Os condicionamentos da Independência do Poder Judicial na Europa

Revista Sábado
Paulo Lona
Presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público
Estado de Direito e a independência do judiciário obrigam a uma vigilância constante e salvaguarda contra os múltiplos ataques de que são alvo.
A MEDEL (Associação de Magistrados Europeus pela Democracia e Liberdades) ainda recentemente tinha emitido um comunicado expressando a sua profunda preocupação relativamente aos ataques, através da comunicação social e declarações públicas de altos oficiais do Governo italiano, contra o judiciário italiano, em que os magistrados são acusados de conduzirem investigações e processos com viés político.
Agora, é a situação de independência do poder judicial na Hungria que suscita sérias preocupações, com os seus recentes desenvolvimentos representados pelo acordo assinado, a 20 de novembro de 2024, pelo Ministério da Justiça com o Conselho Nacional do Poder Judicial e o Gabinete Nacional para o Judiciário.
Tal como foi denunciado pelos juízes e suas associações, a decisão do Conselho de finalizar um acordo não precedido de um debate aberto e transparente no seio do poder judicial, implicou uma “negociação” com o governo sobre a questão dos salários, sem obter qualquer garantia de segurança financeira, em troca de uma reforma que afeta todo o funcionamento do sistema judicial e a condição presente e futura de cada juiz.
A MEDEL, numa declaração emitida a 24 de julho de 2024, já tinha afirmado que a situação financeira do sistema judiciário húngaro se tinha transformado em algo alarmante, demonstrando claramente como os governos, agindo com base nos recursos financeiros, podem minar grave e insidiosamente o bom funcionamento dos tribunais e a independência judicial.
Embora o acordo não seja especificamente detalhado, as reformas judiciais em causa são alvo de grande preocupação no que respeita à salvaguarda da independência do poder judicial.
Num Estado onde se aplica o Estado de Direito, os juízes e os procuradores atuam como garantes da igualdade das pessoas perante a lei, sem distinção dos seus papéis e funções, e protegem aqueles direitos fundamentais que as nossas Constituições e normas supranacionais concedem, como direitos universais, a todos os indivíduos.
Tendo como pano de fundo a experiência de erosão do Estado de Direito na Europa, mostrando que o poder judicial é muitas vezes o primeiro alvo de processos regressivos, a MEDEL tem feito sucessivos apelos ao respeito pelo papel constitucional do poder judicial, expressando simultaneamente a sua solidariedade para com todos os magistrados europeus empenhados na defesa dos direitos fundamentais e do Estado de direito.
Manifesto aqui, tal como a MEDEL, o apoio aos juízes húngaros e suas associações, nomeadamente a RES IUDICATA, que se encontram mobilizadas para denunciar as violações ao princípio da separação de poderes e ao Estado de Direito, reafirmando que a independência e a eficiência da Justiça são valores que não podem ser negociados.