Apoios sociais. Vital Moreira classifica promulgação do PR como “ficção constitucional”

Numa publicação no blogue “Causa Nossa”, o antigo juiz do TC, que também foi deputado independente pelo PS, escreve que “não compete ao PR fazer ‘interpretação conforme à Constituição’.

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O constitucionalista Vital Moreira considerou este domingo que a promulgação de três leis do parlamento que reforçam os apoios sociais foi um “exercício de ficção constitucional”, defendendo que, em caso de dúvida, “é obrigação do Presidente suscitar a fiscalização preventiva”.

Numa publicação no blogue “Causa Nossa” após ser conhecido que o Presidente da República promulgou as três leis, o antigo juiz do Tribunal Constitucional, que também foi deputado independente pelo PS, escreve que “não compete ao PR fazer ‘interpretação conforme à Constituição’ e refazer o alcance normativo das leis que lhe são submetidas para promulgação”.

“Em caso de dúvida séria sobre a conformidade constitucional de um diploma (e no caso é mais do que dúvida…), é obrigação do Presidente suscitar a fiscalização preventiva, no cumprimento da sua missão de fazer respeitar a Constituição”, defende.

O professor catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra considera ainda que “é absurdo”, como refere o chefe de Estado na justificação da promulgação dos diplomas, dizer que o Governo “pode executar aquelas leis até onde o orçamento permita, deixando o resto por executar”.

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“Num Estado de Direito, baseado no princípio da legalidade, o Governo está obrigado a cumprir integralmente as leis, mesmo se inconstitucionais, enquanto elas não forem declaradas como tais pelo órgão competente”, sublinha o antigo eurodeputado.

Para Vital Moreira, “há duas vítimas principais neste lamentável episódio”. “O primeiro é a noção de disciplina orçamental, que inclui a segurança de que o Governo, uma vez aprovado o orçamento, está livre de ver aprovada nova despesa pública, obrigando-o a aumentar a despesa global ou a cortar noutra despesa para realizar aquela. Tal é a função da lei-travão, agora ingloriamente sacrificada pelo próprio Presidente da República”, afirma.

A segunda vítima, acrescenta, “são os governos minoritários, que veem inutilizada a única defesa constitucional contra o oportunismo político das oposições coligadas”.

“A partir de agora vai ser mais difícil ainda governar em minoria, visto que já nem sequer a despesa orçamentada é intocável. Ora, como as condições para governos de maioria não existem, a governação vai tornar-se ainda mais imprevisível”, vaticina Vital Moreira. Por estas duas razões, o constitucionalista conclui que, “independentemente da sua leitura política, a promulgação das leis da Assembleia sobre apoios sociais assenta num exercício de ficção constitucional”.

O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, promulgou hoje três diplomas aprovados pelo parlamento de reforço de apoios no âmbito da pandemia por considerar que não existe uma violação indiscutível da Constituição, e representam “medidas de apoio social urgentes”.

“Neste caso, como noutros, no mandato anterior, há uma interpretação conforme à Constituição. A interpretação que justifica a promulgação dos presentes três diplomas é simples e é conforme à Constituição: os diplomas podem ser aplicados, na medida em que respeitem os limites resultantes do Orçamento do Estado vigente”, defendeu.

Na justificação de 12 pontos que apresenta para a promulgação, Marcelo Rebelo de Sousa até admite que “os três diplomas em análise implicam potenciais aumentos de despesas ou reduções de receitas”, mas afirma que são de “montantes não definidos à partida, até porque largamente dependentes de circunstâncias que só a evolução da pandemia permite concretizar”.

“E, assim sendo, deixando em aberto a incidência efetiva na execução do Orçamento do Estado. O próprio Governo tem, prudentemente, enfrentado a incerteza do processo pandémico, quer adiando a aprovação do Decreto de Execução Orçamental, quer flexibilizando a gestão deste, como aconteceu no ano 2020”, salientou.

