Pandemia fez disparar as tentativas de burla por email e telemóvel

Reclamações relacionadas com burlas aumentaram 73% em relação ao ano passado

Carlos Carriço descreve como atender telefonema de número desconhecido lhe custou caro: mais de 2500 euros

Se receber mensagens de grandes empresas de serviços desconfie: saiba os cuidados a ter para não ser enganado

ZOOM // BURLAS DISPARAM EM TEMPO DE PANDEMIA

Maria Moreira Rato

Online, via chamada telefónica ou por SMS, as burlas têm crescido exponencialmente desde o surgimento da covid-19. O i conversou com vítimas e especialistas para compreender este fenómeno.

“Repetiu os números 131314. Fez-se luz e exclamei ‘Fui burlado!’”

Entre os dias 1 de janeiro e8 de março houve um aumento de 73% de reclamações relacionadas com burlas, em relação ao mesmo período do ano passado. Carlos Carriço, proprietário de um restaurante, conta o seu caso.

MARIA MOREIRA RATO
maria. rato@ionline.pt

As burlas destinadas ao roubo de dados bancários das vítimas (phishing) aumentaram tanto por meios eletrónicos como via chamada telefónica e mensagens escritas. O alerta foi dado pela Europol; em Portugal, a Polícia Judiciária realçou-o no passado mês de fevereiro. Desde alegadas SMS dos CTT, passando por chamadas de burlões que dizem trabalhar para a EDP, falcatruas levadas a cabo por MB WAY, emails assinados pela Direção-Geral da Administração da Justiça ou por gestores de conta, os perigos são muitos.

PERDER MAIS de 2.ooo euros Proprietário do restaurante A Ribeira, em Montemor-o-Novo, há 22 anos, Carlos Carriço nunca havia sido contactado pelo número cuja chamada atendeu no passado dia 30 de dezembro. Para poder dar atenção ao que lhe estava a ser dito, fez uma pausa na preparação dos pedidos de take-away do estabelecimento. Parecia uma boa notícia: a EDP devolver-lhe ia dinheiro que havia pago em excesso nas faturas anteriores. “Como estivemos três meses fechados, o suposto colaborador da empresa explicou-me que queriam dar-me o dinheiro porque o valor das faturas tinha estado a ser calculado por estimativa”, conta o empresário. O interlocutor disse-lhe ainda que “no final do ano, tinha de ser feito um acerto de contas”.

Com pouco tempo para falar, Carlos questionou sea conversa podia ser adiada para dali a umas horas. O criminoso respondeu-lhe que, como a equipa estava em regime de teletrabalho, era imperativo solucionar o assunto. “Então, eu sugeri que fossem abatendo o valor em excesso nas faturas seguintes, mas ele insistiu”, recorda. Devido à urgência demonstrada, dirigiu-se a um multibanco. “Ele garantiu que havia uma data de opções e que conseguiriam fazer a transferência para a minha conta se seguisse os passos que indicariam”, evoca o alentejano de 50 anos. Embora tenha estranhado, pensou que “podiam estar a dizer a verdade, tudo podia bater certo”.

Assim, em frente à caixa automática e em chamada com o interlocutor, preencheu o campo da entidade e, de seguida, o da referência, para tentar recuperar o valor que a falsa EDP dizia dever-lhe. “Quando pediu que inserisse os números 131314, no montante, disse que era um código específico para que a dívida da empresa fosse saldada e não ficariam a dever-me nem um euro”, explicita.

“Automaticamente, ao dar-me as indicações todas, saiu o talão da máquina e percebi que tinha feito uma transferência. E ele respondeu: ‘Você fez aí qualquer coisa errada, errou algum número, faça novamente o mesmo senão não consegue reaver o dinheiro’”, afirma, recuando àqueles momentos em que foi enganado. “Ele repetiu os números 131314, com a referência e a entidade diferentes. Fez-se luz e exclamei: ‘Fui burlado!’”.E o homem disse apenas para aguardar um segundo que resolveria a situação. Agarrei no telemóvel e fui logo à conta bancária, através da aplicação do banco”. Carlos Carriço contactou de imediato a instituição bancária para saber se seria viável solicitar a anulação das transferências que, juntas, perfazem o valor de 2626,28 euros.

