OPINIÃO
BOLSA DE ESPECIALISTAS
19.07.2021
O que questionamos é a presença no Conselho Superior do Ministério Público de quem em função de interesses que representa ou a que está direta ou indiretamente ligado, não dá garantias de isenção, imparcialidade e objetividade e de respeito pela autonomia do Ministério Público.
O Conselho Superior do Ministério Público (CSMP) é o órgão superior de gestão e disciplina por intermédio do qual se exerce a competência disciplinar e de gestão de quadros do Ministério Público.
Compete-lhe, para além do mais, nomear, colocar, transferir, promover, exonerar, apreciar o mérito profissional e exercer a ação disciplinar sobre os magistrados do MP.
O CSMP é um órgão colegial, presidido pelo Procurador-Geral da República e composto por magistrados do Ministério Público por inerência (os procuradores-gerais regionais), magistrados do Ministério Público eleitos de entre e por cada uma das duas categorias de magistrados (1 procurador-geral-adjunto e 6 procuradores da República), membros eleitos pela Assembleia da República (5) e membros designados pelo membro do Governo responsável pela área da justiça (2).
A autonomia dos magistrados do MP depende da confiança no CSMP, designadamente que não serão punidos disciplinarmente ou preteridos na carreira por conduzirem investigações criminais em que sejam visadas personalidades relevantes da política, do sistema financeiro ou do futebol.
Assume, assim, particular relevância rever o regime das incompatibilidades dos Vogais do CSMP quando designados pela Assembleia da República ou pelo Ministério da Justiça.
Não pode um Vogal que seja advogado ser num dia o responsável pela defesa de um arguido e publicamente emitir juízos depreciativos sobre a conduta profissional e processual de um determinado magistrado do Ministério Público titular do inquérito em causa, debatendo os factos em apreciação, questionando a legalidade dos atos praticados e no dia seguinte estar no CSMP a apreciar o mérito, a exercer a ação disciplinar em relação a esse ou outros magistrados que tenham ou venham a intervir nesse mesmo processo ou mesmo fazer parte do júri ou deliberar sobre a graduação ou acesso do magistrado em causa à categoria de procurador-geral adjunto.
Mas mesmo que não participe na deliberação, por fazer parte do CSMP tem acesso a toda a informação dos magistrados e pode exercer influência sobre os demais membros que compõem o órgão colegial.
Já aconteceu no passado um outro Vogal do referido Conselho, também advogado, ter tentado discutir o comportamento de um magistrado do MP num determinado processo concreto em que esse mesmo Vogal representava um dos arguidos com o propósito de serem tiradas consequências disciplinares.
Muito menos será de aceitar que esse Vogal viole o dever de reserva a que está sujeito e utilize os meios de comunicação social para, publicamente, em direto, efetuar um ataque pessoal e profissional contra o magistrado que dirige a investigação, de forma não só inaceitável, intolerável e incompatível com as funções que exerce no Conselho Superior do Ministério Público, mas também cobarde porque sabe que esse mesmo magistrado, sujeito ao dever de reserva, não poderá repor a verdade e defender a sua integridade e dignidade pessoal e profissional.
Não pomos em causa a composição plúrima do órgão de gestão e disciplina do MP enquanto garantia fundamental da cidadania, isto é, da presença no mesmo dos representantes daqueles em nome de quem a justiça é exercida.
O que questionamos é a presença no Conselho Superior do Ministério Público de quem em função de interesses que representa ou a que está direta ou indiretamente ligado, não dá garantias de isenção, imparcialidade e objetividade e de respeito pela autonomia do Ministério Público.