Notícias do dia

Segredos protegidos

Carlos Rodrigues Lima

JUSTIÇA. CASO DA MORTE DO GESTOR DE ISABEL DO SANTOS ARQUIVADO

Nuno Ribeiro da Cunha, antigo diretor de private banking do Eurobic, foi encontrado morto há um ano. O MP acreditava que os seus telemóveis tivessem informação relev…

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VA LÁ À SUA VIDA

Rodrigues Lima

Habituada a catequizar o resto do País, a bolha político-mediática de Lisboa sente-se agora ameaçada pelos trauliteiros militantes do Chega. Querem travar André Ventura? Fácil: antecipem as Legislativas de 2023 antes que seja tarde de m…

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VA LÁ À SUA VIDA

Rodrigues Lima

Habituada a catequizar o resto do País, a bolha político-mediática de Lisboa sente-se agora ameaçada pelos trauliteiros militantes do Chega. Querem travar André Ventura? Fácil: antecipem as Legislativas de 2023 antes que seja tarde de m…

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Godinho apanha dois anos

AVEIRO Manuel Godinho em tribunal

?O empresário Manuel Godinho, principal arguido do caso Face Oculta, foi ontem condenado a dois anos de prisão suspensa, num processo por fraude fiscal, ainda que o Tribunal de Aveiro tenha concluído que não houve pre…

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O ficheiro mais secreto do Banco de Portugal vai continuar num cofre

SÍLVIA CANECO

RESOLUÇÃO DO BES

Há anos que governantes, deputados e arguidos do caso BES andam atrás de um famoso relatório sobre a atuação do banco central na resolução do Banco Espírito Santo. Centeno entreabriu a porta, mas o Tribunal da Relação de Lisboa decidiu que o documento deve continuar em sigilo

o ficheiro secreto mais sigiloso do Banco de Portugal. Há muito tempo que se ouve falar dele e há muito que deputados e arguidos do caso BES correm atrás dele: um famoso relatório guardado a sete chaves e que critica a forma como o supervisor bancário geriu a crise do Banco Espírito Santo (BES) nos meses que antecederam a sua resolução, em 2014. Carlos Costa sempre se recusou a mostrá-lo. Mário Centeno chegou a governador e até admitiu divulgá-lo,

mas só se um tribunal concordasse. As expectativas eram grandes, mas agora o Tribunal da Relação de Lisboa decidiu que deve permanecer como está, em sigilo absoluto, e que não há razões para levantar o segredo de supervisão.

Apesar de até alguns governantes, como António Costa e Mariana Vieira

da Silva,já terem defendido o interesse público deste relatório, as juízas Fátima Reis Silva, Vera Antunes e Amélia Sofia Rebelo concluíram que o documento em causa “não é imprescindível para a descoberta da verdade”. Por um lado, alegam, porque o relatório “não

se destina à prova de factos, mas antes à corroboração de conclusões extraídas de factos”; por outro, porque o relatório é “um meio de prova indireto, dado que

(…) foi elaborado a posteriori aos factos em discussão nos autos, pelo que, quando muito, poderia concorrer para formar a convicção do tribunal, mas nunca a poderia, por si só, sustentar”, dizem.

A decisão, à qual a VISÃO teve acesso, foi tomada a 12 de janeiro, no âmbito do processo de insolvência do Banco Espírito Santo (BES). Ricardo Salgado, ex-presidente do BES, e Rui Silveira, ex-administrador que coordenou o departamento jurídico do banco, fizeram o pedido ao Tribunal do Comércio de Lisboa, argumentando ser um documento essencial para determinar todos os culpados pela queda do banco e pelo enorme rasto de lesados que a resolução causou. O Banco de Portugal invocou os segredos bancário e de supervisão para não ceder o documento, mas o juiz entendeu que era importante conhecê-lo e reencaminhou a questão para o Tribunal da Relação de Lisboa, a instância competente para decidir se o segredo de supervisão deve ou não ser levantado.

Agora, os argumentos usados pelo tribunal supervisor para recusar o levan-tamento do sigilo deixaram alguns intervenientes no processo de insolvência estupefactos. Isto porque, em qualquer processo, nenhum documento vale por si só – todos os documentos servem para o coletivo de juízes formar um juízo; e se, por norma, se barrassem todos os meios de prova elaborados depois dos factos, nunca seriam anexadas perícias ou auditorias a qualquer processo judicial, por exemplo.