“Fui à GNR fazer queixa. Reclamei presencialmentejunto do banco, mas recebi uma carta a dizer que o mesmo não se responsabiliza por aquilo que aconteceu”, menciona o proprietário do restaurante. Foi igualmente contactado pelo Tribunal de Montemor-o-Novo – todavia, não tem esperança de que seja feita justiça. “Parece que estas pessoas têm uma espécie de narrativa programada, mas podem falhar, eu podia nem sequer ter dinheiro para receber”, contrapõe. E sublinha que, em plena pandemia, qualquer cidadão está ainda mais exposto às burlas. “As pessoas só trabalham, ficam desligadas do mundo. Se acham que, por exemplo, vão deixar de ter luz, pagam o que for necessário para não terem mais um problema na vida”, reconhece.

Desde que foi burlado, há mais de um mês, Carlos já ligou algumas vezes para o número através do qual foi burlado. “Apenas chama, chama e ninguém atende”.Na ótica da vítima, tal acontece porque “é demasiado fácil comprar cartões SIM”, sendo que “tinha a música de espera da EDP e tudo o mais, até a gravação sobre a proteção de dados”. “Esta gente é mesmo profissional”, deduz. “Nunca pensei que seria uma burla. Se calhar, em 1000,100 caem. Deve haver muita gente a sofrer”, lamenta, comentando que o roubo de quase 3.000 euros de que foi alvo “teve um grande impacto” na sua vida, principalmente porque, naquele dia, tinha de pagar os ordenados aos empregados e as faturas aos fornecedores. “Abri o restaurante em 1999 e não queria recorrer às minhas poupanças, mas não tive alternativa”.

O QUE É UMA BURLA? A palavra anda de boca em boca, mas nem todos temos o conceito clarificado e apreendido mentalmente. A burla é um crime previsto no Código Penal. Na perspetiva do advogado David Silva Ramalho, “a partir do momento em que haja atos de execução de um crime de burla, o facto passa a ser punível a título de tentativa” e, assim, “se alguém se faz passar falsamente por trabalhador de uma empresa com o objetivo de enganar terceiro e desse modo tentar levá-lo a fazer uma disposição patrimonial que não é devida, poderá ser punido a título de burla na forma tentada”. Silva Ramalho frisa que “se o prejuízo se concretizar, a burla será punível na forma consumada”.

O associado principal na equipa de Contencioso Criminal, Risco e Compliance da Morais Leitão evidencia que “a burla tem uma modalidade simples e outra qualificada”.E especifica: “A primeira depende de queixa por parte do titular do interesse que a norma visa tutelar geralmente o burlado ao passo que a segunda, sendo de natureza pública, dará automaticamente lugar a abertura de inquérito quando chegue ao conhecimento do Ministério Público, sem necessidade de queixa”.

O profissional especializado em cibercrime e prova digital e assistente convidado na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa prossegue: “Dentro da burla qualificada existem duas modalidades distinta: a primeira é punível com pena de prisão até 5 anos ou com pena de multa até 600 dias e pressupõe que o prejuízo patrimonial causado é de valor elevado”, ou seja, igual ou superior a 5100 euros. Já a segunda modalidade da burla qualificada “é punível com pena de prisão de 2 a 8 anos e pressupõe que o prejuízo seja de valor consideravelmente elevado, ou seja, igual ou superior a 20.400 euros, o agente faça da burla modo de vida, se aproveite de situação de especial vulnerabilidade da vítima, em razão de idade, deficiência ou doença, ou a pessoa prejudicada fique em difícil situação económica”.

SIMULAÇÃO DE ENCOMENDA E FALSOS GESTORES

Marisa (nome fictício) não é aficionada das novas tecnologias, mas criou uma conta de email para “estar mais ligada ao mundo”. Apesar de ter 36 anos, a cozinheira, residente na região da Grande Lisboa, considera que não tem literacia digital suficiente para entender os perigos aos quais pode estar exposta no universo virtual.

Contudo, no dia 16 de fevereiro, abriu “sem querer” a pasta de Spam -à época, não sabia que se trata de mensagens comerciais não-solicitadas- do seu email e deparou com uma mensagem que lhe teria sido enviada pelos CTT. De acordo com o screenshot que nos reencaminhou, o remetente é “CTT-Atendimento ao Cliente” e, o endereço, contact@coscererye.com. No corpo do texto, pode ler-se: “Olá. Sua remessa está infelizmente atrasada. Causa: Taxa da Categoria B ausente. Por favor, vá para nosso site para continuar. Seu pacote será enviado quando o pagamento for concluído. Tempo de entrega: 1-2 dias. Sinceramente seu, CTT Correios”.

“Aquilo que me chamou a atenção foi o facto de, logo no cabeçalho do email, estar um aviso a vermelho, muito garrido”, diz, referindo-se ao alerta “Esta mensagem parece ser perigosa. Contém um link suspeito que foi utilizado para roubar informações pessoais de utilizadores. Evite clicar em links ou responder com informações pessoais”.

