Marcelo contraria Governo nos apoios

WILSON LEDO

DIPLOMAS PROMULGADOS

DECISÃO. Presidente lembrou Governo que pode recorrer ao Tribunal Constitucional mas insiste que há interpretação "conforme" a lei essencial do País

O Presidente da República contrariou o Governo e promulgo…

A dignidade de um Enfermeiro

A dignidade de um bastonário não é só a dignidade de um Enfermeiro. Ela vai muito para lá do exercício da profissão, inclusivamente, com irradiação para lá do termo do mandato.

O Conselho Jurisdicional da Ordem dos Enfermeiros arquivou, há uns dias, a…

Jerónimo avisa que lei-travão não travou epidemia nem abusos

O secretário-geral do PCP, Jerónimo de Sousa, acusou hoje o Governo de andar a “contar tostões nos apoios sociais” aprovados pelo parlamento, e avisou que a ‘lei-travão’ não travou nem a epidemia nem os abusos.

Numa intervenção na iniciativa do partido alusiva ao Dia Nacional da Juventude “Mil lutas no caminho de Abril”, que decorreu num largo ao ar livre na Baixa de Lisboa, Jerónimo de Sousa aludiu aos diplomas de reforço dos apoios sociais que aguardam decisão do Presidente da República.

“Hoje, a persistência da epidemia coloca a necessidade de uma resposta que exige uma outra mobilização de meios que continuam a ser negados […], o que é incompatível com a atitude do Governo de contar tostões nos apoios sociais aprovados na Assembleia da República, como ainda estes dias aconteceu, com a tentativa de invocar a chamada ‘lei-travão’ para impedir a sua concretização”, criticou.

O secretário-geral do PCP avisou que, “por muito que se queixe o Governo junto do Presidente da República”, essa norma inscrita na Constituição “não travou a epidemia e o Governo não teve a capacidade de travar os abusos”.

“Foi uma e outra que levaram tantos portugueses à situação de necessitar destes apoios sociais, que o Governo agora procura recusar”, criticou.

Para Jerónimo de Sousa, a situação é ainda mais grave por contrastar com o “acumular de lucros por parte de grandes grupos económicos”, apontando como exemplos o plano de reestruturação da TAP e a situação da Groundforce, o encerramento da refinaria da Galp em Matosinhos ou a venda de seis barragens pela EDP.

“Perante a degradação económica e social e o acumular de problemas no país, o PCP tem intervindo ao longo de meses apresentando soluções, muitas das quais derrotadas pela conjugação de votos entre PS e PSD”, criticou.

Para o líder comunista, a resposta à situação de emergência e aos problemas estruturais do país não virá nem da União Europeia nem do Plano de Recuperação e Resiliência, que “o Governo apresenta como grande solução”.

“A resposta que o país precisa não está nesta eternização do confinamento como regra e na banalização do estado de emergência, antes exige uma abordagem alternativa que, limitando o mais possível o quadro de restrições, requer a articulação de critérios epidemiológicos com outros critérios de saúde e sociais”, afirmou.

Jerónimo de Sousa defendeu “a adequada preparação para que se possam retomar, em segurança, as atividades económicas, sociais, culturais, desportivas, também elas essenciais à vida e à saúde da população”.

A iniciativa juntou cerca de 50 jovens da Juventude Comunista Portuguesa, de pé e respeitando a distância, e que transportavam uma espécie de mochilas amarelas e verdes, simbolizando alguns dos pesos carregados pelos mais jovens, como a precariedade laboral, o racismo ou a desigualdade entre homens e mulheres.

No final da sua intervenção, Jerónimo de Sousa deixou um apelo especial aos jovens.

“Há muita gente para aí a dizer que esta juventude não quer saber de nada. É falso, aqui estamos a demonstrar o contrário”, afirmou.

O líder do PCP sublinhou que, depois de a sua geração ter sido decisiva para que “Abril triunfasse”, está agora nas mãos da próxima dar continuidade ao trabalho.

“Vocês hoje têm a responsabilidade de agarrar com as mãos o futuro e de permitir que Portugal continue a ser um país com os valores de abril e de combate às injustiças”, disse.

O Presidente da República afirmou no sábado que ainda não tinha analisado os diplomas aprovados pelo parlamento de reforço dos apoios sociais, mas assegurou que tomará uma decisão entre hoje e segunda-feira.

Marcelo Rebelo de Sousa não quis adiantar se concorda ou não com o argumento do executivo de que os diplomas violam a ‘lei-travão’ consagrada na Constituição, que proíbe o aumento da despesa ou diminuição da receita pelo parlamento.

