BOLSA DE ESPECIALISTAS
VISÃO, 13-04-2020 por Adão Carvalho, Secretário-Geral do SMMP

Pensamos que seria mais útil o investimento em sistemas de proteção nas salas de audiência e outros espaços onde se realizam diligências, nomeadamente a colocação de vidros ou separadores transparentes de qualquer outro material nas bancadas dos magistrados e advogados e na secretária dos funcionários, para além de material de proteção individual para magistrados, funcionários, arguidos, testemunhas e demais intervenientes nas diligências


O adiamento de julgamentos por causa de Covid-19 fez as parangonas da comunicação social. 

O Governo logo se apressou a fazer aprovar uma proposta de lei no sentido de clarificar que a suspensão para a prática de atos processuais não obsta à tramitação dos processos e à prática de atos presenciais e não presenciais não urgentes quando todas as partes entendam ter condições para assegurar a sua prática através das plataformas informáticas que possibilitam a sua realização por via eletrónica ou através de meios de comunicação à distância adequados, designadamente teleconferência, videochamada ou outro equivalente. 

Os julgamentos são a face mais visível da justiça e, por isso, se compreenda o impacto negativo na opinião pública de uma tal notícia. Porém, os Tribunais não fecharam, nem os magistrados e funcionários judiciais deixaram de trabalhar. 

Desde logo os atos processuais em processos urgentes e a tramitação dos próprios processos dessa natureza continuaram a ser efetuados. Nomeadamente em sede de inquéritos com arguidos presos, em que os prazos máximos de prisão preventiva não ficaram suspensos, continuaram a ser investigados e tramitados pelos procuradores, técnicos de justiça e polícias e asseguradas as respetivas diligências. 

O mesmo se diga quanto à totalidade dos processos por crimes de violência doméstica e processos relativos a menores em risco. Tal aconteceu mesmo quando os meios de proteção individual e coletivos quase não existiam nos Tribunais. 

Para além disso todos os magistrados e funcionários continuaram a trabalhar nos processos não urgentes que não implicassem a realização de diligências, embora com limitações decorrentes do facto de não estar assegurado aos funcionários computadores e o acesso à rede dos Tribunais a partir de casa de forma a poderem continuar a trabalhar, as insuficiências da rede, e de como em qualquer serviço público ou privado se ter reduzido o número de funcionários nas instalações dos Tribunais como recomendação da DGS para evitar a propagação do vírus. 

A Lei 4-A/2020 de 6 de abril de 2020 veio consagrar expressamente a possibilidade de realização de julgamentos e diligências através de meios de comunicação à distância adequados, designadamente teleconferência, videochamada ou outro equivalente. Não se põe em causa a virtualidade da medida, mas sim as dificuldades práticas que advirão para a sua implementação em grande escala. 

Se no âmbito dos julgamentos cíveis será possível que os advogados das partes acordem na sua realização nesses moldes e providenciem para que as partes e testemunhas por si indicadas possam intervir com meios de comunicação adequados à distância o mesmo já será de execução mais difícil em outras jurisdições como a criminal. 

Na verdade, sendo o processo crime um processo sem partes, competindo ao Tribunal assegurar a comparências das testemunhas ou que estejam num local onde possuam meios adequados de comunicação à distância e assistindo ao arguido o direito de estar presente no julgamento, toda a logística inerente à sua operacionalidade se apresentará como mais complexa. 

Pensamos que seria mais útil, até porque o cenário de pandemia se apresenta ainda longe do seu termo, o investimento em sistemas de proteção nas salas de audiência e outros espaços onde se realizam diligências, nomeadamente a colocação de vidros ou separadores transparentes de qualquer outro material nas bancadas dos magistrados e advogados e na secretária dos funcionários, para além de material de proteção individual para magistrados, funcionários, arguidos, testemunhas e demais intervenientes nas diligências. 

A adoção de tais medidas permitiria a realização de diligências presenciais com redução do risco de contágio. A necessidade de conter a progressão do número de infetados por Covd-19 e salvar o maior número de vidas determinou o abrandamento ou mesmo encerramento de várias empresas e serviços, de que os Tribunais não foram exceção. Quando o país regressar à normalidade serão os mesmos magistrados e funcionários que terão de arregaçar as mangas e assegurar a recuperação do serviço e diligências que não se puderam fazer.

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