SÁBADO, 26-10-2022 por Paulo Lona, Secretário-Geral do SMMP
No passado dia 20 de outubro decorreu o dia mundial de combate ao bullying.
De acordo com informação policial, em Portugal o número de casos de bullying em ambiente escolar aumentaram no período pós-pandemia, tendo sido identificadas mais de 2.000 vítimas (por referência ao anterior ano escolar).
Contudo, existe um grande número de situações qualificáveis como violência no domínio escolar que nunca chega ao conhecimento das autoridades policiais, quer porque foram desvalorizadas quer porque a vítima ou terceiro nunca delas deu conhecimento.
O bullying é, em primeiro lugar, um fenómeno social de contornos variáveis, mas abrangendo uma grande variedade de ações.
Existem múltiplas definições do que é bullying.
Uma das definições (utilizada no Reino Unido) qualifica o bullying como “uma forma de violência de longa duração, de carácter físico ou psicológico, perpetrada por um indivíduo ou grupo dirigida contra um indivíduo incapaz de se defender por si próprio, com a intenção consciente de o magoar, ameaçar, assustar ou pressionar”.
Podemos distinguir entre:
– Bullying físico, abrangendo situações de agressões físicas, ameaças, perseguição, estragar material/bens, subtrair material/bens e assédio (sexual ou outro);
– Bullying verbal, abrangendo insultos, intimidação, humilhação, ofensas verbais ou uso de expressões depreciativas/
– Bulling socio-emocional, que inclui indiferença, isolamento, exclusão social, difamação e lançar rumores; e
– Ciber-bullying, que assume cada vez maior relevância, dado que a internet (em especial as redes sociais) e o telemóvel são instrumentos de uso generalizado e diário, através dos quais são difundidas, com grande rapidez, em larga escala, anonimamente, mensagens ou vídeos altamente ofensivos, ameaçadores ou que podem afetar de forma muito grave a reputação da respetiva vítima. É conhecida a capacidade de humilhação e intimidação que a informação veiculada através das diversas redes sociais pode causar.
As consequências que as vítimas sofrem prolongam-se muitas vezes no tempo e transformam-se em traumas difíceis de superar.
O bullying assume, muitas vezes, relevância para mundo do direito e faz os seus autores incorrerem em responsabilidade penal (tendo os seus autores pelo menos 16 anos), responsabilidade no domínio tutelar educativo (responsabilidade de natureza diferente aplicável aos menores entre os 12 e 16 anos e que visa não punir, mas reeducar para o direito) e, cumulativamente, responsabilidade disciplinar (no âmbito interno da escola atenta a qualidade de alunos).
Mas, mais do que a vertente repressiva importa existir uma aposta séria na sua prevenção e na sensibilização, em especial daqueles que exercem a sua profissão no âmbito escolar.
Os pequenos fenómenos de bullying que diariamente atingem muitas crianças e jovens nem sempre recebem a atenção que deveriam por parte comunidade escolar e não podem/devem ser desvalorizados e normalizados. Muitas vezes, aquilo que é tratado como “brincadeiras de crianças” são fenómenos de intimidação, perseguição, humilhação e agressividade que afetam de forma grave a autoestima e que chegaram a levar crianças/jovens a recusar frequentar a escola, a fugas da escola, a diminuição do rendimento escolar, a comportamentos de automutilação e, nos casos mais graves, ao suicídio ou tentativas de suicídio. Os sintomas, por vezes, surgem numa fase posterior, com consequências nas relações sociais e na capacidade de gestão de conflitos enquanto adultos.
O bullying em si mesmo não é um crime (não existe um tipo legal específico de violência em domínio escolar) mas os fenómenos que este implica podem consubstanciar diversos tipos de ilícitos criminais, desde as injúrias, difamação (quando atingida a honra e consideração), ofensas à integridade física (quando é atingida a integridade física do jovem), roubo (quando são subtraídos pela força bens do jovem), dano (quando objetos do jovem são destruídos), ameaça (quando a criança é ameaçada na sua integridade física/vida), extorsão etc..
É essencial que os adultos, em especial os profissionais que exercem funções na comunidade escolar, em contacto com crianças/jovens, consigam identificar mudanças no comportamento habitual destes, estabeleçam canais de comunicação e relações de confiança, facilitando a revelação de eventuais experiências de bullying.
Igualmente relevante é a sensibilização da comunidade escolar (incluindo a família) para a promoção de um ambiente que exclua a violência.
A Unicef apelou – ainda em 2019 – a que fossem tomadas medidas visando a implementação de políticas que protejam as crianças e os jovens da violência, ao aumento das medidas de segurança nas escolas, ao incentivo dos alunos e das comunidades em que se inserem a questionarem a própria cultura de violência em que muitas vezes cresceram e melhorar, também, a recolha de dados sobre o comportamento online das crianças.