Em vez disso, as magistradas do Tribunal da Relação de Lisboa entendem que o juízo de que o Banco de Portugal “agiu mal” no processo que levou à resolução do BES, em agosto de 2014, “deve ser atingido pelo próprio tribunal e não por terceiros”. “Por outras palavras, o facto de uma entidade contratada para o efeito ter analisado (não se sabe com que meios, por quanto tempo, em que extensão e com acesso a que elementos) a atuação do Banco de Portugal e ter concluído criticamente quanto à mesma não implica que o tribunal fique convencido do mesmo”, argumentam

as juízas. Uma fonte ligada ao processo questiona: “Como se pode saber se um documento pode ou não ser suficiente para convencer um tribunal, quando ninguém sabe, nem mesmo o tribunal que assim decide, o que está dentro

desse documento?”

MORTÁGUA NÃO DESISTE Este relatório foi encomendado pelo Banco de Portugal em 2015. Coordenado por João Costa Pinto, então presidente da comissão de auditoria do banco central, teve apoio técnico da consultora Boston Consulting Group. Quem conhece o documento diz que este é bastante crítico da atuação do supervisor bancário nos meses que antecederam a queda do BES e das medidas que impôs ao banco no primeiro

semestre de 2014, nomeadamente o tão falado “ring fencing”, o anel de proteção que visava impedir que o descalabro do Grupo Espírito Santo contaminasse o Banco Espírito Santo. Quando foi chamado à última Comissão de Inquérito à CGD, o coordenador do documento, João Costa Pinto, defendeu que a sua divulgação poderia ser de “grande utilidade”, “pelo menos para tirar lições que evitem a repetição de erros passados”. Costa Pinto recusou, ainda assim, divulgar o seu conteúdo. “Sinto que não devo nem o posso fazer. Isso depende da decisão de quem tem o relatório.”

Quem também não tem parado de pedir o acesso a este documento é Mariana Mortágua, a deputada do Bloco de Esquerda que tem integrado as várias comissões de inquérito sobre os desastres bancários portugueses e que também está presente na nova Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) às perdas registadas pelo Novo Banco – imputadas ao Fundo de Resolução. Essa CPI tem agora o término adiado em 15 dias, e as primeiras audições estão atrasadas, devido à pandemia e às regras do estado de emergência.

A deputada bloquista vem insistindo diretamente junto do supervisor bancário, mas tem esbarrado contra uma parede. Este foi, aliás, o primeiro documento pedido pelo Bloco de Esquerda no âmbito da nova comissão de inquérito. Em declarações à VISÃO, Mariana Mortágua diz que fará tudo o que estiver ao seu alcance para conhecer o relatório: “Do ponto de vista político, essa decisão |de não divulgação] não faz sentido nenhum. Até o autor do relatório já disse que este teria grande utilidade. Temos de verificar o que ainda podemos fazer no âmbito dos poderes da Comissão Parlamentar de Inquérito. Se o Banco de Portugal cometeu erros, não pode ser protegido dos erros que cometeu. Não há mais nenhuma instituição que beneficie tanto destes segredos. O governador passou a decisão para os tribunais, mas este é dos poucos documentos que ainda não conhecemos. Até alguns com nomes de pessoas já foram tornados públicos.”

Fernando Negrão, presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito às perdas do Novo Banco, diz que a CPI terá de conhecer e analisar a decisão do tribunal superior para avaliar o que pode ser feito do ponto de vista legal. “É a primeira vez que uma comissão de inquérito é confrontada com uma decisão de um tribunal de recurso negando-lhe

o acesso a um documento. Teremos de procurar uma solução que não prejudique os trabalhos da Comissão.”

Carlos Costa, ex-governador do Banco de Portugal, sempre se recusou a desclassificar o documento, dizendo que fora encomendado por si e para si, e batendo constantemente na tecla de que estava sujeito às regras de sigilo dos bancos centrais. Quando tomou posse como governador, no verão passado, Mário Centeno parecia ter uma perspetiva diferente sobre o tema, tendo mesmo dito que o Banco de Portugal não podia continuar a viver “numa torre de marfim”. Ainda assim, perante o pedido do Bloco de Esquerda, o antigo ministro das Finanças disse que só poderia entregar o Relatório da Comissão de Avaliação das Decisões e atuação do Banco de Portugal na Supervisão do Banco Espírito Santo

se houvesse uma decisão judicial a determinar que o dever legal de segredo devia ser quebrado.

