O imobilismo, uma das pragas portuguesas!

Um dos problemas mais confrangedores em Portugal, é o do imobilismo face aos diagnósticos, regularmente publicados, nos mais diversos setores da Sociedade Não é um problema de agora, é um problema estrutural, quiçá resultante da panóplia dos políticos …

‘A violência doméstica é um assunto de todos’

No Dia Internacional pela Eliminação da Violência Contra as Mulheres, a procuradora Teresa Morais fala dessa e de outras violências.

Nas vésperas do Dia Internacional pela Eliminação da Violência Contra as Mulheres, Teresa Morais, que lidera a secção Especializada Integrada de Violência (SEIVD) do Porto/Matosinhos, fala ao Nascer do SOL. Magistrada do Ministério Público desde 1990, com tarimba nesta área, reflecte sobre um tema que parece colado à pele de um país com resquícios feudais, onde e número de queixas (…)

Coordenou o livro Violências Domésticas: Novas Questões Antigas, que acaba de ser lançado. Porquê o plural (violências)?

As vítimas deste crime têm pontos comuns, mas há várias diferenças. E a violência em si mesma também se diferencia. Tendemos a ficar na violência física, quando existe uma série de atos que ‘ferem’ tanto ou mais as suas vítimas, uma vez que se trata de um crime praticado nas relações de intimidade e de confiança. Por exemplo: um filho alcoólico que vive com a mãe, que se vê forçada a dar-lhe toda a sua reforma; um idoso cujo cuidador não cuida dele e que vive sem higiene, subnutrido, etc.); uma criança que assiste ao destrate permanente entre os progenitores; uma mulher abusada sexualmente ‘porque ele é homem e tem as suas necessidades’ ou que é agredida, ameaçada ou insultada porque ‘não sabe fazer nada em casa’ ou porque, hipoteticamente, ‘tem outros’; ou ainda um homem que é anulado como pai. Todas as pessoas têm a sua história. Ora, etiquetar uma investigação como ‘violência doméstica’ esquece as especificidades de cada caso e, sobretudo, as expectativas concretas da cada vítima. Aquela mãe não quer a condenação do filho e muito menos o seu afastamento de casa, quer apenas que o obriguem a tratar-se; aquele idoso não quer ser relegado para um lar ou ter uma assistente social a entregar (…)

Então, de que falamos quando nos referimos ao crime de violência doméstica?

Este crime, fundando-se nas tais relações de intimidade, protege uma confiança específica: a de que a pessoa com quem vou partilhar um projeto de vida, com quem vou partilhar o meu espaço de intimidade ou que tem o dever de prover pelo meu desenvolvimento físico, psíquico e emocional não praticará condutas violentas de qualquer tipo.

Portugal tem uma das populações mais envelhecidas da Europa. Estamos preparados para os desafios que isso implica ou vamos ter de nos habituar às notícias de violência contra idosos?

De facto, em 2021 existiam 182 idosos (pessoas com mais de 65 anos) por cada 100 jovens até aos 15 anos. É verdade que o parâmetro de 65 anos está desfasado da realidade europeia, pois a grande maioria desta população está integrada no mercado de trabalho e é autónoma. Mas se falarmos de pessoas particularmente indefesas em razão da idade (que é o conceito da lei) e, em concreto, dos idosos (ou, como prefiro dizer, dos de ‘idade maior’), penso que estamos, inúmeras vezes, perante vítimas silenciosas ou silenciadas. Silenciadas pelo cuidador (que, muitas vezes, as mantém em isolamento). Silenciadas pelas próprias barreiras psicológicas (normalmente, o agressor é filho ou neto, pelo que é muitíssimo frequente a autoculpabilização da vítima, aquela ideia: ‘onde é que é que eu falhei?’). Silenciadas porque não há uma rede para a deteção e apoio efetivo e porque – sejamos clarosnão há respostas integradas. Não é resposta deixar estas vítimas à sua mercê (por exemplo, com a retirada do cuidador/agressor) ou desenraizá-las do local com que se identificam, onde têm a sua história, as suas memórias e onde conseguem orientar-se. Nestes casos, estamos muitas vezes perante um pedido de socorro não para si próprias mas para o agressor. Agora, a sua questão, que corre o risco de ser uma realidade, é assustadora. Faz lembrar aquelas notícias de um idoso encontrado morto ao fim de vários dias… A violência também pode ser cometida por omissão e, nestas vítimas, é necessário estar alerta sobre isso. A normalização ou banalização da violência (e aqui abranjo qualquer tipo de violência) parece-me ser o caminho de uma sociedade falha de empatia. É o caminho da desumanização.