Em causa estão três diplomas: um alarga o universo e âmbito dos apoios sociais a trabalhadores independentes, gerentes e empresários em nome individual; outro dá mais apoios aos pais em teletrabalho; e um terceiro alarga o âmbito das medidas excecionais para os profissionais de saúde no âmbito da pandemia também à recuperação dos cuidados primários e hospitalares não relacionados com covid-19.

Os três diplomas do parlamento – todos com origem em apreciações parlamentares de decretos do Governo – foram aprovados em 03 de março, com o PS a votar isolado contra o dos apoios sociais e o da saúde, e a abster-se no das famílias (juntamente com IL, neste diploma).

Transparência. Espiões e militares são liderados por maçons. Juízes têm compromisso ético para evitar sociedades secretas

Juízes não devem entrar na maçonaria. Funcionários das secretas têm de declarar, mas não se sabe se o fazem

VÍTOR MATOS

“Está disponível para divulgar o seu registo de interesses e revelar se pertence a alguma sociedade secreta de natureza maçónica?” À pergunta de Teresa Leal Coelho, então deputada do PSD, Adélio Neiva da Cruz, diretor do Serviço de Informações e Segurança (SIS), respondeu com uma evasiva: “Tenho dever de obediência à Constituição da República, à lei, à ética e à minha consciência”. A questão foi-lhe colocada duas vezes, em dezembro de 2014, na audição parlamentar que antecedeu a sua confirmação na chefia do SIS: “Não me sinto condicionado por absolutamente nada, a não ser pela lei”. Nem sim nem não. Mas Neiva da Cruz pertencia ao Grande Oriente Lusitano, onde, de facto, se jura obediência à lei do país, mas não o divulgou publicamente. No máximo, admitiu que fez um “aclaramento de eventuais conflitos de interesses” junto do primeiro-ministro e do secretário-geral dos Serviços de Informações da República Portuguesa (SIRP).

A influência da maçonaria e Opus Dei no Estado voltou à agenda – depois de PAN e PSD terem apresentado projetos no Parlamento para os titulares de cargos públicos declararem as associações a que pertencem -, mas os funcionários dos serviços de informações já têm o dever de comunicar a “filiação, participação ou desempenho de quaisquer funções em quaisquer entidades de natureza associativa”. Em que medida o fazem junto da secretaria-geral do SIRP, não se sabe. Ao Expresso, duas fontes ligadas às ‘secretas’ duvidam que isso aconteça. O Expresso questionou o SIRP para saber se esse tipo de comunicação é feita, mas não foi possível obter resposta até ao fecho da edição. Os espiões “estão obrigados, desde 2014, a fazer um registo de interesses, mas como a identidade dos funcionários é segredo de Estado, essa declaração não pode ser pública”, explica ao Expresso Teresa Leal Coelho, co-autora dessas regras depois da polémica que envolveu Jorge da Silva Carvalho, ex-diretor do SIED (o Serviço de Informações Estratégicas de Defesa, a ‘secreta’ externa), que era maçon numa loja que montou um projeto de influência e de poder económico e político.

“Agora esta ligação queima e antes de escolherem um maçom coçam duas vezes a cabeça”, diz Adelino Maltez

Se Neiva da Cruz não respondeu ao pedido do Expresso para clarificar a sua relação com a maçonaria, tendo em conta o debate público em curso, o mesmo aconteceu com o almirante Silva Ribeiro, chefe do Estado-Maior das Forças Armadas (CEMGFA), cuja filiação maçónica tem sido noticiada e nunca desmentida, mesmo que nada obrigue os militares a declarar a pertença a organizações secretas ou discretas – em todo o caso, são uma classe com os direitos cívicos limitados e, por exemplo, não podem pertencer a partidos políticos. Em 2013, Silva Ribeiro já era referido como membro do GOL, da loja José Estêvão, no livro “Segredos da Maçonaria Portuguesa”, do jornalista António José Vilela. Trata-se de uma loja que chegou a ter como membros personalidades como o ex-primeiro-ministro timorense José Ramos Horta, Prémio Nobel da Paz, ou o socialista José Penedos, ex-presidente da REN (condenado por corrupção a cinco anos de prisão no processo Face Oculta).

Mas esta não é uma condição extravagante: nas Forças Armadas, sobretudo na Marinha, há uma tradição maçónica antiga que até durante a proibição do Estado Novo se manteve, explica ao Expresso o politólogo e maçom José Adelino Maltez. “O último ministro da Marinha de Salazar era o almirante Pereira Crespo, que era maçom, assim como o almirante Sarmento Rodrigues, que foi ministro das colónias”, apesar da proibição de 1935.

