Os pontos que levantam dúvidas a Marcelo no Mais Habitação

Antes de conhecer a legislação do pacote “Mais Habitação”, Marcelo Rebelo de Sousa admitiu colocar em cima da mesa a hipótese de vetar as medidas ou enviá-las para Tribunal Constitucional se suscitarem dúvidas. Agora que já são conhecidas as suas propostas e decretos-lei, o Presidente da República reforça que vai olhar para a constitucionalidade de alguns pontos, nomeadamente a “densificação” dos conceitos de casa devoluta e de consumos baixos.

Uma das medidas do “Mais Habitação” que tem levantado mais polémica é o arrendamento forçado de casas devolutas. Na proposta de lei – que vai estar em consulta pública até 24 de março -, o Governo adiantou que os donos das casas devolutas têm 100 dias para usar ou arrendar, depois de os municípios apresentarem uma proposta de arrendamento ao proprietário. E ainda que serão as empresas de água, luz ou gás que deverão uma enviar a lista atualizada todos anos onde conste “a ausência de consumos ou consumos baixos” das casas.

Foi precisamente esta medida que Marcelo Rebelo de Sousa usou para exemplificar quais são os pontos do “Mais Habitação” que lhe têm levantado dúvidas, sobretudo a nível constitucional. “Por exemplo, conceitos como: onde a lei dizia ‘não haver consumo de água ou de eletricidade’ passar agora a dizer ‘consumo baixo’. O que é um consumo baixo? Depende da capacidade financeira e económica da pessoa. Consumo baixo é uma falta de densificação do conceito num tema sensível”, disse o Presidente da República em entrevista à RTP e ao Público.

Há ainda outros conceitos que é preciso “densificar”, na sua perspetiva. É o caso da “coincidência da definição de casa devoluta que vinha na Lei de Bases da Habitação de 2019 e agora na que é apresentada”, exemplifica Marcelo. A questão é que “se houver um certo tipo de conceitos que são utilizados para limitar o direito de propriedade privada que não estão suficientemente densificados, convém densificar em termos de ficar claro que não atinge a Constituição”, afirmou ainda citado pelo mesmo jornal.

Ainda sobre o arrendamento obrigatório de casas devolutas, o chefe de Estado alerta que os municípios não terão meios para “descobrir” os imóveis devolutos da esfera privada. “Já vários presidentes disseram que não têm meios para descobrir, a não ser uns poucos milhares de casas devolutas. Não têm a máquina, não sei se não têm vontade, não participaram”, explicou ainda.

Para Marcelo Rebelo de Sousa, o “fundamental” é perceber “se as fórmulas que propõem são concretizáveis”, para que não se façam leis que depois não são aplicáveis, reforça. E admite ainda que vê “pontos de convergência possíveis” entre as proposta do PS e do PSD para a Habitação, reconhecendo que “há espaço para conversa” no que diz respeito aos licenciamentos, incentivos fiscais e iniciativa privada, por exemplo. “Como Presidente da República vou olhar para isso vendo o consenso que é possível fazer, o debate público e o debate no Parlamento” e “vou olhar sobretudo para a eficiência do que é proposto”, além da constitucionalidade, garantiu na mesma entrevista à RTP. ?

Mariana Mortágua em risco de ser arguida

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Armando Vara vai voltar à cadeia de Évora

FIXADO CÚMULO JURÍDICO

Armando Vara vai ter de voltar a cadeia de Évora

Débora Carvalho

Atualidade IV Justiça

FIXADO CÚMULO JURÍDICO

• Armando Vara, antigo ministro socialista e ex-administrador da Caixa Geral de Depósitos, foi libertado da cadeia de Évora, em outubro de 2021, após cumprir três anos da pena, mas pode ter de regressar à prisão. O juiz Rui Coelho aplicou-lhe ontem uma pena única de cinco anos e um mês de prisão, em cúmulo jurídico das penas a que foi condenado nos processos Face Oculta e Operação Marquês. O magistrado não decidiu, no entanto, quanto tempo afinal ainda • falta cumprir. O Ministério Público (MP) e a defesa têm entendimentos diferentes sobre esta matéria. Para o procurador, falta cumprir dois anos e um mês de prisão. Já o advogado Tiago Rodrigues Bastos sustenta que são apenas 30 dias e que isso seria “ridículo”.

O imbróglio jurídico terá de ser decidido pelo Tribunal de Execução de Penas (TEP). Ao abrigo de um perdão de penas que aconteceu no quadro da Covid-19, Vara, hoje com 68 anos, cumpriu três anos da pena de cinco a que foi condenado no caso Face Oculta. Depois deste processo, voltou a ser condenado, em julho de 2021, a uma pena de dois anos de prisão por branqueamento de capitais no processo Marquês.

A defesa de Armando Vara confirmou ontem que vai recorrer da decisão para o Tribunal da Relação de Lisboa. Só depois disso é que o TEP vai deliberar. Se entender que não há lugar ao perdão, o antigo ministro tem de regressar a Évora para cumprir dois anos e um mês de prisão. Se, por outra lado, mantiver o perdão restaria um mês de prisão para o antigo governante.

Na sessão realizada no Juízo Central Criminal de Lisboa, o juiz explicou que a decisão teve em conta a ausência da prática de qualquer crime após o perdão, ‘ mas também as necessidades de prevenção geral e os danos associados aos crimes praticados por Vara. A decisão fica, no entanto, aquém do cúmulo jurídico de cinco anos e seis meses de prisão que havia sido pedido pelo MP.