Acha que há uma banalização da violência em Portugal?

Se falarmos na violência em geral, Portugal é dos países mais seguros. Mas se falarmos em violência doméstica, é o crime mais participado no país. Daí que possa estar muito ligado a fatores culturais, ou seja, que dentro de relações de intimidade haja alguém que supõe ter direito a tal. Dou-lhe um exemplo muito simples: vistoriar o telemóvel de outrem é uma violação de privacidade e muitos jovens não veem qualquer censura nisso. Por outro lado, estamos também perante uma questão de perceções. Há vítimas que nos dizem nunca terem sido fisicamente agredidas, mas durante a conversa ‘aparece’ um empurrão aqui, outro ali, outro acolá… Em entrevistas feitas pelo FRA (agência dos Direitos Fundamentais da UE) alguns países escandinavos aparecem no topo das manifestações de violência doméstica, o que, parece-me, tem exatamente a ver com as perceções.

Há idosos abandonados*pelas famílias, quando são eles quem, perante a crise (ou crises), mais se têm voluntariado, a recebê-las em suas casas. Qual é a resposta da Justiça para o abandono dos pais pelos filhos?

A violência contra os idosos assume várias formas. O abuso físico, de que são exemplo as agressões, a exposição ao perigo, a falta de higiene, a subnutrição ou desidratação, a sub ou sobredosagem medicamentosa. Depois, o abuso psicológico ou emocional, que se pode traduzir no isolamento, desvalorização, injúrias, ameaças, coação, violações de privacidade (mexer nos objetos pessoais, por exemplo), sem esquecer a infantilização. Em 3.° lugar, o abuso financeiro, que pode consistir em retirar-lhe parte ou a totalidade dos seus bens e recursos, utilizá-los sem consentimento, representá-la ilegitimamente na gestão patrimonial. Em 4.° lugar, o abuso sexual, como o contacto sexual não consentido ou efetuado de forma ardilosa. E, por fim, a negligência, no sentido da omissão do cumprimento, ou cumprimento inapropriado, do dever de cuidar. Muitas vezes estas formas de abuso (à exceção do abuso sexual, que não é relatado) concorrem entre si. Há casos de idosos que deambulam pela rua a pedir comida, sem higiene, sem acompanhamento médico e cujas reformas são levantadas e retidas pelos agressores. E não são poucos. Mas também casos de sobredosagem medicamentosa, em que a vítima fica inerte, sem reação e, assim, não ‘incomoda’. O maior problema é quando o agressor é o único cuidador, porque aqui, ainda que haja caminhos de investigação, não há respostas. As entidades de apoio geriátricas estão superlotadas e não me parece existir uma política de respostas integradas.

Como é que as denúncias vos chegam?

Muitos desses casos aparecem-nos por chamadas da Polícia ao local (normalmente, por vizinhos), denúncias anónimas e técnicos da Segurança Social ou entidades cooperantes. As vítimas, por si só, muitas vezes não estão sequer fisicamente capazes para chegar ao sistema ou estão impedidas de o fazer.

Como resolver este problema sem retirar a vítima de casa? 0 que acontece ao agressor?

Os casos de violência contra idosos são os mais difíceis, quer de investigar, quer de decidir. Há inúmeras variáveis: as questões que já referiu, mas também questões de saúde mental. Tudo depende, muitas vezes, de meios de apoio social extremamente escassos.

Agora, a premissa essencial ê o respeito pela vontade da vítima, que deve ser devidamente esclarecida. É, na minha opinião, um erro a adoção de uma atitude paternalista em relação a estas vítimas. Outra premissa é que, caso possível, não deveremos desenraizar estas vítimas do seu espaço e das suas memórias.