JUÍZES COM “COMPROMISSO ÉTICO”

O assunto era para ficar fechado esta semana, mas a polémica vai durar: os projetos do PAN e do PSD estavam condenados a chumbar na Comissão da Transparência, porém a votação de terça-feira acabou por ser adiada porque o PCP propôs que fosse analisada legislação de outros países sobre a mesma matéria. Enquanto o PAN defende que as declarações devem ser voluntárias, o PSD contrapôs a obrigatoriedade de os titulares de cargos públicos dizerem todas as associações a que pertencem. O PS manifestou-se contra, até por à partida considerar inconstitucional a parte que diz respeito à Opus Dei, por conflituar com os direito de liberdade religiosas. Perante a posição do PS, Rui Rio – que teve como adversários internos dois maçons já afastados da organização, Luís Montenegro e Miguel Pinto Luz -, acusou o PS de obedecer à maçonaria.

E se na política o tema aqueceu, no comentário político queimou: depois de António Lobo Xavier, na “Circulatura do Quadrado”, na TVI, ter falado de clientes que se queixavam de extorsão por parte de maçons (esta semana revelou que esses casos estão sob investigação), a hipótese de militares e juízes serem beneficiados nas carreiras foi levantada por José Miguel Júdice, na SIC, e Luís Marques Mendes mencionou a possibilidade de juízes não serem imparciais perante membros da mesma obediência.

Os juízes, no entanto, ao contrário de outras carreiras, têm orientações para não pertencerem a este tipo de sociedades. Em 2009, o Congresso dos Juízes aprovou um “Compromisso Ético” que recomenda o seguinte: “O juiz não integra organizações que exijam aos aderentes a prestação de promessas de fidelidade ou que, pelo seu secretismo, não assegurem a plena transparência sobre a participação dos associados”. Manuel Soares, presidente da Associação Sindical dos Juízes, explica ao Expresso que este “é um código de conduta e boas práticas, sem força vinculativa”, mas aprovado pela classe. “Pode haver quem não concorde, mas traduz o sentimento maioritário dos juízes”, diz.

Em 2014, Teresa Leal Coelho já defendera o que o PSD voltou a propor agora: que os titulares de cargos políticos ou altos dirigentes públicos tivessem de declarar a pertença a associações, com a mesma redação que foi aplicada aos espiões. “Mas deu uma grande polémica e confusão”, recorda a ex-deputada, “tive ameaças de morte e a Judiciária chegou a fazer uma avaliação da minha segurança”. Sem condições para avançar naquela época, em pleno Governo PSD/CDS, Teresa Leal Coelho continua a dizer que “não pode haver criptopoderes, com ligações para influenciar. Pode não ser a maçonaria enquanto tal, mas há pessoas que usam lojas sob a proteção doa anonimato para isso”. E recorda que chegou a detetar um candidato a membro do Conselho de Fiscalização do SIRP que era maçon (havia muito maçons nos serviços de informações) e cujo nome acabou por ser retirado uma vez que tinha afinidades com pessoas do organismo fiscalizado.

José Adelino Maltez – que nas últimas eleições foi candidato a grão-mestre do GOL – lamenta que em Portugal a pertença maçónica não tenha proteção constitucional como acontece em França. E diz haver jurisprudência no Tribunal Europeu, contra o que PAN e PSD querem fazer, por violação do artigo 14 da Convenção dos Direitos do Homem, que proíbe a discriminação. O professor universitário e politólogo recusa a ideia da maçonaria ser secreta ou discreta: “É iniciática”, diz, referindo-se aos rituais partilhados pelos ‘irmãos’ nas lojas. “Claro que há [carreiristas]”, admite, e argumenta: “Estas campanhas são boas porque metem medo e também afugentam os que estavam lá e achavam que era uma coroa de glória”.

Apesar de defender a organização, Maltez reconhece que “a maçonaria tem má imagem social, por culpa própria, por não saber comunicar”. Por isso, compreende que em alguns meios as pessoas prefiram esconder-se e não revelar a sua filiação. “Não conseguimos controlar o efeito negativo dessa pertença”, acrescenta outro maçom que prefere o anonimato. “Já não serve para subir nos partidos”, aponta Adelino Maltez, “porque agora também acham que essa ligação queima e antes de escolherem um maçom coçam duas vezes a cabeça”. E remata: “Deixem-me ter a porta fechada para andar com a vara e a bater com o martelo. Deixem-nos lá andar de avental, qual é o problema?”