E TAMBÉM

José Sócrates Ex-PM SÓCRATES SEM JULGAMENTO

Ao contrário de Armando Vara e Ricardo Salgado, que já foram julgados e condenados no âmbito da Operação Marquês, José Sócrates ainda não tem data para começar a ser julgado. O ex-governante foi pronunciado apenas por falsificação e branqueamento de capitais. Tem suscitado inúmeros recursos e reclamações.

Tráfico de influências Armando Vara foi condenado a uma pena de prisão de cinco anos no âmbito do processo Face Oculta, por três crimes de tráfico de influências.

MP PERDÃO REVOGADO

O procurador Vítor Pinto já tinha defendido que na pena única a aplicar pelo tribunal teria de ser descontado o

tempo efetivamente cumprido, mas não o perdão que fora concedido a Armando Vara durante a pandemia.

TRIBUNAL VARA NÃO MARCOU PRESENÇA

O antigo gestor do banco

público não esteve presente na audiência. Foi representado pelos advogados, entre os quais Tiago Rodrigues Bastos.

DEFESA NÃO DEVE VOLTARÁ CADEIA

A defesa considera que, mesmo que tenha de cumprir os 30 dias, isso dificilmente acontecerá. “É um bocadinho ridículo estar a sujeitar Vara a entrar no sistema por causa de um mês”, afirmou.

MARQUÊS DOIS MILHÕES NA SUÍÇA

Os juízes do caso Marquês entenderam que ficou demonstrado que Vara pôs 2 milhões de euros na Suíça, posteriormente trazidos para Portugal. Terá depois branqueado meio milhão em negócios imobiliários.

Tiago Rodrigues Bastos

Advogado critica imbróglio jurídico com pena única

• “A pena de cinco anos está integralmente cumprida – três anos cumpridos e dois anos pelo perdão. A lei do perdão é muito clara e diz que a única

condição a que o perdão estava sujeito era não ser cometido nenhum crime no ano sub

sequente à aplicação do perdão. Creio que temos uma

situação pacificada. O que é, enfim, mais ou menos ridículo, e estranho, é agora este mês”, referiu o advogado de Vara, Tiago Rodrigues Bastos, que criticou o “imbróglio jurídico” com o novo cúmulo jurídico.

NOTA EDITORIAL

Um tempo que não passou

Eduardo Dâmaso

Diretor-geral editorial adjunto

Armando Vara pode estar, de novo, a caminho da prisão. Desta decisão, que lhe volta a colocar o

horizonte prisional, sobra uma querela jurídica que a justiça resolverá. O que aqui importa é outra coisa. Armando Vara e a história

judicial que arrasta são expressões de um tempo que demora a passar.

Juntamente com Sócrates, Ricardo Salgado e muitos outros, Vara protagonizou uma época, até 2014, grosso modo, em que Portugal foi dominado por um conjunto de interesses obscu-

Vara emerge como o único castigado de um tempo que nos golpeou

ros. Por gente que acumulou um vasto império de dinheiro e poder. Quando Sócrates continua, pomograficamente, a explorar todas as debilidades de um

sistema judicial, afundado numa teia que esmaga a própria ideia de garantismo, Vara já pagou uma grande parte da sua dívida à sociedade. Quando Ricardo Salgado navega nas águas mansas da demência autoinfligida, escapando à frequência da hotelaria prisional, onde jamais entrará, Armando Vara emerge como o único rosto castigado, desse tempo que golpeou a democracia. É quase obsceno, para um País e uma sociedade, consentir que as necessidades de repara

ção, de prevenção geral e especial, se satisfaçam com isso. Já era tempo de prevalecer algum bom senso e virar a agulha para onde todos os dias se cava o terreno da impunidade. E esse, seguramente, já não é o de Armando Vara.

Débora Carvalho

• Uma caixa de robalos, um pão de ló e 25 mil euros foi o quanto bastou para que um coletivo de juízes condenasse Armando Vara a uma pena de cinco anos de prisão efetiva por tráfico de influências no processo Face Oculta. A condenação foi decretada em setembro de 2014, no Tribunal de Aveiro.

FICOU PROVADO QUE VARA RECEBEU 25 MIL EUROS DO SUCATEIRO MANUEL GODINHO

O coletivo de juízes deu como provado que o antigo ministro e ex-vice-presidente do BCP recebeu 25 mil euros do sucateiro Manuel Godinho, o principal arguido no caso, como compensação pelas diligências empreendidas em favor das suas empresas. O crime de tráfico de influências só existe no Código Penal desde 1995.0 antigo gestor do banco público foi o primeiro dos grandes ‘poderosos’ a ir parar efetivamente à cadeia. Corre agora o risco de voltar à

prisão de Évora para acertar contas com a Justiça, por causa do novo cúmulo

jurídico das penas.

PROCESSOS Juiz aplicou-lhe uma pena única de 5 anos e um mês de prisão, mas não decidiu quanto falta cumprir

Armando Vara foi condenado a dois anos de prisão na Operação Marquês, quando cumpria cinco no Face Oculta. Só cumpriu três anos e saiu após perdão

Vara foi condenado, em setembro de 2014, pelo tribunal de Aveiro, no caso Face Oculta

Guerra fez recuar democracia na Ucrânia

João Ruela Ribeiro

Relatório da Freedom House mostra quase tantos retrocessos como progressos democráticos no mundo em 2022

O mundo ainda não saiu do período de retrocesso democrático iniciado há mais de uma década, mas os progressos positivos por po…