Sendo agora a violência doméstica um crime público, já se notam mudanças ao nível da denúncia por parte da sociedade civil?

Lentas, demasiado lentas. Quer ao nível da denúncia, quer da colaboração como testemunhas. Umas vezes por indiferença, outras por medo de represálias.

A violência exercida sobre homens é um assunto de que pouco ou nada se fala. Já há, no entanto, uma Casa Abrigo para homens. Parece ser revelador ou é só um adereço?

A maioria da violência nas relações de intimidade (e excluo agora as crianças e os idosos) é sobre as mulheres. Acredito, porém, que exista um considerável número de cifras negras (ou seja, de casos não participados) decorrente dessa cultura de que o homem não é frágil, ‘não chora’ – e, como tal, não recorre à Justiça. Daí que, pelo menos na SEIVD do Porto e Matosinhos, sejam residuais as denúncias de violência doméstica em que os homens são as vítimas.

Fala neste livro da questão da pena. Entende que a mesma é um óbice para uma melhor Justiça?

O Estado tem o dever de prevenir e punir, de forma dissuasora, os autores de violência doméstica. Considerando que o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos tem vindo a considerar que estamos, de facto, perante casos de tratamento desumano ou degradante, e até de tortura, uma pena igual ou inferior a grande parte dos crimes contra o património parece subverter a ordem dos valores. O furto de um telemóvel pode chegar a uma pena até oito anos de prisão, mas um agressor de violência doméstica durante vários anos tem a previsão de uma pena, no máximo, até cinco anos. E existe a regra no processo penal de que as penas de curta duração devem ser suspensas… A isto liga-se o facto de a prisão preventiva pressupor uma forte possibilidade de uma futura condenação em pena efetiva. Deste modo, quer na fase de investigação, quer no julgamento, a mensagem que o Estado tem promovido é de uma responsabilização aquém do que a gravidade dos factos exigiria.

A maioria dos autores deste livro não é da área do Direito. Isso significa que as questões de violência doméstica são mais preocupações >> de ordem médica, social e cultural do que jurídicas?

O que me interessou ou desafiou foi juntar diferentes perspetivas. Complementamo-nos e dependemos uns dos outros. Usando uma frase que escrevi no início do livro – ‘Se nos desconhecermos, não conhecemos verdadeiramente coisa alguma’ -, nenhum magistrado pode desempenhar bem a sua função achando-se autossuficiente. Ele depende dos médicos, para analisar as mazelas físicas e psíquicas (veja-se, por exemplo, as síndromes que o livro aborda). Depende dos psicólogos, para uma melhor compreensão das vítimas e dos agressores, etc. A violência doméstica é um assunto de todos. E é um crime. Se é um crime, é assunto da sociologia, da criminologia, das organizações de apoio às vítimas, etc., mas também de responsáveis por estratégias de prevenção.

Então não estaremos a exigir demasiadas respostas ao sistema judicial, no caso concreto, ao Ministério Público?

O Ministério Público, ou seja, a investigação, está no final dessa linha. Só pode atuar perante a existência do crime cometido e não pode ser olhado como a panaceia para tudo. Mas também não podemos esquecer que o modo como a vítima é recebida, protegida, compreendida e valorizada durante todo o processo judicial é fundamental para o desfecho do caso.

Deixe-me recuar a 2012/2013, quando criou o projeto *Um passo mais’, que foi pioneiro ao criar no DIAP do Porto uma equipa multidisciplinar e especializada neste tipo de crimes. Acha que já foram dados todos os passos?

Esse projeto foi isso mesmo, um caminho a percorrer. Deixe-me recorrer a Eduardo Galeano quando cita um outro autor: «A

utopia está lá no horizonte. Me aproximo dois passos, ela se afasta dois passos (…). Por mais que eu caminhe, jamais a alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar». Esse foi o mote. Na prática, a ideia foi desburocratizar procedimentos entre os diversos atores da investigação, centrando-nos no caminho essencial e implicando-nos todos, todos os dias e a todos os momentos. E deixarmos de ser ‘meros’ profissionais. O resultado foi inquéritos mais céleres, vítimas mais rapidamente protegidas e uma mensagem de incomplacência. E, segundo a entidade que avaliou o projeto (a Escola de Criminologia do Porto), verificou-se uma diminuição de reincidências; para um ano, em 70%.

