BOLSA DE ESPECIALISTAS
VISÃO, 26-12-2022
por Adão Carvalho, Presidente do SMMP

O presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, Adão Carvalho, faz o balanço de 2022 na área da justiça

Em contagem decrescente para o novo ano importa revisitar o ano de 2022 na área da justiça.

Tal como tem sido apanágio nos últimos anos a justiça continuou a ser notícia por um conjunto de casos de interesse mediático, uns porque conheceram o seu desfecho, outros porque vieram a conhecimento público durante o ano, outros ainda que conheceram reveses na sua marcha.

O Tribunal Constitucional Português declarou a inconstitucionalidade com força obrigatória geral da norma que previa a obrigação de conservação de metadados para efeito de “investigação, deteção e repressão de crimes graves por parte das autoridades competentes”, após tal ter sido requerido pela Provedora de Justiça, com legitimidade para tal e fundando-se na declaração de ilegalidade do TJUE.

Tal declaração de inconstitucionalidade colocou fortes entreves, se não mesmo a impossibilidade prática para a investigação de um elevado número de tipos de crimes graves – crimes informáticos, terrorismo, rapto, homicídio, exploração sexual de crianças online, etc., o que determinou a abertura de um processo de revisão constitucional para resolução do problema.

Vieram a público as primeiras investigações desenvolvidas no âmbito da Procuradoria Europeia com origem em Portugal, para combate dos crimes de fraude fiscal e branqueamento de capitais, com buscas e detenções a decorrer em território nacional, com o envolvimento de vários Estados-membros e correspondendo a uma nova abordagem transnacional da criminalidade de cariz global.

 

Num quadro de falta de magistrados do Ministério Público o último concurso de acesso ao Centro de Estudos Judiciários confirmou a tendência que se vem acentuando ao longo dos anos de diminuição do número de candidatos e mais uma vez ficaram vagas por preencher, a exigir uma rápida reflexão e intervenção para inverter este cenário.

A falta de funcionários judiciais marcou igualmente o ano que termina, com alguns serviços em situação de quase rutura.

Um recente estudo efetuado pelo SMMP revelou a total falta de investimento em equipamentos e infraestruturas.

De acordo com os resultados obtidos, quase metade dos edifícios onde os magistrados do MP trabalham apresentam danos, desde infiltrações, problemas nos telhados, problemas no chão, deficiências nos WC e problemas nos elevadores.

De salientar ainda o facto de uma elevada percentagem dos edifícios afetos ao MP não disporem de espaços próprios para realização de diligências pelos oficiais de justiça e pelos magistrados e não terem nas audições e interrogatórios acesso a sistemas de gravação áudio e/ou sistemas de videoconferência próprios.

 As condições de trabalho são cada vez mais precárias e os recursos mais escassos enquanto, por outro lado, o sistema de justiça depara-se com realidades mais complexas e mais exigentes.

Não obstante as dificuldades que vêm sido sentidas e já por diversas vezes assinaladas, o certo é que a resposta do Ministério Público tem evoluído positivamente e oferece hoje uma resposta mais eficaz e de maior qualidade em quase todas as áreas.

Contudo, mesmo num quadro de falta de meios e não obstante a acuidade de os continuar a reivindicar, o Ministério Público tem de saber adequar a sua resposta às exigências da atualidade.

Para que tal aconteça exige-se de quem dirige o Ministério Público estratégia, gestão eficiente dos meios disponíveis e inteligência organizacional.

Receitas do passado, como a simples emissão de diretivas, não se afiguram como o caminho acertado para melhorar a resposta do Ministério Público.

O modelo de estrutura organizacional vigente, assente numa clássica estrutura hierárquica vertical, rígida, tem que ir sendo substituído por um modelo organizacional horizontal, com mais informalidade, menos burocracia, maior autonomia de decisão e organização nas bases, responsabilização e cooperação solidária entre os diversos graus hierárquicos.

Para além disso importa reavaliar periodicamente os modelos implementados, designadamente ao nível das especializações, para aferir das vantagens ou desvantagens da sua manutenção ou mesmo ampliação e para se corrigirem eventuais disfuncionalidades.

Votos de um Bom Ano.

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