A influência da comunicação social na compreensão da Justiça

25/09/2024

Revista Visão
Pedro Nunes
Procurador da República, Presidente da Regional de Coimbra do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público

Tudo isto para aportar a uma conclusão: como em todas as áreas de atividade existem bons e maus profissionais – existem bons e maus jornalistas. Mas fundamentalmente aqueles que realmente importam são os bons jornalistas, nomeadamente os que cumprem o Código Deontológico e não cedem perante poder político e o poder económico

O sociólogo alemão Max Weber, em 1910, deixou um considerável contributo para a sociologia da comunicação. Na primeira reunião da Sociedade Alemã de Sociologia, apontava o conteúdo dos jornais diários como campo de pesquisa pertinente aos programas da instituição. Delineava-se, pois, um campo de estudo genuinamente científico: o de uma sociologia da imprensa. Os contactos dos jornais com os partidos, com o mundo dos negócios, com todos os variados grupos e pessoas que influíam na vida pública e que eram, consequentemente, influenciados por ela, apontavam, naquele tempo-espaço, o campo de investigação sociológica.

Volvidos 114 anos sobre a primeira reunião da Sociedade Alemã de Sociologia, podemos certificar que Max Weber era um visionário e que as suas teorias se propagaram ao longo do tempo, mantendo-se atuais.

Nos 114 anos que nos separam do manifesto de Weber, surgiram a rádio, a televisão e a internet, mas todos têm um denominador comum: o poder de comunicar e influenciar a sociedade através de uma notícia.

O Código Deontológico dos Jornalistas portugueses é um verdadeiro exemplo de correção, honestidade e galvanização da pessoa do Jornalista.

Impõe, desde logo que, o jornalista deve relatar os factos com rigor e exatidão e interpretá-los com honestidade. Os factos devem ser comprovados, ouvindo as partes com interesses atendíveis no caso. A distinção entre notícia e opinião deve ficar bem clara aos olhos do público.

Por outro lado, a Constituição da República Portuguesa estabelece no n.º 4, do art.º 38.º que o Estado assegura a liberdade e a independência dos órgãos de comunicação social perante o poder político e o poder económico, impondo o princípio da especialidade das empresas titulares de órgãos de informação geral, tratando-as e apoiando-as de forma não discriminatória e impedindo a sua concentração, designadamente através de participações múltiplas ou cruzadas.

Mas, como se disse, Max Weber já em 1910 anunciava que existiam contactos dos jornais [entenda-se, meios de comunicação social] com os partidos, com o mundo dos negócios, com todos os variados grupos e pessoas influentes na vida pública por quem eram influenciados, o que contraria exatamente o que a Constituição da República visa salvaguardar com mencionado normativo.

Tudo isto para aportar a uma conclusão: como em todas as áreas de atividade existem bons e maus profissionais – existem bons e maus jornalistas.

Mas fundamentalmente aqueles que realmente importam são os bons jornalistas, nomeadamente os que cumprem o Código Deontológico e não cedem perante poder político e o poder económico.

Sabemos que as empresas/grupos de comunicação social têm um escopo lucrativo e que os editoriais têm de ser dimensionados consoante as possibilidades financeiras das empresas, sendo que na maioria dos casos a justiça se encontra no editor da sociedade (um “saco” onde são colocados diversos temas de abordagem jornalística).

Existem, porém, redações com editores específicos para a área da justiça, o que se explica pela quantidade de noticias com interesse que este setor produz para as empresas de comunicação social. Ou seja, “a justiça vende”.

No jornalismo judiciário existem profissionais de reconhecida seriedade, rigor e honestidade intelectual. As posições que defendem, são assentes em argumentos válidos, sólidos e confirmados, demonstrando estudo e análise dos factos, cujas peças jornalísticas demonstram a exigência e cumprimento do Código Deontológico.

São estes jornalistas que têm o poder-dever de levar ao cidadão uma pedagogia judiciária séria, assente na análise rigorosa dos factos, mostrando o funcionamento do sistema jurídico português, das suas virtualidades, entropias e imperfeições.

Para efeito o jornalista tem necessariamente de conhecer e dominar a linguagem jurídica, o funcionamento das instituições judiciárias, as suas estruturas, competências, necessidades e dificuldades. Pese embora não seja propriamente fácil, já existem muitos que dominam na perfeição o tema da justiça e que contribuem para um cabal esclarecimento do cidadão.

Os outros [jornalistas], aqueles menos rigorosos, para quem o Código Deontológico é um mero documento de caixote do lixo, que se deixam influenciar pelos partidos, pelo mundo dos negócios e variados grupos e pessoas, esses não interessam!

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