Passaram 10 anos, entretanto, e foram criadas as Secções Especializadas Integradas de Violência Doméstica (SEIVD). 0 que trouxeram de novo?

É um projeto da Procuradoria-Geral da República, no cumprimento de diretivas europeias, visando a interligação entre a investigação e o tratamento das questões ligadas aos menores, designadamente, na regulação das responsabilidades parentais e na promoção e proteção das crianças. Isto porque se constatou que, apesar de alguns mecanismos de agilização de comunicação, era necessária uma resposta convergente e abrangente destas duas áreas – o crime, e a família -, no sentido de evitar, por exemplo, decisões de afastamento do agressor das vítimas no processo penal enquanto um Tribunal de Família e Menores determina um regime de visitas. Por outro lado, atuando em estreita ligação e com partilha de informação nos dois sentidos, a visão de cada caso resulta mais completa. Pena é que este projeto, com inegável mais-valia e em cumprimento de decisões europeias, esteja na prática a ser bloqueada pela calamitosa falta de funcionários (que são menos de metade do mínimo necessário). Por isso, temos uma constante sensação de estarmos a prestar um mau serviço à Justiça.

Quantos funcionários têm?

(risos) Já estivemos pior… Agora, nesta SEIVD, estão cinco a trabalhar. Deveriam estar, no mínimo dos mínimos, 14.

E inquéritos?

Desde a criação da SEIVD do Porto, em janeiro de 2020, deram entrada cerca de 8.500 Inquéritos.

Basta a falta de funcionários para que os inquéritos se acumulem. É um tempo desmoralizador para as vitimas.

Claro! São processos urgentes, processos que não param nas férias e que não pararam (e ninguém das SEIVD parou) durante a pandemia. Com aquele número de inquéritos e com o estado de exaustão e desmotivação em que os funcionários se encontram (porque se sentem completamente desvalorizados e esquecidos), não é possível pedir-lhes mais. No passado dia 17 de outubro, estavam cerca de 1.700 inquéritos com despachos por cumprir! E já não conseguem fazer o que vários deles aguentaram a fazer durante dois anos: sair às 21h e ir trabalhar pro bono ao sábado. Já que estamos a falar de violência, aqui pode-se falar de violência institucional. Mas também lhe posso falar da SEIVD de Matosinhos, onde existem várias salas fechadas (para acorrer a uma qualquer situação rara) e os procuradores têm uma única sala para ouvir as vítimas (não o podendo fazer nos gabinetes, porque os partilham) e os funcionários têm uma ‘salinha’ inumana para o mesmo efeito. Além disso, a secção administrativa da SEIVD tem perto dela a receção de todos os arguidos, polícias, etc. de todos os outros crimes. Qualquer cidadão percebe que isto é insensato e é, mais uma vez, um péssimo serviço às vítimas.

Imagino que já se tenham queixado várias vezes destas condições.

O Ministério Público já lutou por salas, mas já se passaram quase três anos e tudo está igual…

Tem havido decisões judiciais que levam a que se pense: ‘Olha, esta estava mesmo a pedi-las!’ Quer comentar?

Não posso falar de casos concretos. Mas posso dizer-lhe que tenho a sensação, até pelo que desabafam algumas delas, de que há vítimas que chegam ao fim de um processo em pior estado do que quando o iniciaram.

Ao fim destes anos todos nesta área, há algum caso que a chocou particularmente?

Lembro-me de casos de bebés abanados ou agredidos. De idosos esquecidos, com hipotermia, ou barbaramente agredidos. Apanhei casos de mulheres desfeitas, desumanizadas, com uma enorme dependência emocional em relação ao agressor. Mas também da instrumentalização de menores como ‘armas de arremesso’, onde se destroem laços de vinculação à figura paterna. Chocarmo-nos não me parece ser algo negativo; não nos chocarmos, é! Nesse dia, é preferível mudar de área de investigação.

