BOLSA DE ESPECIALISTAS
VISÃO, 17-10-2022
por Adão Carvalho, Presidente do SMMP

Quase metade dos magistrados inquiridos realizam mais trabalho do que aquele que consta do conteúdo funcional do seu lugar de origem


O Sindicato dos Magistrados do Ministério Público realizou durante o último trimestre de 2021 e primeiro semestre de 2022 um questionário destinado a avaliar as condições de trabalho, saúde e bem-estar dos magistrados do Ministério Público, apurando as necessidades concretas de cada um e dos vários tribunais, serviços e departamentos em que exercem funções.

O número de respostas obtidas, dado o elevado interesse que o questionário suscitou, foi bastante elevado, mais de 600 magistrados responderam às questões colocadas, o que permitiu obter um retrato fiável de muitas das necessidades/carências existentes.

A existência de boas condições de trabalho, que potenciem a saúde e o bem-estar e que facilitem o cabal exercício das funções adstritas aos magistrados do Ministério Público, reflete-se necessariamente no serviço que o Ministério Público presta aos cidadãos.

Os resultados estatísticos obtidos comprovam, em parte, aquilo que já se intuía, mas demonstram, noutros casos, que a situação ainda é mais gravosa do que se pensava.

De acordo com os resultados obtidos, no penúltimo movimento, em junho de 2021, 20,5% dos lugares existentes não foram preenchidos (numa amostra de 611 ficaram por preencher 125 lugares relativamente ao quadro legal e destes 106 continuavam em março de 2022 por preencher).

Contudo, dos 15, 2% lugares que foram preenchidos em setembro/outubro de 2021, a verdade é que: 36,8% o foram a título de reafectação; 31,6% com a colocação de auxiliares; 26,3% com magistrados dos quadros complementares e 5,3% por destacamento.

Existe um elevado número de magistrados colocados que não se encontram efetivamente ao serviço, um total estatístico de 23,1%. As razões apontadas para essa ausência são variadas, mas sobressaem as situações de doença (37,3%), licenças de maternidade/paternidade (27,6%) e gravidez de risco (12,7%).

Seja pela falta de preenchimento de quadros, seja pelas ausências de magistrados pelos motivos supra referidos, os resultados do questionário, mostraram-nos que quase metade dos magistrados inquiridos realizam mais trabalho do que aquele que consta do conteúdo funcional do seu lugar de origem.

De acordo com os resultados do questionário, esse acréscimo de serviço resulta de: 24,3%   acumulação de serviço; 24,3% atribuição direta de serviço; 39,7% de ordem de serviço escrita e 11,8% de redistribuição.

Das respostas obtidas resultou que um número significativo de magistrados (30,2%) teve um acréscimo de serviço situado entre os 25% e os 50%.

Por sua vez, 31,4% dos inquiridos referiu que o lugar onde se encontravam sofreu alterações ao conteúdo funcional nos últimos 5 anos (uma vez 36,5%, duas 30,7% e três ou mais 30,7% também). Por esta via, aumento do conteúdo funcional, também o volume de trabalho suportado pelos magistrados aumentou.

Os magistrados do Ministério Público auscultados admitiram, na sua maioria (51,1%), que já sofreram problemas de saúde em consequência do serviço, sendo 57,6% da natureza física e psicológica, 26% apenas psicológica e 16,4% apenas física. Na sequência desses problemas de saúde 61,7% referiram já terem recorrido a consultas e baixa médica.

É bem demonstrativo da situação precária ao nível de recursos humanos em que o Ministério Público se encontra o facto de 60,9% dos magistrados que já estiveram ausentes ao serviço por algum motivo não terem sido substituídos por nenhum outro magistrado, sem que em 57,2% das situações tivessem sido tomadas medidas de gestão. Por outro lado, no regresso da baixa, um número muito significativo – 78,7% – tinha processos/serviço acumulado no gabinete.

Note-se, que nos casos em que perante a ausência por motivo de doença de um magistrado, foram tomadas medidas de gestão, essas medidas implicaram, na sua maioria, uma sobrecarga de trabalho para aqueles que se mantiveram em funções, uma vez que estamos a falar de 59,5% dos casos em que houve redistribuição de serviço; 16,1% em que houve reafectação e magistrado a tempo parcial e 4,5% em que a distribuição do serviço foi para magistrado do Quadro Complementar. Apenas em 19,6% dos casos houve uma paragem da distribuição.

A utilização de tais instrumentos, conduz à subsequente sobrecarga de trabalho e, a curto, médio e longo prazo reflete-se na saúde física e mental dos magistrados como se viu supra.

No que respeita aos oficiais de justiça os resultados são, igualmente, muito relevantes, apontando 59,7% dos magistrados do Ministério Público que na secção/departamento em que trabalham o quadro de oficiais de justiça está incompleto (19,6% apontam para a falta de 1 oficial de justiça na seção/departamento; havendo situações em que essa falta é superior a 4).

Estes dados impõem uma séria reflexão sobre as carências existentes nos quadros de magistrados do Ministério Público e de oficiais de justiça que exercem as suas funções nos serviços do Ministério Público, impondo a adoção urgente pelas entidades competentes das medidas necessárias à sua resolução.

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