Em causa estão três diplomas: um alarga o universo e o âmbito dos apoios sociais previstos para trabalhadores independentes, gerentes e empresários em nome individual; outro aumenta os apoios para os pais em teletrabalho; e um terceiro que estende o âmbito das medidas excecionais para os profissionais de saúde no âmbito da pandemia também à recuperação dos cuidados primários e hospitalares não relacionados com Covid-19.

O Governo tem defendido que os diplomas representam “uma violação ostensiva” da lei-travão inscrita na Constituição, desvirtuando o Orçamento em vigor, por aumentarem os limites de despesa aprovados no Orçamento do Estado para 2021.

Marcelo contraria Governo e promulga reforço de apoios sociais Presidente da República deu seguimento aos três diplomas aprovados pelo parlamento, apesar de o Executivo de António Costa considerar que isso viola a lei-travão.DN28 Março 2021 — 18:43

O Presidente da República promulgou este domingo o reforço das medidas de apoio social urgentes, alargadas a sócios-gerentes e trabalhadores independentes, aos profissionais de saúde e a pais em teletrabalho com filhos em casa, informa o site da Presidência.

Os diplomas foram aprovados no parlamento a 3 de março com os votos favoráveis de toda a oposição.

Marcelo Rebelo de Sousa considera que não existe uma violação indiscutível da Constituição e que as medidas são urgentes.

“Em suma, para o Presidente da República, é visível o sinal político dado pelas medidas em causa, e não se justifica o juízo de inconstitucionalidade dessas medidas”, justifica.

Em causa estão três diplomas: um alarga o universo e o âmbito dos apoios sociais previstos para trabalhadores independentes, gerentes e empresários em nome individual; outro aumenta os apoios para os pais em teletrabalho; e um terceiro estende o âmbito das medidas excecionais para os profissionais de saúde no âmbito da pandemia também à recuperação dos cuidados primários e hospitalares não relacionados com a covid-19.

“Neste caso, como noutros, no mandato anterior, há uma interpretação conforme à Constituição. A interpretação que justifica a promulgação dos presentes três diplomas é simples e é conforme à Constituição: os diplomas podem ser aplicados, na medida em que respeitem os limites resultantes do Orçamento do Estado vigente”, defende.

Numa longa nota com 12 pontos, Marcelo Rebelo de Sousa fundamenta a decisão face a três diplomas que considera adotarem “medidas sociais urgentes para a situação pandémica vivida, um deles sem qualquer voto contra e os outros dois com o voto favorável de todos os partidos parlamentares, salvo o do partido do Governo”.

“A adoção das medidas sociais aprovadas corresponde, em diversas matérias, na substância e na urgência, a necessidades da situação vivida. Sendo certo que cobertas, em parte, por legislação do Governo”, admite o chefe de Estado.

O Presidente da República pronuncia-se, depois, sobre o argumento que tem sido invocado pelo Governo: que estes diplomas violariam a chamada lei-travão, por aumentarem os limites de despesa aprovados no Orçamento, citando mesmo a norma inscrita na Constituição. “Só o Governo pode fazê-lo, como garantia de que a Assembleia da República não desfigura o Orçamento que ela própria aprovou, criando problemas à sua gestão pelo Governo”, anui a nota da Presidência.

O chefe de Estado admite que os três diplomas em análise “implicam potenciais aumentos de despesas ou reduções de receitas, mas de montantes não definidos à partida, até porque largamente dependentes de circunstâncias que só a evolução da pandemia permite concretizar”.

“E, assim sendo, deixando em aberto a incidência efetiva na execução do Orçamento do Estado”, acrescenta, considerando que até o Governo pode flexibilizar a gestão orçamental “como aconteceu no ano de 2020”.

Marcelo Rebelo de Sousa explica ainda que não recorreu à fiscalização preventiva do Tribunal Constitucional porque só o tem feito, “sobretudo durante a presente crise”, quando não é “de todo em todo possível uma interpretação dos diplomas que seja conforme à Constituição”.