Voltando ao livro, este começa com o caso real de uma vítima – contando como começou por desculpabilizar o agressor, depois as várias saídas de casa e os seus regressos, a apresentação da queixa e, mais tarde, a retirada. Porquê esse caso?

Porque é um caso que, dentro de uma realidade em maior número, espelha bem os sucessivos avanços e recuos de uma vítima, quer em face do próprio agressor, quer perante o sistema judiciário. Mas é, sobretudo, um caso de mensagem de esperança para as inúmeras vítimas às quais não devemos deixar de fazer acreditar que é possível dar esses ‘passos’ e viver livre de violências.

As vítimas deste crime têm pontos comuns, mas há várias diferenças. E a violência em si mesma também se diferencia

Etiquetar uma investigação como ‘violência doméstica’ esquece as especificidades de cada caso

Se falarmos na violência em geral, Portugal é dos países mais seguros. Mas, se falarmos em violência doméstica, é o crime mais

participado no país

A violência contra os idosos assume várias formas

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O Estado tem o dever de prevenir e punir, de forma dissuasora, os autores de violência doméstica

Agora, nesta SEIVD, estão cinco a trabalhar. Deveriam estar, no mínimo dos mínimos, 14

O Ministério Público já lutou por salas, mas já se passaram quase três anos e tudo está igual…

Lembro-me de casos de bebés abanados ou agredidos.

De idosos

esquecidos,

hipotermia, ou barbaramente

agredidos

Chocarmo-nos não me parece ser algo negativo; não nos chocarmos, é! Nesse dia, é preferível mudar de área de investigação

Entidades reguladoras pouco independentes

Escolha de figuras ligadas ao PS, incluindo os ex-ministros Mário Centeno e Ana Paula Vitorino, aumenta a pressão para que o Governo deixe de nomear administrações, Bancada socialista promete “decisões razoáveis

A polémica entre o primeiro-ministro e Carlos Costa veio reacender o debate sobre a independência das entidades reguladoras. Cresce a pressão para que não seja o Governo a nomear os administradores. Desde 2015 são, pelo menos, dez os nomeados com ligações ao poder político. A maioria foi recrutada em governos do PS. “Existe um problema de proximidade excessiva entre o regulador e a política” é uma das críticas mais ouvidas

A contenda entre Costas, o ex-governador do Banco de Portugal (BdP) e o primeiro-ministro, reacendeu a discussão sobre a independência e a politização das entidades reguladoras. O poder político está cada vez mais pressionado para alterar o modelo de nomeação, numa altura em que os partidos trazem o tema à liça à boleia da revisão constitucional.

O PS não se compromete com alterações, mas ‘não fecha a porta a uma revisão da lei que rege as entidades reguladoras. No entanto, não o forá sem antes levar a cabo uma “análise de fundo”, “mais fina” e “ponderada”, sobre os últimos dez anos, afirma ao NOVO Carlos Pereira, vice-presidente do grupo parlamentar do PS.

Esse processo de análise, sublinha o socialista, está ainda numa fase embrionária, pelo que o partido não está em condições de avançar com uma proposta “a priori” nem considera que as eventuais alterações a fazer se enquadrem no “argumentário” apresentado para avançar com a revisão da Constituição. Nesta fose. adianta o deputado do PS, “há uma recolha de informação junto dos reguladores” para identificar “pontos fracos” e corrigi-los. Mas isso, reforça, exige “serenidade”.

Carlos Pereira lembra que foi o PS a propor que “essa avaliação deve ser feita’ e garante que o partido está “disponível e sem qualquer complexo para avaliar qualquer situação”. “Vamos fazer essa avaliação e depois tomaremos as decisões que acharmos razoáveis para contribuir para uma melhor lei e uma melhor aplicação” da mesma, diz.

A ponderação que o PS está a começar a fazer, acrescenta ainda o deputado, estende-se, “naturalmente”, ao BdP. “Veremos, na altura própria, qual a posição que o grupo parlamentar tomara. Avaliaremos e logo tomaremos decisões sobre se há lugar a alterações ou não”, completa.

