SÁBADO, 25-01-2023 por Paulo Lona, Secretário-Geral do SMMP

A atual situação no Afeganistão de advogados, juízes e procuradores (especialmente mulheres) tem sido objeto de avisos específicos por parte de diversos observadores internacionais, levando a uma crescente preocupação.

 

A atual situação no Afeganistão de advogados, juízes e procuradores (especialmente mulheres) tem sido objeto de avisos específicos por parte de diversos observadores internacionais, levando a uma crescente preocupação.No Afeganistão, desde a tomada do poder pelo regime talibã, têm ocorrido diariamente fragrantes, manifestas e ostensivas violações dos direitos humanos, atingindo quem exerce a sua profissão nos Tribunais.

O dia 24 de janeiro é o dia internacional do advogado em perigo e, entre outras associações, a MEDEL (Magistrados Europeus pela Democracia e Liberdades) assinala este dia focado no Afeganistão e no papel que os advogados desempenham na garantia da proteção dos direitos humanos e das liberdades fundamentais. Como salienta a MEDEL, podemos observar em todos os contextos em que o Estado de Direito entrou em colapso (perseguindo advogados e restringindo a sua liberdade de associação) que o sistema jurídico e os Tribunais foram transformados em instrumentos de opressão ao serviço de regimes autoritários.

A atual situação no Afeganistão de advogados, juízes e procuradores (especialmente mulheres) tem sido objeto de avisos específicos por parte de diversos observadores internacionais, levando a uma crescente preocupação.

Os peritos das Nações Unidas, nomeadamente o relator especial sobre a situação dos direitos humanos no Afeganistão e o relator especial sobre a independência de juízes e advogados, em comunicado emitido dia 20 de janeiro, chamaram a atenção para o facto de advogados, juízes, procuradores e outros intervenientes no sistema legal no Afeganistão enfrentarem graves riscos à sua segurança, procurando atuar perante um ordenamento jurídico interno que já não é independente.

O comunicado em causa refere que estão seriamente preocupados com a terrível situação enfrentada pelos advogados no Afeganistão e os abusos dos direitos humanos decorrentes do desmantelamento do sistema jurídico independente e sua substituição por um sistema “de facto” que viola flagrantemente as normas internacionais.

Desde que os Talibãs assumiram o controle do Afeganistão, em agosto de 2021, advogados e outros profissionais jurídicos enfrentaram obstáculos incríveis, mas ainda assim persistiram nos seus esforços para atender às necessidades legais do povo afegão.

As mulheres juízas, procuradoras e advogadas foram, em ato de discriminação, afastadas do sistema jurídico deste país. Foram removidas das suas funções mais de 250 juízas, tendo muitas que fugir ou esconderem-se devido às ameaças à sua segurança. As advogadas, de acordo com os relatórios conhecidos, não têm conseguido renovar as licenças necessárias para o exercício da sua profissão, enfrentam graves problemas de saúde mental e, em muitos casos, ficaram sem meios de assegurar a sua subsistência.

Essas e outras restrições à participação das mulheres na vida pública representam graves violações dos seus direitos humanos.

A própria Ordem dos advogados do Afeganistão, criada em 2008, foi privada da sua autoridade de licenciamento dos advogados e foi imposta uma revisão das licenças concedidas, excluindo da sua concessão as mulheres advogadas.

Os procuradores têm sido sistematicamente marginalizados e impedidos de desempenhar o seu papel crucial na administração da justiça.

O regime Talibã, quando assumiu o controle do Afeganistão, demitiu todos os procuradores. Enquanto alguns do sexo masculino foram reintegrados nos meses que se seguiram, em 2022, todos os restantes receberam ordem de suspenderem o seu trabalho e transferirem todas as investigações para os “tribunais de facto”. Esta exclusão viola normas internacionais relativas ao funcionamento independente dos serviços do Ministério Público. Alguns outros procuradores, especialmente aqueles que investigaram e acusaram membros dos Talibãs enfrentam riscos extremamente graves e muitos permanecem escondidos. Os relatórios das Nações Unidas indicam que muitos criminosos que foram libertados procuraram exercer represálias contra procuradores e juízes, conseguido matar diversos em autênticas “caçadas realizadas de porta em porta”.

O comunicado referido conclui pedindo um maior apoio internacional a advogados, profissionais do direito e organizações não-governamentais que trabalham para promover a justiça e os direitos humanos. Uma especial atenção deve ser dada à situação enfrentada pelas mulheres advogadas e por aqueles que trabalham para a realização dos direitos das mulheres.
Os atores internacionais devem fornecer proteção e passagem segura para advogados, juízes, procuradores e outros atores envolvidos com o sistema jurídico, especialmente mulheres, que correm o risco de represálias e ataques dos Talibãs.

Estes profissionais da justiça, que um dia acreditaram num estado de direito para o seu país, merecem muito mais em termos de apoio internacional.

A comunidade internacional deve apoiar estes profissionais do direito – juízes, procuradores e advogados – e tentar protegê-los, bem como a todos os que procuram, em condições extremamente difíceis, defender os direitos humanos, quer no seu pais de origem quer nos países para onde, fugindo, tiveram que se deslocar (muitos encontram-se em situações precárias e em risco de repatriação).

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