Miguel Van Der Veen, do Portal da Queixa – rede social de consumidores online por meio da qual qualquer pessoa pode reclamar, apresentar reclamações online, opiniões e apelar à defesa do consumidor -, não estranha. Sabe que “com o aumento das compras online e após a analise das reclamações no Portal da Queixa, toma-se evidente o aumento das burlas em meio digital”.E nota que, “quando analisado o ano completo de 2020, sobre as reclamações dirigidas ao Comércio Eletrónico, verificamos um total de 12.642 reclamações, um aumento de 122% face a 2019, onde foram registadas 5.689 reclamações”.

Naquilo que concerne as burlas, de forma mais direta, o especialista em Marketing Digital esclarece que de, entre as reclamações anteriormente mencionadas, 5.786 reclamações eram relacionadas com este crime, “um enorme aumento de 69% face ao ano de 2019”. Explorando os restantes emails que haviam sido rececionados indesejadamente e que continham o mesmo aviso associado, Marisa lembra aqueles que diziam respeito a uma plataforma de investimento. “Olá. Você foi convidado exclusivamente a plataforma de investimento prémio por um amigo seu. Seu amigo ganhou o direito de convidar alguém para a plataforma, ganhando mais que €2000 em apenas 3 dias! Tudo que você tem que fazer para começar é investir 250€, e depois prometemos sua renda vai acima de €2000 em apenas 3 dias. Assim como seu amigo. Inscrição para uma conta premium agora. O convite está disponível por 48 horas. Cumprimentos, seu novo gerente comercial”, constata-se em emails enviados por endereços como livhotsonl234@gmail.com.

“Falei com o meu namorado e ele pediu que nunca mais abrisse nada do género. Felizmente, não cliquei em nenhuma das hiperligações, mas tenho medo de me enganar e ser roubada”, conclui.

“MANDARAM IR AO MULTIBANCO INTRODUZIR UM CÓDIGO”

Entre os dias 1 de janeiro e8 de março de 2020, o Portal da Queixa registou 850 reclamações, enquanto, no período homólogo do ano corrente, verificou 1.471, o que representa um aumento de 73%. Miguel Van Der Veen explicita que “a grande parte dos casos está relacionada com burlas onde o burlão consegue aceder à conta bancária da vitima por intermédio do serviço MB WAY”. A esse propósito, partilha com o i a história de dois consumidores que foram enganados através do OLX.

“Hoje fui burlado em 1650€ por ter dado o código que recebi em SMS por parte do burlão. Já coloquei o meu cartão em lista negra. Apresentei queixa no Portal da Queixa e amanhã vou à GNR. O que posso fazer para reaver o meu dinheiro?! Alguém me pode ajudar a saber que mais devo fazer? Obrigado”, escreveu um utilizador no passado dia 2 de janeiro, tendo sido aconselhado, pelo MB WAY, a não fornecer dados confidenciais ou pessoais via correio eletrónico ou SMS, a não seguir ligações recebidas via correio eletrónico ou SMS e a verificar o extrato da sua conta bancária com regularidade.

Por outro lado, a7 de junho de 2020, uma consumidora e o marido apresentaram queixa, no site, por terem sido burlados no contexto de uma venda no OLX. “Fizeram-se interessados na compra e mandaram ir ao multibanco introduzir um código e o número de telemóvel para ver se lá estava o pagamento. Feito isto roubaram-me 2.500 euros”, escreveu, questionando se a SIBS – Sociedade Interbancária de Serviços – “ainda não conseguiu fazer nada para acabar ou minimizar estas burlas?”. Perguntava ainda se a entidade lhe devolveria o dinheiro “visto não contribuir em nada para acabar com isto”.

A queixosa notou que a burla ocorreu diretamente com o companheiro, no entanto, a conta em causa é partilhada pelos dois. “Visto ser domingo e não poder ir ao banco, vou agora à Polícia Judiciária apresentar queixa, isto é uma vergonha e esta aplicação com tantas queixas já devia ter sido banida na sua utilização”, redigiu a mulher aludindo àquela que é descrita como “a solução digital da SIBS para simplificar os pagamentos mobile”.

RECEBER UMA CERTIDÃO POR MERO ACASO

Segundo dados disponíveis na Área de Serviços Digitais dos Tribunais, uma Certidão Judicial Eletrónica “trata-se de um documento (formato PDF) assinado eletronicamente através de certificado do Ministério da Justiça, garantindo desta forma a sua autenticidade, que certifica a informação respeitante a um processo judicial identificado”, mas, no dia 1 de fevereiro, através do remetente Justiça-GOV -15, Alice (nome fictício) recebeu o seguinte email: “Excelentíssima Senhora. O pedido de certidão judicial eletrónica de número 176503597876813, que se encontrava em análise, foi aceito”.

