SÁBADO, 28-12-2022 por Paulo Lona, Secretário-Geral do SMMP

O principal problema (sem ser o único) que afeta atualmente o Ministério Público é, sem dúvida, a falta de recursos humanos, isto é, a falta de magistrados e a falta de oficiais de justiça afetos ao serviço.Como em regra o período de final do ano é um período de balanço relativamente ao que foi feito, ao que ficou por fazer, ao que permaneceu e ao que se alterou, importa olhar para o Ministério Público em 2022.

 

É, infelizmente, clarividente que este foi mais um ano perdido no que respeita a dotar o Ministério Público a curto, médio e longo prazo dos recursos humanos de que necessita.

Embora, por vezes, escrever sobre este tema comece a soar como o bater repetido na mesma tecla de um piano, a verdade é que a sua premência e as consequências gravosas que dele decorrem impõem a sua revisitação constante, esperando que seja possível encontrar alguma ressonância no poder político e que este assuma que são necessárias medidas urgentes para a sua solução.

O principal problema (sem ser o único) que afeta atualmente o Ministério Público é, sem dúvida, a falta de recursos humanos, isto é, a falta de magistrados e a falta de oficiais de justiça afetos ao serviço.

De acordo com os resultados obtidos em recente questionário, realizado pelo Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, 20,5% dos lugares existentes no quadro legal não foram preenchidos no último movimento de magistrados do Ministério Público. Existe ainda um elevado número de magistrados colocados que não se encontram efetivamente ao serviço, um total estatístico de 23,1% (entre as razões apontadas sobressaem as situações de doença).

Os magistrados do Ministério Público estão assoberbados de trabalho, as baixas médicas sucedem-se com cada vez maior frequência, a que se seguem as repetidas acumulações de serviço e redistribuições, que, por sua vez, dado o acréscimo, muitas vezes excessivo, de trabalho que provocam, irão contribuir para novas baixas, novas situações de burnout, que seguramente ninguém desejava, mas que exponencialmente vêm aumentando.

Só na última semana tive a oportunidade de falar com três colegas magistradas do Ministério Público cujo volume de trabalho tinha, nos últimos dias, duplicado, porque tinham ficado a substituir colegas que entraram, na sequência de situações de burnout, de baixa médica prolongada. Estas magistradas tinham ficado a desempenhar todo o seu trabalho de origem e, ainda, todo o serviço de outra colega que estava no mesmo tribunal/departamento.

A hierarquia do Ministério Público, nomeadamente os Procuradores Coordenadores e Procuradores Gerais Regionais, não tem, na maioria das situações, ao seu dispor um meio eficaz para suprir a falta de magistrados que cada vez mais se faz notar – os quadros complementares (in)existentes não permitem de modo nenhum colmatar as falhas – e, por muito boa vontade que exista (e ela existe), por parte dos magistrados em exercício de funções numa determinada comarca/departamento do Ministério Público, para colaborar e encontrar soluções, existe um limite – que já foi atingido em muitos locais – na boa vontade e na capacidade de acumular mais trabalho.

O limite de que aqui falo é não apenas aquele em que fica comprometida a qualidade do serviço prestado ao cidadão, mas mesmo a possibilidade de prestar minimamente esse mesmo serviço.

Estas situações não podem continuar e afetam a saúde dos magistrados e a capacidade operacional do Ministério Público.

De acordo com o último relatório anual da Procuradoria Geral da República (2021) em 2019 os quadros do Ministério Público eram compostos por um total de 1.656 magistrados, que já eram claramente insuficientes para as necessidades (estimando-se que seriam necessários pelo menos mais 200 para dar resposta efetiva a todas as necessidades), sendo que em 2021 esse número não só não aumentou como ficou reduzido a 1.651 magistrados.

As entradas de magistrados do Ministério Público ao serviço não compensam as saídas, nomeadamente na sequência das jubilações que ocorrem com grande frequência numa magistratura envelhecida.

A continuar assim o ponto de rutura será, em breve, ultrapassado.

Fica o desejo que o ano de 2023 seja diferente. 

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