“A ser decidida essa quebra do dever legal de segredo, o Banco de Portugal colaborará, de imediato, com o Tribunal, ficando, nos exatos termos dessa decisão judicial, autorizado a disponibilizar, desde logo, esse documento”, disse o supervisor bancário, há uns meses. Até isso acontecer, o banco central alega que está vinculado ao “dever legal de segredo profissional”e que a violação desse dever de segredo implica “responsabilidade criminal”.

Apesar de a postura pública de Centeno ser mais favorável à divulgação do documento do que a do seu antecessor, Carlos Costa, a verdade é que os argumentos usados para rejeitar a sua divulgação continuam a ser os mesmos. A2 de setembro do ano passado, o Banco de Portugal voltou a invocar o “dever de segredo” para recusar juntar o documento ao processo de insolvência do

BES. Embora os factos sejam de 2014, “a informação em causa ainda se mantém reservada”e contém “dados e informações sensíveis, legalmente protegidos”, alega o regulador bancário. O juiz Pedro Morgado, do Tribunal do Comércio de Lisboa, não ficou convencido e fez o pedido de levantamento do segredo ao Tribunal da Relação de Lisboa, invocando o interesse do relatório para a descoberta da verdade.

As juízas do tribunal superior não concordaram com a divulgação, numa decisão judicial que não admite recurso. Agora, a única hipótese de o documento sair do cofre do banco central passa por outra decisão em sentido oposto, num outro processo. Outro juiz terá de concluir que o relatório tem interesse público ou que pode ser determinante para apurar culpas -e que esse interesse

se sobrepõe ao dever de sigilo bancário e de supervisão. O mesmo pedidojá foi, por exemplo, apresentado pela defesa de Ricardo Salgado no processo administrativo relacionado com a Eurofin, que corre no Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão de Santarém.

A comprovar-se que o documento aponta culpas ao regulador no caminho que levou à queda do BES, o banco central pode ser alvo de inúmeras queixas e pedidos de indemnização -e o Estado chamado a pagar a fatura. I’l scaneco@visao.pt

Mais uma nega Ricardo Salgado insiste que o relatório Costa Pinto é essencial para perceber o que causou a derrocada do BES, mas os tribunais não cedem ao seu pedido

“Há verdades que nem a Deus contei. E nem a mim mesma. Sou um segredo fechado a sete chaves.”

Clarice Lispector Escritora brasileira

(1920-1977) JUÍZAS DA RELAÇÃO DE LISBOA DIZEM QUE 0 RELATÓRIO NÃO É ESSENCIAL PARA A DESCOBERTA DA VERDADE, PORQUE FOI FEITO JÁ DEPOIS DA QUEDA DO BES

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O ficheiro mais secreto do Banco de Portugal vai continuar num cofre

SÍLVIA CANECO

RESOLUÇÃO DO BES

Há anos que governantes, deputados e arguidos do caso BES andam atrás de um famoso relatório sobre a atuação do banco central na resolução do Banco Espírito Santo. Centeno entreabriu a porta, mas o Tribunal da Relação de Lisboa decidiu que o documento deve continuar em sigilo

o ficheiro secreto mais sigiloso do Banco de Portugal. Há muito tempo que se ouve falar dele e há muito que deputados e arguidos do caso BES correm atrás dele: um famoso relatório guardado a sete chaves e que critica a forma como o supervisor bancário geriu a crise do Banco Espírito Santo (BES) nos meses que antecederam a sua resolução, em 2014. Carlos Costa sempre se recusou a mostrá-lo. Mário Centeno chegou a governador e até admitiu divulgá-lo,

mas só se um tribunal concordasse. As expectativas eram grandes, mas agora o Tribunal da Relação de Lisboa decidiu que deve permanecer como está, em sigilo absoluto, e que não há razões para levantar o segredo de supervisão.

Apesar de até alguns governantes, como António Costa e Mariana Vieira

da Silva,já terem defendido o interesse público deste relatório, as juízas Fátima Reis Silva, Vera Antunes e Amélia Sofia Rebelo concluíram que o documento em causa “não é imprescindível para a descoberta da verdade”. Por um lado, alegam, porque o relatório “não

se destina à prova de factos, mas antes à corroboração de conclusões extraídas de factos”; por outro, porque o relatório é “um meio de prova indireto, dado que

(…) foi elaborado a posteriori aos factos em discussão nos autos, pelo que, quando muito, poderia concorrer para formar a convicção do tribunal, mas nunca a poderia, por si só, sustentar”, dizem.

