SABADO.PT  – 20-06-2018

A advocacia é essencial para a boa administração da Justiça e defesa dos interesses fundamentais dos cidadãos.


Na semana passada realizou-se o VIII Congresso dos advogados portugueses.

A advocacia é essencial para a boa administração da Justiça e defesa dos interesses fundamentais dos cidadãos.

Neste momento a profissão apresenta vertentes muito distintas, bem como enfrenta vários desafios que terão de ser vencidos no futuro.

O Senhor Bastonário da Ordem dos Advogados no seu discurso de abertura do congresso abordou diversos temas e advogou que o Ministério Público deveria sair dos Tribunais e concentrar-se nas instalações dos Departamentos de Investigação e Acção Penal (DIAPs) ou no Departamento Central de Investigação e Acção Penal.

Ao efectuar tal proposta o Senhor Bastonário não mediu bem as consequências da mesma, nem teve em conta as competências do Ministério Público português.

Em Portugal, o Ministério Público não se limita a desenvolver a sua actividade na área criminal, ao contrário do que sucede noutros países.

A defesa dos trabalhadores, dos menores, incapazes e ausentes, a representação do Estado, o controlo da legalidade e constitucionalidade das normas, bem como uniformização da jurisprudência, são algumas das áreas de actuação desta magistratura.

Seria estranho que os procuradores que representam os interesses dos menores nos Tribunais de Família fossem deslocados para departamentos onde se realiza a investigação criminal. O mesmo se dirá, por exemplo, no que diz respeito aos magistrados que exercem funções nos Tribunais de Trabalho e defendem os trabalhadores.

Há um número muito significativo de procuradores que exerce funções fora da área penal, pelo que não teria qualquer lógica instalá-los num DIAP.

Por outro lado, a função de controlo da legalidade implica que os magistrados do Ministério Público sejam notificados de todas as decisões judiciais, isto é, têm de ter contacto com os processos judiciais que estão nos tribunais.

Se um Juiz proferir uma decisão em que não aplique uma norma por a declarar inconstitucional ou siga um entendimento contra a jurisprudência fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça, o Ministério Público obrigatoriamente terá de recorrer.

A concentração de todos os procuradores nos DIAPs também acarretaria sérias consequências para as comunidades locais.

Com excepção das comarcas situadas nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto, as restantes têm uma dimensão geográfica que corresponde ao distrito administrativo.

As instalações dos Diaps situam-se essencialmente nas sedes das comarcas ( que coincidem com a capital do distrito).

Se analisarmos as distâncias entre algumas localidades e as sedes de comarca, verificamos que em muitos casos atingem mais de uma centena de quilómetros.

Querer afastar o Ministério Público do contacto próximo com as populações, para o concentrar nas capitais de distrito, é algo com o qual não podemos concordar.

A lógica de proximidade com os problemas das pessoas é verdadeiramente fundamental, sucedendo o mesmo com a coordenação da actividade das polícias no âmbito da investigação criminal.

O Ministério Público deve continuar acessível aos cidadãos nos pequenos tribunais do interior e não concentrar-se apenas nas capitais de distrito.

As questões de funcionamento também ficariam fortemente afectadas.

A concentração de procuradores longe dos tribunais acarretaria o pagamento de avultadas verbas para despesas de deslocação, bem como implicaria que os arguidos ficassem detidos por mais tempo, o que ninguém deseja.

Por último, por falta de espaço, as actuais instalações dos DIAPs não permitiriam concretizar a proposta do Senhor Bastonário da Ordem dos Advogados, o que teria de levar a uma completa reformulação do parque judiciário com inúmeros custos para o Ministério da Justiça.

Se é certo que a saída do Ministério Público dos tribunais acarretaria maiores despesas para o erário público e prejuízo para o direito dos cidadãos, o mesmo não se poderá dizer se houvesse permanentemente advogados nos grandes tribunais, com um regime de apoio judiciário diferente do actual.

Esta semana tomou posse o novo Director Nacional da Polícia Judiciária, Dr. Luís Neves e no seu discurso inaugural abordou a questão da falta de inspectores. Na minha óptica tocou no ponto fulcral para o bom funcionamento da instituição.

Neste momento a Policia Judiciária não tem condições para cumprir cabalmente as funções que lhe estão atribuídas, designadamente no combate à criminalidade económico-financeira.

É preciso dizê-lo claramente, a operacionalidade da PJ está seriamente comprometida.

Segundo o que me foi transmitido por quem conhece bem a “casa” por dentro, há brigadas destinadas a combater a criminalidade económica que deveriam ter 9 elementos e apenas têm 3.

Processos de grande impacto mediático encontram-se parados há vários meses, por inexistirem inspectores em número suficiente.

Nos últimos anos a Polícia Judiciária não tem admitido inspectores e as consequências estão a fazer sentir-se.

O poder político está a matar a PJ aos poucos, ao mesmo tempo que reforça os meios de outros órgãos de polícia criminal.

A situação compromete a investigação criminal porquanto a Lei de Organização da Investigação Criminal atribuiu à Polícia Judiciária a competência exclusiva para investigar os crimes mais graves.

O grande desafio do novo director da PJ passa por conseguir um maior investimento do executivo na admissão de novos recursos humanos da instituição e motivar e organizar melhor os que exercem actualmente funções.

A Polícia Judiciária tem de preencher os seus quadros, conseguir aprovar o seu novo estatuto e melhorar o seu grau de resposta para estar à altura da sua história.

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por, António Ventinhas

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