26-06-2019, por António Ventinhas

Nos próximos dias 26, 27 e 28 de Junho os magistrados do Ministério Público realizarão a segunda greve no período de 4 meses.

Não me recordo dos procuradores portugueses terem efectuado duas greves num período tão curto.

Este tipo de manifestação de desagrado é extremamente raro entre os magistrados do Ministério Público.

Relembro que antes de 2019 a anterior greve se realizou no ano de 2013.

Nesta revisão do Estatuto do Ministério Público discutem-se princípios que estruturam esta instituição.

Continua em discussão a alteração da composição do Conselho Superior do Ministério Público.

Não é indiferente que uma maioria de não magistrados, eleitos pela Assembleia da República ou nomeados pelo Governo, possa escolher os procuradores que irão investigar os casos mais graves de corrupção ou impeça que os mesmos o façam.

Com esta possibilidade, o Bloco Central poderá afastar alguns procuradores incómodos do DCIAP ou prejudicá-los na sua carreira.

É preciso dizê-lo de forma clara, se esta alteração for aprovada, um Procurador da República como o Dr. Rosário Teixeira poderá ser afastado das investigações criminais mais emblemáticas por vontade politica, o que não é possível hoje.

Também não é indiferente que o Conselho Superior do Ministério Público se feche em si mesmo e se diminua a representação directa dos magistrados, como defende a proposta do grupo parlamentar do PS.

Aliás, esta proposta diminuiria o número de candidatos eleitos por diversas listas.

Neste momento, há candidatos de três listas representadas no Conselho Superior do Ministério Público e com a proposta do grupo parlamentar do PS a diversidade iria diminuir.

Se é certo que uma das alterações da composição do Conselho Superior do Ministério Público permitiria o controlo politico do Ministério Público e das investigações mais relevantes, há outras normas propostas pelo grupo parlamentar do PS que visam controlar o DCIAP pela via financeira.

O garrote financeiro é um meio extremamente eficaz de controlar as instituições e esta proposta encontra-se também em debate neste momento.

Não é possível combater a corrupção com um Ministério Público controlado politicamente e é isso precisamente que está em jogo.

Num momento em que se deveriam dar mais ferramentas para o Ministério Público investigar a corrupção pretende-se impor um travão ao mesmo, porque será?

Queremos um Ministério Público domesticado? A quem aproveita tal facto?

Ao cidadão comum não é de certeza.

No dia 25 de Junho, da parte da tarde, foi divulgada uma nova proposta do Partido Socialista que mitiga alguns dos aspectos do documento apresentado inicialmente, designadamente no que diz respeito ao princípio do paralelismo das magistraturas.

Ao contrário do que alguns quiseram fazer crer, o nosso móbil não é o dinheiro, mas a defesa de princípios essenciais ao bom funcionamento da Justiça.

Por essa razão, apesar de ter existido uma evolução positiva na proposta do grupo parlamentar do Partido Socialista, entendemos que se mantêm muitos dos fundamentos que determinaram a realização da greve.

Não transigimos na defesa da autonomia do Ministério Público.

Iremos bater-nos sempre por um Ministério Público livre para investigar.

A intervenção recente de Sua Excelência o Senhor Presidente da República confirma que o combate pela defesa da autonomia do Ministério Público não é uma questão corporativa, mas uma causa que deve interessar a todos os cidadãos.

 

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