A decisão, à qual a VISÃO teve acesso, foi tomada a 12 de janeiro, no âmbito do processo de insolvência do Banco Espírito Santo (BES). Ricardo Salgado, ex-presidente do BES, e Rui Silveira, ex-administrador que coordenou o departamento jurídico do banco, fizeram o pedido ao Tribunal do Comércio de Lisboa, argumentando ser um documento essencial para determinar todos os culpados pela queda do banco e pelo enorme rasto de lesados que a resolução causou. O Banco de Portugal invocou os segredos bancário e de supervisão para não ceder o documento, mas o juiz entendeu que era importante conhecê-lo e reencaminhou a questão para o Tribunal da Relação de Lisboa, a instância competente para decidir se o segredo de supervisão deve ou não ser levantado.

Agora, os argumentos usados pelo tribunal supervisor para recusar o levan-tamento do sigilo deixaram alguns intervenientes no processo de insolvência estupefactos. Isto porque, em qualquer processo, nenhum documento vale por si só – todos os documentos servem para o coletivo de juízes formar um juízo; e se, por norma, se barrassem todos os meios de prova elaborados depois dos factos, nunca seriam anexadas perícias ou auditorias a qualquer processo judicial, por exemplo.

Em vez disso, as magistradas do Tribunal da Relação de Lisboa entendem que o juízo de que o Banco de Portugal “agiu mal” no processo que levou à resolução do BES, em agosto de 2014, “deve ser atingido pelo próprio tribunal e não por terceiros”. “Por outras palavras, o facto de uma entidade contratada para o efeito ter analisado (não se sabe com que meios, por quanto tempo, em que extensão e com acesso a que elementos) a atuação do Banco de Portugal e ter concluído criticamente quanto à mesma não implica que o tribunal fique convencido do mesmo”, argumentam

as juízas. Uma fonte ligada ao processo questiona: “Como se pode saber se um documento pode ou não ser suficiente para convencer um tribunal, quando ninguém sabe, nem mesmo o tribunal que assim decide, o que está dentro

desse documento?”

MORTÁGUA NÃO DESISTE Este relatório foi encomendado pelo Banco de Portugal em 2015. Coordenado por João Costa Pinto, então presidente da comissão de auditoria do banco central, teve apoio técnico da consultora Boston Consulting Group. Quem conhece o documento diz que este é bastante crítico da atuação do supervisor bancário nos meses que antecederam a queda do BES e das medidas que impôs ao banco no primeiro

semestre de 2014, nomeadamente o tão falado “ring fencing”, o anel de proteção que visava impedir que o descalabro do Grupo Espírito Santo contaminasse o Banco Espírito Santo. Quando foi chamado à última Comissão de Inquérito à CGD, o coordenador do documento, João Costa Pinto, defendeu que a sua divulgação poderia ser de “grande utilidade”, “pelo menos para tirar lições que evitem a repetição de erros passados”. Costa Pinto recusou, ainda assim, divulgar o seu conteúdo. “Sinto que não devo nem o posso fazer. Isso depende da decisão de quem tem o relatório.”

Quem também não tem parado de pedir o acesso a este documento é Mariana Mortágua, a deputada do Bloco de Esquerda que tem integrado as várias comissões de inquérito sobre os desastres bancários portugueses e que também está presente na nova Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) às perdas registadas pelo Novo Banco – imputadas ao Fundo de Resolução. Essa CPI tem agora o término adiado em 15 dias, e as primeiras audições estão atrasadas, devido à pandemia e às regras do estado de emergência.

A deputada bloquista vem insistindo diretamente junto do supervisor bancário, mas tem esbarrado contra uma parede. Este foi, aliás, o primeiro documento pedido pelo Bloco de Esquerda no âmbito da nova comissão de inquérito. Em declarações à VISÃO, Mariana Mortágua diz que fará tudo o que estiver ao seu alcance para conhecer o relatório: “Do ponto de vista político, essa decisão |de não divulgação] não faz sentido nenhum. Até o autor do relatório já disse que este teria grande utilidade. Temos de verificar o que ainda podemos fazer no âmbito dos poderes da Comissão Parlamentar de Inquérito. Se o Banco de Portugal cometeu erros, não pode ser protegido dos erros que cometeu. Não há mais nenhuma instituição que beneficie tanto destes segredos. O governador passou a decisão para os tribunais, mas este é dos poucos documentos que ainda não conhecemos. Até alguns com nomes de pessoas já foram tornados públicos.”