“Naturalmente que, em caso de convicção jurídica clara, de se encontrar perante uma inconstitucionalidade e nenhuma justificação substancial legitimar o uso de veto, se reserva o recurso ao Tribunal Constitucional, tal como no caso de a prática parlamentar passar a ser de constante desfiguração do Orçamento do Estado”, afirma.

Neste caso, conclui, “há uma interpretação conforme à Constituição”.

O Presidente da República diz ainda ter “sempre a preocupação de evitar agravar querelas políticas, em momentos e matérias sensíveis, o que é ainda mais evidente em situações extremas de confronto entre Governo minoritário e todos os demais partidos com assento parlamentar”.

Os três diplomas do parlamento – todos com origem em apreciações parlamentares de decretos do Governo – foram aprovados em 03 de março, com o PS a votar isolado contra o dos apoios sociais e o da saúde e a abster-se no das famílias (juntamente com Iniciativa Liberal, neste diploma).

PR diz que Governo pode recorrer ao Constitucional

“Como é óbvio, dispõe o Governo do poder de suscitar a fiscalização sucessiva da constitucionalidade dos diplomas agora promulgados, como já aconteceu, noutros ensejos. É a Democracia e o Estado de Direito a funcionarem”, referiu Marcelo Rebelo de Sousa, numa nota divulgada no ‘site’ da Presidência da República.

O chefe de Estado “chama, no entanto, de forma particular neste momento, a atenção para o essencial do presente debate”.

“De um lado, não há Governo com maioria parlamentar absoluta, sendo essencial o cumprimento da legislatura de quatro anos. Do outro lado, os tempos eleitorais podem levar, por vezes, as oposições a afrontamentos em domínios económicos e sociais sensíveis”, alertou.

Governo diz que diplomas são violação da lei-travão

O Governo tem defendido que os diplomas representam “uma violação ostensiva” da lei-travão inscrita na Constituição, desvirtuando o Orçamento em vigor, por aumentarem os limites de despesa aprovados no Orçamento do Estado para 2021.

Na sexta-feira, António Costa foi questionado sobre o que fará o Governo se Marcelo Rebelo de Sousa não vetasse o diploma aprovado pelo parlamento que reforça os apoios sociais. “Cada órgão de soberania deve atuar no momento próprio, este é o momento de atuação do Presidente da República”, afirmou então.

O primeiro-ministro sublinhou que a Constituição “é muito clara”, ao definir que, durante um exercício orçamental, “só o Governo pode aumentar a despesa ou diminuir a receita”.

Jerónimo de Sousa: Lei-travão não travou epidemia nem abusos

Já este domingo, o secretário-geral do PCP, Jerónimo de Sousa, acusou o Governo de andar a “contar tostões nos apoios sociais” aprovados pelo parlamento, e avisou que a ‘lei-travão’ não travou nem a epidemia nem os abusos.

Numa intervenção na iniciativa do partido alusiva ao Dia Nacional da Juventude “Mil lutas no caminho de Abril”, que decorreu num largo ao ar livre na Baixa de Lisboa, Jerónimo de Sousa aludiu aos diplomas de reforço dos apoios sociais que aguardavam decisão do Presidente da República.

“Hoje, a persistência da epidemia coloca a necessidade de uma resposta que exige uma outra mobilização de meios que continuam a ser negados […], o que é incompatível com a atitude do Governo de contar tostões nos apoios sociais aprovados na Assembleia da República, como ainda estes dias aconteceu, com a tentativa de invocar a chamada ‘lei-travão’ para impedir a sua concretização”, criticou.

O secretário-geral do PCP avisou que, “por muito que se queixe o Governo junto do Presidente da República”, essa norma inscrita na Constituição “não travou a epidemia e o Governo não teve a capacidade de travar os abusos”.

