºs 4 e 5 do EMP.

  7. A intervenção hierárquica nos inquéritos criminais só pode ser efetuada nos termos previstos no Código de Processo Penal (cfr. artigos 19º, nº2, alínea g), 59º, nº1, alínea c), 68º, nº1, alínea f), 75º, nº1, alínea g), 87º, alínea b) e 97º, nºs 4 e 5 do Estatuto do Ministério Público) e é aquela que melhor se compatibiliza com o conceito de autoridade judiciária e com os padrões definidos pelo Tribunal de Justiça da União Europeia.

  8. Tal como consta expressamente da declaração de Florença, emitida pela MEDEL em 19 de setembro de 2020, a efetiva independência e autonomia dos Procuradores é um valor acrescentado para a independência do Sistema de Justiça e uma componente chave do Estado de Direito, bem como indispensável para a independência do Judiciário.

  9. Para se alterar a intervenção hierárquica, tal como hoje está configurada na jurisdição penal, seria necessário alterar o Código de Processo Penal ou o Estatuto do Ministério Público (recentemente alterados).

  10. Esta Diretiva muda por completo o paradigma do Processo Penal introduzindo profundas alterações no funcionamento interno do Ministério Público.

  11. A criação de processos paralelos no processo penal, à margem da lei, descredibiliza o Ministério Público e compromete a sua imagem de transparência.

  12. A PGR substituiu-se ao legislador, subvertendo por completo o equilíbrio que se pretendeu alcançar através das normas processuais penais.

  13. Não podemos aceitar viver num Estado em que a Senhora PGR pensa que “a Lei sou eu”.

  14. A Direção do SMMP e os magistrados do Ministério Público defendem a existência de uma hierarquia que seja dinâmica, liderante e que atue dentro dos limites da Lei e da Constituição.

  15. Ao invés de uma diretiva que limita a autonomia do Ministério Público e dos seus magistrados e abre a porta à interferência politica na investigação criminal, os magistrados teriam gostado que tivessem sido emitidas outras, designadamente sobre questões   relevantes que surgiram durante o estado de emergência, e perante as quais houve um silêncio ensurdecedor por parte de quem devia liderar a instituição.

  16. A liderança não se impõe pelo recurso à força, pela adoção de soluções ilegais e pelo isolamento relativamente aos pares. Pelo contrário, a liderança exerce-se pela motivação, convergência de esforços e união da instituição, o que verificamos não estar a ocorrer.

  17. Face à gravidade da situação, a Direção do SMMP reunida no dia 17 de novembro 2020 deliberou tomar as seguintes medidas: 

  – Solicitar uma audiência a Sua Excelência o Senhor Presidente da República;

– Solicitar audiências aos grupos parlamentares e demais partidos representados na Assembleia de República; 

– Convocar uma Assembleia de Delegados Sindicais extraordinária;

– Realizar uma conferência destinada a discutir a autonomia do Ministério Público no processo penal. 

17 de novembro de 2020

 

A Direção do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público 

 

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