Fernando Negrão, presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito às perdas do Novo Banco, diz que a CPI terá de conhecer e analisar a decisão do tribunal superior para avaliar o que pode ser feito do ponto de vista legal. “É a primeira vez que uma comissão de inquérito é confrontada com uma decisão de um tribunal de recurso negando-lhe

o acesso a um documento. Teremos de procurar uma solução que não prejudique os trabalhos da Comissão.”

Carlos Costa, ex-governador do Banco de Portugal, sempre se recusou a desclassificar o documento, dizendo que fora encomendado por si e para si, e batendo constantemente na tecla de que estava sujeito às regras de sigilo dos bancos centrais. Quando tomou posse como governador, no verão passado, Mário Centeno parecia ter uma perspetiva diferente sobre o tema, tendo mesmo dito que o Banco de Portugal não podia continuar a viver “numa torre de marfim”. Ainda assim, perante o pedido do Bloco de Esquerda, o antigo ministro das Finanças disse que só poderia entregar o Relatório da Comissão de Avaliação das Decisões e atuação do Banco de Portugal na Supervisão do Banco Espírito Santo

se houvesse uma decisão judicial a determinar que o dever legal de segredo devia ser quebrado.

“A ser decidida essa quebra do dever legal de segredo, o Banco de Portugal colaborará, de imediato, com o Tribunal, ficando, nos exatos termos dessa decisão judicial, autorizado a disponibilizar, desde logo, esse documento”, disse o supervisor bancário, há uns meses. Até isso acontecer, o banco central alega que está vinculado ao “dever legal de segredo profissional”e que a violação desse dever de segredo implica “responsabilidade criminal”.

Apesar de a postura pública de Centeno ser mais favorável à divulgação do documento do que a do seu antecessor, Carlos Costa, a verdade é que os argumentos usados para rejeitar a sua divulgação continuam a ser os mesmos. A2 de setembro do ano passado, o Banco de Portugal voltou a invocar o “dever de segredo” para recusar juntar o documento ao processo de insolvência do

BES. Embora os factos sejam de 2014, “a informação em causa ainda se mantém reservada”e contém “dados e informações sensíveis, legalmente protegidos”, alega o regulador bancário. O juiz Pedro Morgado, do Tribunal do Comércio de Lisboa, não ficou convencido e fez o pedido de levantamento do segredo ao Tribunal da Relação de Lisboa, invocando o interesse do relatório para a descoberta da verdade.

As juízas do tribunal superior não concordaram com a divulgação, numa decisão judicial que não admite recurso. Agora, a única hipótese de o documento sair do cofre do banco central passa por outra decisão em sentido oposto, num outro processo. Outro juiz terá de concluir que o relatório tem interesse público ou que pode ser determinante para apurar culpas -e que esse interesse

se sobrepõe ao dever de sigilo bancário e de supervisão. O mesmo pedidojá foi, por exemplo, apresentado pela defesa de Ricardo Salgado no processo administrativo relacionado com a Eurofin, que corre no Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão de Santarém.

A comprovar-se que o documento aponta culpas ao regulador no caminho que levou à queda do BES, o banco central pode ser alvo de inúmeras queixas e pedidos de indemnização -e o Estado chamado a pagar a fatura. I’l scaneco@visao.pt

Mais uma nega Ricardo Salgado insiste que o relatório Costa Pinto é essencial para perceber o que causou a derrocada do BES, mas os tribunais não cedem ao seu pedido

“Há verdades que nem a Deus contei. E nem a mim mesma. Sou um segredo fechado a sete chaves.”

Clarice Lispector Escritora brasileira

(1920-1977) JUÍZAS DA RELAÇÃO DE LISBOA DIZEM QUE 0 RELATÓRIO NÃO É ESSENCIAL PARA A DESCOBERTA DA VERDADE, PORQUE FOI FEITO JÁ DEPOIS DA QUEDA DO BES

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AUDITORIA ÀS CONTAS

COMPANHIA AÉREA SATA

BE e PSD dos Açores vão propor à Assembleia Legislativa Regional que seja realizada por parte do Tribunal de Contas uma auditoria às contas da companhia aérea regional SATA, foi anunciado.