“Foi uma e outra que levaram tantos portugueses à situação de necessitar destes apoios sociais, que o Governo agora procura recusar”, criticou.

em atualização

Governo pode recorrer ao Constitucional mas não tem maioria absoluta, lembra Marcelo

O Presidente da República afirmou que o Governo pode suscitar ao Tribunal Constitucional a fiscalização dos diplomas que reforçam apoios sociais promulgados este domingo, mas frisou que o executivo não tem maioria absoluta e o cumprimento da legislatura “é essencial”.

“Como é óbvio, dispõe o Governo do poder de suscitar a fiscalização sucessiva da constitucionalidade dos diplomas agora promulgados, como já aconteceu, noutros ensejos. É a Democracia e o Estado de Direito a funcionarem”, referiu Marcelo Rebelo de Sousa, numa nota divulgada no ‘site’ da Presidência da República.

O chefe de Estado “chama, no entanto, de forma particular neste momento, a atenção para o essencial do presente debate”.

“De um lado, não há Governo com maioria parlamentar absoluta, sendo essencial o cumprimento da legislatura de quatro anos. Do outro lado, os tempos eleitorais podem levar, por vezes, as oposições a afrontamentos em domínios económicos e sociais sensíveis”, alertou.

Marcelo Rebelo de Sousa referiu que “compete ao Presidente da República sublinhar a importância do entendimento em plenas pandemias da saúde, da economia e da sociedade”.

“Sensibilizando o Governo para o diálogo com as oposições e tornando evidente às oposições que ninguém ganharia com o afrontamento sistemático, potencialmente criador de uma crise lesiva para Portugal e, portanto, para os portugueses”, acentuou.

O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, promulgou hoje três diplomas aprovados pelo parlamento de reforço de apoios no âmbito da pandemia por considerar que não existe uma violação indiscutível da Constituição e as medidas são urgentes.

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“Neste caso, como noutros, no mandato anterior, há uma interpretação conforme à Constituição. A interpretação que justifica a promulgação dos presentes três diplomas é simples e é conforme à Constituição: os diplomas podem ser aplicados, na medida em que respeitem os limites resultantes do Orçamento do Estado vigente”, defendeu.

Na justificação de 12 pontos que apresenta para a promulgação, Marcelo Rebelo de Sousa até admite que “os três diplomas em análise implicam potenciais aumentos de despesas ou reduções de receitas”, mas afirma que são de “montantes não definidos à partida, até porque largamente dependentes de circunstâncias que só a evolução da pandemia permite concretizar”.

“E, assim sendo, deixando em aberto a incidência efetiva na execução do Orçamento do Estado. O próprio Governo tem, prudentemente, enfrentado a incerteza do processo pandémico, quer adiando a aprovação do Decreto de Execução Orçamental, quer flexibilizando a gestão deste, como aconteceu no ano 2020”, salientou.

Em causa estão três diplomas: um alarga o universo e o âmbito dos apoios sociais previstos para trabalhadores independentes, gerentes e empresários em nome individual; outro aumenta os apoios para os pais em teletrabalho; e um terceiro que estende o âmbito das medidas excecionais para os profissionais de saúde no âmbito da pandemia também à recuperação dos cuidados primários e hospitalares não relacionados com covid-19.

O Governo tem defendido que os diplomas representam “uma violação ostensiva” da lei-travão inscrita na Constituição, desvirtuando o Orçamento em vigor, por aumentarem os limites de despesa aprovados no Orçamento do Estado para 2021.

Em junho do ano passado, Marcelo Rebelo de Sousa vetou um decreto do parlamento que alargava o apoio social extraordinário aos gerentes de micro e pequenas empresas, assim como empresários em nome individual, invocando “dúvidas de constitucionalidade por eventual violação da lei travão, ao poder envolver aumento das despesas previstas no Orçamento do Estado para 2020 na versão ainda em vigor”.

Na altura, o Presidente sugeriu que se ultrapassasse essa questão no Orçamento Suplementar para 2020, que então estava em discussão no parlamento.