BOLSA DE ESPECIALISTAS
VISÃO, 22-06-2020 por Adão Carvalho, Secretário-Geral do SMMP
O Ministério Público e os Tribunais têm sido usados muitas vezes como o “bode expiatório” de todos os males que atormentam a nossa sociedade.
Quando ocorre um homicídio em contexto de violência doméstica logo se acusa a justiça de não ter atempadamente tomado providências na situação em causa.
A corrupção continua a existir porque os Tribunais não respondem com a celeridade e eficácia necessários para punir os responsáveis.
Se uma instituição bancária entra em colapso financeiro a culpa também é da lentidão da justiça e da morosidade em investigar e punir os responsáveis.
Tal visão tantas vezes difundida na comunicação social e acalentada pelos próprios decisores políticos constitui uma distorção da realidade.
Os Tribunais e designadamente a justiça penal são o fim de linha de intervenção na sociedade.
A sua intervenção pressupõe que todos os mecanismos de prevenção, fiscalização e controlo por parte do Estado falharam.
A resolução dos problemas sociais não se pode bastar com o enfoque na atuação dos Tribunais, enquanto mero expediente para afastar a responsabilidade dos decisores políticos e, em geral, de toda a sociedade.
A aposta tem de ser na prevenção primária e secundária, exigindo do Estado a definição de políticas adequadas nesse âmbito.
No domínio da criminalidade económico-financeira impõe-se a adoção de sistemas eficientes de controlo de cumprimento – ou políticas de compliance – de forma a evitar ou reduzir a possibilidade de ocorrência da prática de crimes ou contraordenações.
Reforçar a atuação, na identificação, prevenção e gestão de riscos de corrupção e infrações conexas.
Garantir a transparência em quaisquer procedimentos da administração pública.
Maior eficiência dos órgãos de fiscalização, controlo e inspeção do setor público e nos mecanismos de supervisão.
Também no domínio da violência doméstica há todo um caminho a fazer no âmbito da prevenção, começando pela educação das crianças e formação da sua personalidade, e sem o qual não será possível diminuir substancialmente o número de casos.
O que acima se disse não corresponde a uma desresponsabilização dos Tribunais na sua função de prevenção da criminalidade.
A prevenção da criminalidade não se pode bastar, apenas, com a exigência de uma atuação eficiente e célere do sistema judiciário, exige todo um conjunto de medidas destinadas a reduzir ou a contribuir para a redução da criminalidade e dos sentimentos de insegurança dos cidadãos, tanto quantitativa como qualitativamente, quer através de medidas diretas de dissuasão de atividades criminosas, quer através de políticas e intervenções destinadas a reduzir as potencialidades do crime e as suas causas e pressupõe o contributo de todos os setores do Estado e da sociedade.