Tal não poderia ocorrer pois, seguindo os dados disponibilizados online pelo Ministério da Justiça, é percetível que este documento, quando emitido, é passível de consulta na área reservada de quem o requereu, podendo ainda ser consultado, durante 6 meses, por qualquer pessoa que tenha o respetivo código de acesso.

CUIDADOSA TER

No seu site oficial, relativamente a burlas em tempos de covid19, a Europol apelou aos cidadãos que pensem duas vezes antes de clicar num link ou num anexo, pois “o remetente pode estar a tentar cometer phishing, o modo como os criminosos usam a engenharia social para aceder às informações pessoais”.É de mencionar que o crime cometido quando uma pessoa envia um email, uma mensagem ou utiliza outro meio de comunicação para convencer o destinatário a revelar informações pessoais.

Seguindo esta linha de pensamento, a Europol aconselhou os internautas a estarem particularmente atentos a mensagens enviadas por uma organização respeitável como uma instituição médica ou governamental, ao eventual cariz de urgência das mesmas e à referência a notícias urgente última hora. Por sua vez, Silva Ramalho garante que “existem diversos indícios de que a conduta constitui uma burla” e estes “podem ser encontrados no remetente do e-mail – tipicamente diferente do endereço oficial e associado a domínios distintos, no endereço do website-em casos de phishing, no número de telefone utilizado, na insistência para a realização de um pagamento ou no geral desconhecimento de informações sobre o destinatário”.

“Entre diversos procedimentos que têm sempre por pressuposto a possibilidade de se estar a falar com um terceiro mal intencionado, o destinatário de um contacto desta natureza deverá abster-se de facultar informação ou documentação sua”, adianta o advogado, rematando que o mesmo também não deve “proceder a qualquer pagamento sem antes confirmar junto da empresa, por sua iniciativa e através dos contactas oficiais, a genuinidade do pedido”.

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Parlamento chumba candidato do PSD a juiz do Tribunal Constiticional (e fiscais para as secretas)

O professor universitário e atual presidente da Entidade das Contas José Eduardo Figueiredo Dias falhou a eleição para juiz do Tribunal Constitucional, com mais votos brancos do que favoráveis. Assembleia da República deu ainda nega aos nomes apresentados para o Conselho de Fiscalização do Sistema de Informações da República Portuguesa, para o Conselho Superior de Defesa Nacional, e para o Conselho de Fiscalização do Sistema Integrado de Informação Criminal

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A Assembleia da República ‘chumbou’ esta quarta-feira a eleição de José Eduardo Figueiredo Dias para juiz do Tribunal Constitucional. O professor universitário e atual presidente da Entidade das Contas foi proposto pelo PSD e teve mais votos brancos do que favoráveis.

De acordo com a porta-voz da conferência de líderes, a deputada do PS Maria da Luz Rosinha, Figueiredo Dias recolheu apenas 103 votos favoráveis do total de 225 votantes – numa eleição por voto secreto que decorreu durante a tarde -, muito aquém dos dois terços exigidos pela Constituição. O candidato teve, aliás, mais votos brancos (107) do que favoráveis e ainda 15 votos nulos. Tinha sido proposto pelo PSD como candidato a juiz do Tribunal Constitucional (TC), em substituição de Manuel Costa Andrade, que terminou o mandato em fevereiro.

Na audição parlamentar regimental, realizada na quarta-feira, José Eduardo Figueiredo Dias evitou tomar uma posição definitiva sobre a morte assistida e outros dossiês mais polémicos. “Tenho uma opinião, sei o que está em jogo, mas não estudei a fundo a questão”, afirmou o candidato a juiz, referindo-se à eutanásia, e acrescentou: “Não posso ficar refém de uma opinião que eu diga de uma forma menos refletida.”

O currículo do atual presidente da Entidade das Contas e Financiamentos Políticos (ECFP), cargo que ocupa desde 2017, mereceu o elogio dos quatro deputados que o questionaram, por videoconferência, mas que também lhe colocaram perguntas, nomeadamente sobre duas leis que estão no Palácio Ratton, lei da eutanásia, a pedido do Presidente da República, e lei eleitoral das autarquias locais, a pedido da provedora de Justiça.

