OPINIÃO
BOLSA DE ESPECIALISTAS
28.06.2021 às 08h20
Há muito e muitos anos, num país distante, existia um reino onde a rainha vivia de costas voltadas para os súbditos, indiferente às suas dificuldades e agruras da vida, refugiando-se no seu palácio. A rainha apenas ligava a um círculo pequeno de condes, viscondes e marqueses, que gravitavam à sua volta e que exerciam do seu poder de influência sobre a mesma para obterem o que queriam
Um antigo Procurador-Geral da República disse em tempos idos que o Ministério Público era um “feudo de condes, viscondes e marqueses”.
Embora o seu mandato não tenha deixado grandes saudades ao Ministério Público, pelas piores razões, essa afirmação, então proferida, não é totalmente despicienda.
Por isso, decidi partilhar neste artigo um pequeno conto, com os leitores, da minha autoria, que nos ajude a refletir sobre o caminho que queremos para o Ministério Público e aquele que decididamente não queremos e com o qual não podemos pactuar.
Há muito e muitos anos, num país distante, existia um reino onde a rainha vivia de costas voltadas para os súbditos, indiferente às suas dificuldades e agruras da vida, refugiando-se no seu palácio.
A rainha apenas ligava a um círculo pequeno de condes, viscondes e marqueses, que gravitavam à sua volta e que exerciam do seu poder de influência sobre a mesma para obterem o que queriam.
A monarca havia afastado o conselho real e não se importava de contornar os estatutos e regras da corte para satisfazer aquele pequeno círculo de nobres.
Uma das condessas chegou mesmo a exercer a sua influência junto da rainha para que os seus mais prediletos e próximos servidores ficassem à frente de estruturas relevantes no seu condado.
Conseguiu mesmo que fosse derrogado o cumprimento de uma determinada regra para que uma das suas prediletas servidoras pudesse vir a ocupar um lugar em condições mais privilegiadas do que aquelas que resultavam da aplicação da norma.
Esses fieis servidores, que tinham vindo do povo, não se importavam de ocupar esses lugares mesmo sabendo das condições em que o faziam.
Os súbditos, esses, tinham total perceção desses jogos palacianos e tinham vergonha, muita vergonha do que se passava e não queriam que os reinos vizinhos tomassem conhecimento desses factos.
Enquanto isso se passava, os súbditos matavam-se a trabalhar para o reino, em condições muito difíceis ou mesmo desumanas, sem que a rainha se importasse minimamente com a sua situação.
E sonhavam… sonhavam com o dia em que a rainha os respeitasse e melhorasse as suas condições de vida e de trabalho.
Qualquer semelhança entre os factos relatados neste conto e a realidade terá sido mera coincidência… Ou não!!!
O Ministério Público não pode ser um “feudo de condes, viscondes e marqueses”, do provincianismo do tráfico de influências e do favorecimento pessoal.
Tem de dar o exemplo às outras estruturas do Estado.
Um exemplo de total transparência nos seus procedimentos de escolha das pessoas que vão ocupar os cargos hierárquicos; de escrupuloso cumprimento da lei; e, de serviço público em prol de uma justiça mais eficaz e de maior qualidade.
Os magistrados do Ministério Público têm sempre pautado a sua atuação pela autonomia, pelo respeito da legalidade, e para que exista uma justiça o mais igual possível para todos.
Esta não é uma magistratura para “condes, viscondes e marqueses”, nem os magistrados vão ficar calados e aceitarem que o seja.