Gostamos de comer bacalhau no Natal e sardinhas nos Santos Populares.

No Verão fazemos arraiais e festas por todo o País, em honra do respectivo padroeiro local.

As festas de Santo António e de São João mobilizam as populações de Lisboa e Porto, onde não podem faltar os manjericos e alhos-porros.

A estas tradições bem conhecidas juntou-se uma mais recente, salvar bancos.

Já não ficamos bem se não salvarmos um banco.

O ano passado íamos quebrando a tradição, mas lá apareceu o processo do BANIF em Dezembro.

Este ano parece que não vamos fugir à regra, com a Caixa Geral de Depósitos já no horizonte.

Deveríamos mesmo inscrever no Orçamento Geral de Estado uma rúbrica com a designação “auxílio a instituições de crédito”, pois este tipo de despesa repete-se anualmente, ao contrário do que seria normal.

Quando ocorre uma situação de dificuldade numa instituição de crédito, surge logo uma pergunta, qual será a seguinte?

A agonia da nossa banca é extremamente preocupante.

As acções do Banco Comercial Português, o maior banco privado português, bateram o seu mínimo histórico, encontrando-se cotadas a 2 cêntimos.

Há uns anos atrás este título chegou quase a cotar nos 4 Euros.

As dificuldades que a Caixa Geral de Depósitos atravessa têm várias fontes, mas quando ouvimos falar das garantias associadas a certos empréstimos percebemos que algo não correu bem.

Foram emprestadas quantias muito avultadas para compra de acções, em que foram dados como garantia os próprios títulos.

De que acções estamos a falar?

Entre outras, falamos das acções do BCP é claro, aquelas que valiam quase 4 Euros e agora valem 2 cêntimos.

O padrão de um determinado tipo de administração repete-se em diversas instituições de crédito.

Alguns administradores emprestaram dinheiro sem solicitarem as garantias que se impunham.

Um particular que se dirija a um banco e solicite 100 ou 200 mil Euros para comprar um apartamento tem de hipotecar o imóvel, não é financiado a 100% e muitas vezes ainda tem de apresentar fiadores.

Para financiamentos de muitos milhões de Euros, algumas regras básicas não foram tidas em consideração, o que não é estranho se conhecermos os beneficiários dos empréstimos.

Os problemas do sistema financeiro estão a consumir grande parte dos recursos nacionais.

Se o défice aumenta por causa de medidas de auxílio ao sistema bancário, logo surge Bruxelas a exigir que se tomem medidas de austeridade que recaem sobre todos os cidadãos.

Os erros de gestão e o favorecimento de amigos de alguns administradores da banca fizeram recair sobre todos os contribuintes um pesado fardo.

Algumas das necessidades básicas da nossa sociedade ficaram por satisfazer, de modo a evitar que o nosso sistema financeiro entrasse em colapso.

Atenta a sua importância, deveria ser mesmo equacionada a criação do Ministério dos Bancos, pois os recursos que são alocados a esta actividade superam a generalidade daqueles que são afectos a outros ministérios convencionais e a satisfação das necessidades daqueles têm assumido prioridade absoluta.

Sem dúvida que o Estado deve salvaguardar o sistema financeiro, mas já agora deveria lembrar-se que também existe o sistema de justiça, um dos pilares do regime democrático.

Desde há pelo menos uma década, ainda antes da crise de 2008, que o Ministério das Finanças encetou uma politica de destruição e aniquilamento do Ministério da Justiça.

Existe um bloco de interesses que quer destruir o sistema público de justiça, por forma a obter a privatização de grande parte do sector.

Este movimento começou de forma envergonhada, mas assume cada vez mais relevância.

Já se fala que, face à falta de magistrados, o Ministério Público deveria deixar de representar os trabalhadores, incapazes e o Estado, reservando-se apenas para a área penal.

Os escritórios de advocacia assumiriam as actividades referidas.

Esta forma de actuar é bem conhecida noutros domínios.

Primeiro destrói-se a actividade, depois entrega-se aos privados para poderem obter bons lucros.

Se a actividade privatizada correr mal não há problema, há sempre um contribuinte para pagar.

 

Autor: António Ventinhas é presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público

Sábado, 16/06/2016


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