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“Temos de encontrar respostas de apoio imediato às famílias”

MARISA ANTUNES

Marina Gonçalves

A nova secretaria de Estado da Habitação assume que “existe um problema de habitação a custos acessíveis nas áreas metropolitanas”. Mas “não se faz a casa de um dia para o outro”

Marina Gonçalves tem 32 anos, é licenciada em Direito (pela Faculdade de Direito da Universidade do Porto) e, há pouco mais de três me

ses, em plena pandemia, assumiu as funções de secretaria de Estado da Habitação, sucedendo a Ana Pinho. Com uma das pastas mais complexas de gerir no atual momento, a nova governante assume “o princípio-base de garantir o clireito à habitação, seja na lógica da propriedade, seja na lógica do arrendamento,” a todos os portugueses.

Tomou posse em setembro do ano passado, em plena pandemia, e herdou uma pasta complicada, que será ainda mais complexa com o agravamento da recessão económica. Suponho que este seja o desafio mais difícil da sua vida profissional…

Sim. Não podia estar mais realizada no que estou a fazer, com a preocupação de que os tempos que correm não são os melhores e os que vêm aí serão de uma enorme complexidade, mas temos de assumir essa responsabilidade para tentar encontrar o máximo de respostas de apoio imediato às famílias. E temos trabalhado muito em função do momento e das necessidades, criando instrumentos

de apoio. Por exemplo, começámos com empréstimos às famílias para pagamento das rendas habitacionais (solicitadas ao IHRU – Instituto de Habitação e Reabilitação Urbana), previstas inicialmente para três meses, depois prolongadas para seis e, mais tarde, para nove – e agora já se estendem até 1 de julho, altura em que iremos converter os empréstimos em subsídios, porque percebemos que as famílias não conseguiriam pagar esses valores. Por isso, assumimos essa responsabilidade: é nosso dever ajudar o máximo que for possível.

Referiu a reconversão dos empréstimos pedidos pelas famílias para pagamento das rendas em subsídios a fundo perdido. Como vai processar-se? Na essência, o modelo assenta no seguinte: as taxas de esforço que

se aproximem dos 100% do rendi-mento e há muitas famílias nessas situações – terão uma reconversão total do empréstimo em subsídio. É um modelo progressivo consoante

as taxas de esforço, mas toda a gente poderá requerer essa reconversão. A portaria vai entrar em vigor agora e irá regulamentar a forma como se entrega o requerimento para a reconversão, quais são os contratos previstos neste apoio, etc. As pessoas podem fazer o pedido, sendo certo que boa parte delas provavelmente irá prorrogar

esse apoio até ao final previsto, ou

seja, 1 de julho de 2021. E os pedidos de reconversão em comparticipação não reembolsável provavelmente só serão feitos nessa altura.

Outra questão estrutural para o mercado são as moratórias nos créditos à habitação e o receio que existe quando estas terminarem (em setembro), deixando as famílias em risco de incumprimento e arriscando-se a perder os imóveis. O que está previsto para evitar essa situação? É muito difícil fazer um prognóstico do que será a nossa j

resposta quanto às moratórias J

ao crédito à habitação e sobre A

o que se vai fazer em setem- B

bro, porque, infelizmente, a B

reação acontece também em B

função do momento que B

vivemos. Temos um prin- B

cípio-base que é garantir o B

direito à habitação, seja na I

lógica da propriedade, seja na lógica do arrendamento. E construímos um conjunto de mecanismos para dar resposta a isto. Temos continuado a prorrogá-los, ea simplificá-los, para tentar chegar a mais gente.

A oposição tem-se mantido cética relativamente ao Plano de Recuperação e Resiliência, lembrando que há muito dinheiro disponível (por exemplo, 1200 milhões de euros para a habitação, 620 milhões para a eficiência energética, etc.), mas que, na realidade, não há um plano definido para a utilização

dessas verbas.