José Manuel Pureza (BE) alertou que a eleição de quinta-feira “não é prova académica” e que currículo e a capacidade técnica para desempenhar o cargo, mas sim uma “escolha política” em que é preciso conhecer a “mundividência” do candidato. “É o universo das suas escolhas que está aqui em jogo”, disse. Na resposta, o candidato a juiz admitiu que a eleição “não é uma prova académica”, e sublinhou: “Mas eu sou um académico e um universitário. E é isso que eu sou, é assim que me considero.” E deu uma garantia aos deputados: “Sei que serei independente no exercício do cargo.”

Já Telmo Correia (CDS-PP) afirmou que lhe parece “um pouco estranho este tipo de consideração” e perguntas ao candidato a juiz. “Porque o que esperamos de um juiz de um qualquer tribunal é que exerça a sua função com tal independência, imparcialidade e na defesa e no respeito pela Constituição”, disse.

O Tribunal Constitucional é composto por 13 juízes, dez deles eleitos pela Assembleia da República por maioria uma qualificada de deputados (dois terços), o que obriga a um acordo entre os dois maiores partidos – PS e PSD. Têm um mandato único de nove anos.

Chumbo nas secretas

A Assembleia da República ‘chumbou’ também candidatos a outros órgãos externos: Conselho de Fiscalização do Sistema de Informações da República Portuguesa (CFSIRP), Conselho Superior de Defesa Nacional, e Conselho de Fiscalização do Sistema Integrado de Informação Criminal.

A eleição destes três órgãos exigia uma maioria de dois terços, que voltou a não ser alcançada (tal como em julho do ano passado), apesar de PS e PSD terem entregado listas conjuntas.

No caso do Conselho de Fiscalização do SIRP falharam a eleição a ex-secretária de Estado do PS Susana Amador e o deputado do PSD Joaquim Ponte. Para o Conselho Superior de Defesa Nacional, falhou a eleição a vice-presidente da bancada socialista Lara Martinho. Para as três vagas em aberto no Conselho de Fiscalização do Sistema Integrado de Informação Criminal, não foram eleitos Isabel Oneto (PS), Luciano Gomes (PSD) e António Gameiro (PS).

Assim, das oito eleições que decorreram esta quarta-feira para órgãos externos (por voto secreto, durante toda a tarde) apenas foram eleitos os candidatos que não precisavam de dois terços: Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida (seis membros), Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (dois membros), Conselho de Opinião da RTP (dez membros) e Mecanismo nacional de monitorização da implementação da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (dois membros).

Ministros da Justiça fazem ponto da situação da Procuradoria Europeia

Os ministros da Justiça da União Europeia (UE) vão debater hoje vários dossiês legislativos em curso e o processo de instalação da Procuradoria Europeia, numa videoconferência dirigida desde Lisboa pela ministra Francisca Van Dunem.

De acordo com a agenda da reunião, “a presidência irá atualizar os ministros sobre uma série de tópicos, incluindo o combate aos conteúdos ilegais em linha no contexto da proposta da lei dos serviços digitais, conclusões sobre a formação de profissionais da justiça e o trabalho em curso sobre as propostas legislativas atuais”.

Van Dunem, enquanto presidente em exercício do Conselho de ministros da Justiça da UE, também deverá apresentar “uma proposta para lançar um novo diálogo sobre Justiça e Assuntos Internos com parceiros do norte de África”.

Por seu lado, a Comissão Europeia fará “um ponto da situação da criação da Procuradoria Europeia”, designadamente ao nível da implementação do regulamento para a sua implementação, que tanto o executivo comunitário como os Estados-membros envolvidos continuam a defender que deve ter lugar “o mais cedo possível”.

A data para a entrada em funções da nova Procuradoria — que junta 22 Estados-membros, entre os quais Portugal — será determinada pelo executivo comunitário, com base numa proposta a ser feita pela Procuradora-Geral, Laura Codruta Kovesi, assim que a instituição estiver oficialmente instalada.

Durante esta videoconferência, a Comissão também fornecerá informações sobre o trabalho preparatório do relatório deste ano sobre o Estado de direito, e os 27 debaterão de que modo pode ser reforçada a aplicação da Carta dos Direitos Fundamentais da UE, com base na estratégia apresentada por Bruxelas em dezembro último.

Noutro ponto da agenda, “a Comissão também informará os ministros sobre as oportunidades oferecidas pelo Mecanismo de Recuperação e Resiliência para promover, em particular, a digitalização da justiça, e sobre a transferência de dados pessoais para o Reino Unido”, indica o Conselho.

Esta videoconferência de ministros da Justiça da UE, com início previsto para as 10:00 de Bruxelas (09:00 de Lisboa), será seguida, na sexta-feira, por uma reunião também ‘virtual’ de ministros dos Assuntos Internos, a ser presidida pelo ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita.