Equilíbrio, persistência e resistência

24/11/2025

Revista Visão
Pedro Nunes
Procurador da República, Presidente da Regional de Coimbra do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público

A tradição japonesa do “Daruma”, um talismã japonês associado ao princípio “se caíres sete vezes, levanta-te oito”, reforça esta ideia de persistência. Tal como este símbolo, também os magistrados do Ministério Público têm demonstrado a capacidade de se reerguer perante cada tentativa de descredibilização ou desvalorização

Os conhecidos bonecos sempre-em-pé, que regressam à verticalidade independentemente das quedas que sofrem, representam de forma simbólica a persistência, o equilíbrio e a capacidade de resistência. Esta simples, mas sugestiva, imagem parece-me especialmente adequada para caracterizar a postura dos magistrados do Ministério Público em Portugal, que, apesar de alvo de críticas frequentes e, na maioria das vezes, infundadas, continuam a exercer as suas funções com firmeza e sentido de dever.

É inegável que, no espaço mediático, prolifera um conjunto de comentadores que, sem formação jurídica ou conhecimento sólido do funcionamento do sistema de justiça, se pronunciam com aparente autoridade sobre a atividade dos tribunais e, em particular, sobre a atuação do Ministério Público.

Economistas, engenheiros, sociólogos, historiadores e alguns jornalistas assumem frequentemente o papel de especialistas em justiça, emitindo opiniões que, em muitos casos, revelam falta de conhecimento, inconsistência e contradição.

Muitas dessas críticas concentram-se nos processos de maior visibilidade mediática, geralmente ligados à criminalidade económico-financeira e envolvendo figuras socialmente influentes.

Esta tendência contribui para a criação de narrativas pouco rigorosas, que confundem a opinião pública e não promovem uma reflexão séria, alicerçada e fundamentada. Consequentemente, não contribuem para a resolução dos reais problemas da justiça, desvalorizando e desconsiderando problemas efetivos que se mantêm e afetam a atividade diária dos tribunais.

Falamos da já reconhecida falta de recursos humanos – tanto magistrados como oficiais de justiça -, da ausência de modernização de equipamentos, instalações e sistemas tecnológicos, da carga processual extremamente elevada atribuída a cada magistrado e da inexistência de medicina do trabalho. Estes são apenas alguns dos fatores que contribuem para que mais de 50% dos magistrados do Ministério Público estejam em risco elevado ou muito elevado de burnout.

Por outro lado, raramente se menciona a vasta e complexa atividade desenvolvida diariamente pelo Ministério Público em todo o País. Investigações de homicídios, crimes contra a integridade física, abuso sexual de menores, raptos, sequestros, furtos, burlas e outros ilícitos são conduzidas com discrição, rigor e profissionalismo, produzindo resultados concretos e contribuindo para a segurança e proteção dos cidadãos.

Estes processos, por não envolverem protagonistas mediáticos, dificilmente captam a atenção dos comentadores ocasionais.

É importante sublinhar que o Ministério Público não está, nem deve estar, imune à crítica. O escrutínio público constitui um pilar essencial do funcionamento de qualquer instituição democrática. No entanto, a crítica deve pautar-se pela seriedade, pelo conhecimento e pela responsabilidade. Quando tal não acontece, não contribui para melhorar o sistema de justiça, pelo contrário, fragiliza a confiança do cidadão e obscurece o trabalho efetivamente realizado.

Ainda assim, observa-se que os magistrados do Ministério Público mantêm uma postura resiliente face às adversidades e à pressão mediática. Persistem na investigação da criminalidade económico-financeira, mesmo sabendo que este domínio é especialmente sensível e suscetível de gerar contestação. Todavia, essa resiliência, rigor, empenho e dedicação, são qualidades que parecem incomodar determinados setores da sociedade.

O Ministério Público é composto por magistrados altamente qualificados, com sólida formação jurídica, que desempenham um papel crucial na defesa da legalidade democrática e na promoção da justiça. Devem ser vistos como uma magistratura ativa, cooperante e próxima da comunidade, capaz de responder de forma eficaz às necessidades dos cidadãos.

A tradição japonesa do “Daruma”, um talismã japonês associado ao princípio “se caíres sete vezes, levanta-te oito”, reforça esta ideia de persistência. Tal como este símbolo, também os magistrados do Ministério Público têm demonstrado a capacidade de se reerguer perante cada tentativa de descredibilização ou desvalorização.

Têm, por isso, características semelhantes aos bonecos sempre-em-pé: equilibrados, persistentes, resilientes e, por mais que os tentem derrubar, estão sempre focados e determinados no cumprimento das funções que lhes foram constitucionalmente confiadas.

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