Só a TAP agravou o défice de 2020 em 1200 milhões de euros

INE estima em 2,3% do PIB o impacto direto das medidas excecionais de apoio no contexto da pandemia COVID-19. E alerta para a “dívida potencial” entre os €7.160 milhões de garantias prestadas em 2020

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Os dados dos principais agregados das administrações públicas revelados esta sexta-feira pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) revelam que, em 2020, as despesas totalizaram 98.088 milhões de euros contra 86.587 milhões de receitas.

Face ao Orçamento Suplementar proposto em junho de 2020, a despesa terá ficado €1.089 milhões abaixo do inicialmente previsto. Ainda assim a despesa subiu 7,8% face a 2019 enquanto a receita caiu 5%.

Entre 2019 e 2020, o saldo agravou-se em 11,7 mil milhões de euros, originando uma necessidade de financiamento de 11,5 mil milhões de euros em 2020 (-5,7% do PIB).

O INE estima que o impacto direto no saldo das medidas excecionais de apoio no contexto da pandemia COVID-19 foi cerca de 2,3% do PIB, tendo por referência a informação disponível à data incluída nos boletins de execução orçamental publicados mensalmente pela Direção-Geral do Orçamento.

Também assinala que o saldo primário – o défice sem os encargos com juros – foi negativo em 5,7 mil milhões de euros. O que não acontecia desde 2014 Mais TAP, menos juros

Segundo o INE, a despesa pública registou um aumento de 7,8% entre 2019 e 2020, em consequência do acréscimo simultâneo da despesa corrente (+5,9%) e da despesa de capital (+33,6%).

O acréscimo na despesa de capital entre 2019 e 2020 (+33,6%) é em larga medida explicado pelo registo, como transferências de capital, do empréstimo da Direção Geral do Tesouro e Finanças à TAP Air Portugal no montante de 1,2 mil milhões de euros e da garantia do Governo Regional dos Açores ao financiamento obtido pela SATA Air Açores no montante de 132 milhões de euros, atendendo à situação económica e financeira das duas empresas.

Na notificação do procedimento dos défices excessivos, o INE refere o empréstimo da Direção Geral do Tesouro e Finanças à TAP Air Portugal no montante de 1200 milhões de euros, classificado como transferência de capital tendo em consideração a situação económica e financeira da empresa.

Nas despesas de capital, também se inclui o registo da obrigação de pagamento de retroativos referentes a suplementos de férias não pagos a agentes da Polícia de Segurança Pública e da Guarda Nacional Republicana, resultante de uma sentença de tribunal, no montante de 114 milhões de euros.

Para o aumento da despesa corrente contribuiu principalmente o incremento de 4,1% das prestações sociais, exceto transferências sociais em espécie, correspondente a 1,4 mil milhões de euros, e também o aumento de 3,7% das remunerações (+838 milhões de euros).

Em sentido oposto, verificou-se um decréscimo de 8,6% na despesa em juros (-544 milhões de euros), mantendo a tendência decrescente que se vem observando desde 2015 (em 2014, a despesa com juros foi 8,4 mil milhões de euros e, em 2020, foi 5,8 mil milhões de euros).

Tudo somado, cerca de metade do aumento verificado na despesa pública entre 2019 e 2020 traduz o impacto direto de medidas excecionais de apoio no contexto da pandemia COVID-19, correspondentes a 3,6% da despesa pública total em 2020. Entre os encargos públicos com a pandemia, destacam-se a despesa em subsídios às empresas (2,2% da despesa total em 2020) e o apoio social às famílias (0,2%).

Alerta nas garantias

O comportamento da despesa efetiva foi significativamente influenciado pelo impacto direto das medidas tomadas no contexto da pandemia COVID-19.

Mas o INE alerta que, além destas medidas, foram implementadas outras medidas de apoio à economia, em particular às empresas, que não se traduzem em despesa efetiva, como sejam as garantias concedidas pelas administrações públicas sobre empréstimos de instituições financeiras.

Em contas nacionais, as garantias constituem um passivo contingente (dívida potencial) no momento em que são concedidas, sendo apenas registadas como despesa caso sejam executadas e no momento da sua execução.

Em 2020, o montante global de garantias concedidas por entidades das administrações públicas ascendeu a cerca de 7.160 milhões de euros, o que compara com cerca de 950 milhões de euros concedidas no ano anterior. Fundos europeus aumentam receitas

A receita pública diminuiu 5,0% (cerca de 4,6 mil milhões de euros) entre 2019 e 2020, em resultado da diminuição de 5,2% na receita corrente, impulsionada sobretudo pelo decréscimo dos impostos sobre a produção e a importação (-9,1%), mas também dos impostos correntes sobre o rendimento e património (-3,7%), refletindo a forte redução da atividade económica em 2020. Pelo contrário, a receita das contribuições sociais registou um aumento (+1,2%).

A receita de capital registou um acréscimo de cerca de 20%, em particular devido ao aumento das transferências de capital recebidas da União Europeia que, em parte, foram direcionadas para o financiamento de medidas de apoio às empresas e às famílias no contexto da pandemia COVID-19.

Devido às medidas de pagamento fracionado de impostos e contribuições sociais tomadas no contexto da pandemia COVID-19, o INE explica que foi necessário efetuar um ajustamento adicional de modo a incluir os pagamentos futuros na receita do período em que se gerou a obrigação de pagamento.

Este ajustamento adicional traduziu-se num registo da receita fiscal de IVA em cerca de 236 milhões de euros superior ao efetuado em contabilidade pública, referentes às medidas de prorrogação de pagamento do IVA devido entre o final de 2020 e o início de 2021 e que constituem receita em 2020 na ótica de contas nacionais.