Não me canso de lembrar que concebemos uma Nova Geração de Políticas de Habitação e uma Nova Lei de Bases da Habitação. Criámos uma resposta para as famílias mais carenciadas e uma resposta para a classe média, que é o programa de arrendamento acessível. E, neste âmbito, temos três instrumentos: o Fundo Nacional de Reabilitação e Edificado, o arrendamento acessível ea bolsa de imóveis. Vamos apresentar, em 2021, o programa nacional de habitação, que não será mais do que a junção de todos os instrumentos que já estão em vigor. Mal seria se agora fôssemos criar tudo de novo. É preciso haver estabilidade nas políticas de habitação e, se em cada ciclo mudarem as políticas, acabamos por não conseguir construir nada.

Qual éo ponto da situação do Fundo Nacional de Reabilitação e do Edificado (FNRE), criado há quatro anos com a meta de colocar no mercado edifícios estatais reconvertidos em habitação com rendas acessíveis? Estamos na fase de avaliação da capacidade construtiva dos vários imóveis para poder avançar o mais rapidamente possível, um trabalho em paralelo com o FNRE eo IHRU. Criámos, no final do ano, uma portaria que prevê a abertura, até ao final do primeiro semestre de 2021, de um procedimento concursal para que parte destes imóveis possam também ser promovidos por promoção pública e comunitária com o terceiro setor, como as cooperativas, de modo a envolver a população naquilo que são as políticas públicas de habitação. Mas nunca perdendo duas questões-chave para nós: a propriedade continua a ser do Estado e as rendas devem ser acessíveis e com contratos duradouros. Já se apontaram alguns exemplos, um dos mais conhecidos é o Hospital Miguel Bombarda, em Lisboa. Qual é a sua previsão para estes imóveis chegarem ao mercado?

Existe uma estimativa a seis anos, até 2026, para a reabilitação da grande maioria daqueles imóveis. Temos reabilitações que se conseguem concretizar em ano e meio e outras obras mais complexas, que obrigam a construção nova ou a reabilitações profundas. Há muitos passos a tomar consoante o tipo de imóveis, e não vão ficar todos concluídos em 2026 -é um processo contínuo e depende da complexidade da obra. É preciso não esquecer que, durante décadas, não existiu um papel do Estado na promoção

da Habitação. E essa foi a inversão que se fez. Agora, não se faz a casa de um dia para o outro. Tanto mais se estiver em causa património do Estado que estava devoluto; boa parte dele não era utilizado para políticas de habitação e, portanto, implica passos iniciais complexos, nomeadamente ao nível de licenciamentos, de projeto, de pedidos de informação prévia às câmaras municipais, para perceber se é viável do ponto de vista de habitação… Esses passos não se dão num mês ou em dois. O Fundo Nacional de Reabilitação do Edificado foi criado em 2017, de raiz, e na sua criação foi necessário definir o modo como funcionará, como

se vai financiar os imóveis, identificar um conjunto de imóveis para poderem ser trabalhados e avaliados… Dou dois exemplos (e são sempre os mesmos, porque são realmente emblemáticos do FNRE): o Cabeço da Rola eo Miguel Bombarda, ambos em Lisboa e que, entre os dois, podem chegar às 400

habitações a preços acessíveis.

O Governo foi muito criticado por parte dos vários operadores do setor por acabar com os Golden Visa,já emjulho,

nas zonas de Lisboa, Porto e todo o Litoral. Está prevista alguma medida compensatória para estimular este tipo de investimento?

O diploma ainda não foi publicado, mas já foi aprovado em Conselho de Ministros, ea ideia é precisamente perceber que, no momento que atravessamos e que afeta toda a gente, vai cumprir-se

o que estava previsto no Orçamento do Estado de 2020, sem descurar alguma necessidade de progressividade da implementação da medida. O objetivo não é acabar com os vistos gold. Existe um problema de habitação a custos acessíveis nas áreas metropolitanas e, em simultâneo, há um problema no Interior, para onde precisamos de incentivar a deslocação -o que estamos a fazer é precisamente enquadrar esse instrumento de acordo com os nossos objetivos no âmbito da política pública. Mas, do ponto de vista do investidor, como se criam esses estímulos para o Interior?

Temos de torná-los atrativos, eé isso que estamos a fazer através de um ministério que se centra na valorização do Interior, exatamente para criar estes incentivos que promovam o investimento estrangeiro e, ao mesmo tempo, acompanhem as políticas públicas de habitação para os portugueses. l’l

visaoimobiliario@visao.pt

HÁUM PROBLEMA NO INTERIOR, PARA ONDE PRECISAMOS DE INCENTIVAR A DESLOCAÇÃO [DO INVESTIMENTO]

MARCOS BORGA

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