No passado dia 4 de junho foi aprovada pelo Conselho Superior do Ministério Público a abertura do movimento de magistrados do Ministério Público.

Não se pode deixar de realçar que o referido anúncio de abertura do movimento foi publicado no mesmo dia em que decorreu a reunião, e, uma vez mais, sem qualquer respeito das mais elementares normas respeitantes aos prazos administrativos bem como dos colegas a quem é dirigido, limitou-se a conceder o prazo de 4 dias úteis, mal contados.

Mas, fosse esse o maior problema!

Compulsado o aviso do movimento, regulamento e respetivos anexos, constata-se que, ao arrepio das declarações públicas sobre a matéria e das conclusões do estudo elaborado pelo Observatório da Justiça sobre as condições de trabalho dos magistrados do MP, o CSMP decidiu desferir a machadada final nas já parcas condições de trabalho.

Com efeito, o CSMP, por desconhecimento ou com intenção, optou por ignorar ou desconsiderar o direito (i) a uma jornada de trabalho com um limite máximo de horas, (ii) ao repouso, (iii) ao descanso semanal e, por fim, (iv) a conciliar o trabalho com a vida familiar (que, aliás tem consagração constitucional).

Mais, o CSMP, numa visão puramente gestionária, em vez de abordar frontalmente, e de uma vez por todas, o problema da falta de magistrados, optou por encobrir este problema, transformando tribunais especializados em tribunais de competência genérica e, assim, destruindo a especialização e institucionalizando a precariedade.

Para o efeito, limitou-se a ampliar os conteúdos funcionais dos lugares (incluindo os que estão ocupados por quem está efetivo) e aumentar o volume de serviço sem qualquer rigor científico (designadamente, nenhum Valor de Referência Processual contabiliza realisticamente o tempo de diligências, julgamentos e sua preparação, atendimento ao público, contacto com entidades administrativas, policiais, de reinserção social, CPCJs, e reuniões de serviço).

Com a publicação deste movimento o CSMP, completamente indiferente ao que é a realidade das condições de trabalho dos magistrados do Ministério Público, formalizou um enorme aumento do volume de serviço, tornando-o, em muitos casos, incomportável.

Simultaneamente, transformou acumulações de serviço remuneradas em acumulações forçadas, sem qualquer compensação.

Neste movimento, o CSMP sem qualquer ponderação do que se pretende para o futuro desta magistratura, desconsiderando a cada vez maior complexidade e volume das realidades processuais e do direito, violando a LOSJ e os artigos 76.º e 80.º, do EMP, criou uma magistratura multitask e generalista, espetando o último prego na tão almejada e apregoada especialização – afetando necessariamente a saúde, eficácia, eficiência e produtividade dos magistrados e consequentemente a qualidade e tempestividade do serviço prestado ao cidadão.

O CSMP agrega conteúdos e tribunais (v.g. Execução e Cível em municípios diferentes) sem qualquer critério discernível (Família e Menores + Cível mas também Família e Menores + Cível + Crime e Família e Menores + DIAP, ou Trabalho + Cível mas noutros locais Trabalho + Execução e Trabalho + Comércio), numa miscelânea sem qualquer lógica, fundamento ou princípio orientador.

Em suma, o CSMP demitindo-se do seu dever de ser ele, e não a hierarquia, a gerir os quadros e dá carta-branca ao magistrado do Ministério Público Coordenador de Comarca que, sem restrições, regras e qualquer justificação, poderá agir com quase total discricionariedade.

Mais, o CSMP trilha o caminho da precariedade laboral sinalizando para extinção mais de oito dezenas de lugares. Isto é, quando a nível internacional a proteção dos trabalhadores passa pela restrição da precariedade, o CSMP institucionaliza-a, terraplanando o direito de todos os magistrados à estabilidade relativamente ao local onde prestam funções, condicionando, designadamente, o apoio à família.

Esta desconcertante e ruinosa gestão de quadros refletir-se-á na perceção pública da qualidade da magistratura do Ministério Público e trará como inevitável consequência o afastamento das novas gerações no ingresso desta nobre função pública, com o agravar sistémico do problema já existente.

Este movimento afronta os mais elementares direitos dos magistrados do Ministério Público enquanto pessoas, reduzindo-os a uma existência de sacrifício, instabilidade e precariedade.

Sem o reconhecimento dos direitos e das condições de trabalho dos magistrados fica comprometida a defesa dos direitos dos cidadãos, pedra de toque desta magistratura.

Sem justiça não há Justiça!

Por tudo isto, em defesa dos cidadãos, do direito, da Justiça, da eficácia, da qualidade do Ministério Público e dos direitos dos seus magistrados, a Direção do SMMP repudia veementemente a deliberação do movimento e estratégia do CSMP para esta magistratura e apela ao CSMP que proceda à anulação da deliberação que determinou a abertura do presente movimento.

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