OPINIÃO
BOLSA DE ESPECIALISTAS
02.08.2021

Os criptoativos têm sido muitas vezes associados a atividades como a lavagem de dinheiro e ao comércio de mercadorias proibidas, devido às suas caraterísticas de anonimato, ausência de regulação e natureza global

No espaço de pouco mais de uma década, o mundo das criptomoedas sofreu uma enorme expansão.

Em 1 de janeiro de 2021, a capitalização do mercado das criptomoedas era de aproximadamente 780 biliões de dólares, com mais de 5400 tipos de criptomoedas em circulação e um volume diário de transações na ordem dos 178 biliões de dólares.

Os criptoativos são representações digitais de ativos baseadas numa tecnologia de registo criptográfico e descentralizada de dados digitais (blockchain), não emitidas por um banco central, instituição de crédito ou instituição de moeda eletrónica, que são aceites no âmbito de uma comunidade virtual e são suscetíveis de desempenhar uma pluralidade de funções monetárias e financeiras.

O termo engloba as nomenclaturas que normalmente lhe são associadas, como tokens, coins, criptomoedas ou moedas virtuais.

Os criptoativos têm sido muitas vezes associados a atividades como a lavagem de dinheiro e ao comércio de mercadorias proibidas, devido às suas caraterísticas de anonimato, ausência de regulação e natureza global.

Durante o período da pandemia assistimos a um aumento das burlas relacionadas com criptomoedas, forex e outros ativos financeiros.

Os burlões aliciam as vítimas para esquemas piramidais, convidando-os a pagar mensalidades que podem atingir as centenas de dólares para abrir uma conta de cliente. Em contrapartida, prometem recompensá-los com vários tipos de bónus, à medida que as aplicações financeiras forem gerando retorno.

Claro que os avisos sobre o elevado grau de risco deste tipo de investimentos não são explícitos, antes pelo contrário. Nunca é referida a possibilidade de perder dinheiro, enquanto é salientado que, negociando em “modo automático”, o investidor deverá ganhar entre 5% e 20% ao mês.

De forma a iludirem as vítimas recorrem a perfis falsos nas redes sociais onde pseudo-milionários se gabam de ganhar muito dinheiro a fazer investimentos em forex e outros criptoativos, exibindo carros de luxo e baralhos de notas para iludir as pessoas… e o problema é que (muitas vezes) funciona.

A controvérsia reinante em torno das vantagens e riscos das criptomoedas tem conduzido a uma verdadeira encruzilhada regulatória.

Enquanto uns defendem que as transações em ambientes virtuais são mais baratas, mais seguras, rápidas e transparentes e, por isso, sustentam uma estratégia regulatória minimalista, assente num princípio de autonomia privada e de autorregulação, outros (em particular os seus detratores) consideram inversamente ser necessário ou mesmo imperiosa a intervenção do legislador na matéria, subordinando as criptomoedas a um quadro legal de emissão, circulação e supervisão adequado.

Mesmo no seio da União Europeia são muitos os opositores a uma regulamentação genérica dos criptoativos sustentando que a mesma se deve limitar ao branqueamento de capitais.

Nesse domínio é de salientar a proposta apresentada em setembro de 2020 pela Comissão Europeia de um Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo ao mercado dos criptoativos que tem como principal objetivo adotar um conjunto de medidas destinadas a fomentar e apoiar ainda mais o potencial do financiamento digital em termos de inovação e concorrência, atenuando, simultaneamente, os riscos inerentes.

A criminalidade crescente associada aos criptoativos exige que se avance para um nível de regulamentação adequado e proporcional, isto é, que não seja excessivo de tal modo que constitua um entrave à utilização dos criptoativos e à adoção da tecnologia que os suporta com já reconhecidas vantagens, mas que ao mesmo tempo garanta a segurança dos investidores e operadores de mercado e constitua obstáculo ao uso dos ativos financeiras digitais para a prática de crimes como o branqueamento de capitais, fraude fiscal ou burlas.

É claro que os criptoativos, para além da sua regulamentação, levantam novos desafios ao Ministério Público e à investigação criminal: como será possível investigar algo que, construído sobre um protocolo algorítmico, se consubstancia em mera informação digital que circula numa nuvem cibernética entre utilizadores virtuais pseudoanónimos.

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