A folta de independência e o risco de interferência do poder político nas reguladoras (uma vez que cabe ao Governo nomear os conselhos de administração) são as principais questões levantadas quando o assunto é colocado em cima da mesa. “No caso do PS, isso não acontece”, garante Carlos Pereira. O PSD tem uma visão diferente e avança com alterações ao actual modelo de nomeações no projecto de revisão constitucional. Os sociais-democratas defendem que deve ser o Presidente da República a nomear o governador do Banco de Portugal, sem nenhuma interferência do Governo – uma nomeação sujeita “a audição parlamentar e com possibilidade de rejeição por voto expresso de dois terços dos deputados”. O PSD sustenta que deve igualmente ser o chefe do Estado a nomear os presidentes das demais entidades reguladoras, “sob proposta do Governo e sujeita a audição parlamentar”, lê-se no projecto.

O vice-presidente do PSD António Leitão Amaro justifica esta proposta com o que considera ser “um perigo” e uma “prática” de interferência do poder político nos reguladores e a necessidade de reforçar a independência destas entidades. “Este governo e este PS habituaram-nos a reiterados exercícios de interferência e de desrespeito da independência, como a partidarização de dirigentes”, diz ao NOVO, reforçando a crítica: “Vivemos num país onde a maioria socialista vive mal com a independência de instituições reguladoras.”

O social-democrata destaca dois exemplos: o caso da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE), reguladora que um estudo da Fundação Francisco Manuel dos Santos (FFMS) apontou como a “mais politizada” entre três analisadas, mas também a polémica em tomo do sucessor de Carlos Costa no BdP, “com a escolha do governador [Mário Centeno] vindo praticamente directo do Governo”. A somar a isso está a “chamada afectação da independência financeira”, com as cativações nas entidades reguladoras, realidade para a qual o estudo divulgado esta semana também alerta O Chega também defende mais poderes para o Presidente da República na escolha dos responsáveis das entidades reguladoras. O projecto apresentado pelo partido de André Ventura pretende que seja o chefe do Estado a nomear o governador do Banco de Portugal e “os presidentes das entidades administrativas independentes com funções de regulação”.

Já a Iniciativa Liberal defende que o governador do BdP deve ser escolhido através de um concurso “aberto e transparente”.

O diploma apresentado pelos liberais na Assembleia da República define ainda que “os membros do órgão dirigente das entidades reguladoras da actividade económica são designados após um processo concursal aberto e transparente”.

Proximidade excessiva

A possibilidade de retirar ao Governo o papel central na escolha dos nomes para as entidades reguladoras conta com o apoio do militante socialista e presidente da Associação para o Desenvolvimento Económico e Social (SEDES), Álvaro Beleza. “Portugal tem um excesso de poder no Executivo e devíamos aproveitar a revisão constitucional para corrigir esses excessos”, disse, na TVI, o antigo dirigente do PS.

Num documento sobre a reforma da regulação em Portugal, a SEDES defende a “desgovemamentalização do processo de selecção e nomeação dos reguladores”. A proposta, divulgada no site oficial da instituição, pretende dar mais poderes ao Presidente da República e ao Parlamento.

João Paulo Batalha concorda que seria “útil se alguns destes cargos passassem a ser nomeados pelo Presidente da República”. O ex-presidente da associação Transparência e Integridade não tem dúvidas de que o modelo actual abre a porta à interferência do poder político. “Existe uma tendência sobretudo com governos do PS. para nomear gente com ligações aos partidos. Há um problema de proximidade excessiva entre o regulador e a política que toma o regulador demasiado permeável a influências políticas E temos outro problema, que tem acontecido também com governos de direita, que é a proximidade excessiva entre os reguladores e os regulados e portas giratórias”, diz.

Nomeações polémicas

Foram várias as nomeações polémicas desde 2015, principalmente aquelas que envolveram antigos ministros. Contas feitas, são pelo menos dez casos de pessoas com ligações ao poder político escolhidas para exercer funções nas entidades reguladoras, embora um dos nomeados – o deputado socialista Carlos Pereira – tenha renunciado ao cargo de vogal da ERSE, depois de o seu nome ter sido chumbado pela Assembleia da República A esmagadora maioria tem ligações a governos socialistas.

Mário Centeno foi um dos casos mais polémicos. Demitiu-se do Governo a 9 de Junho de 2020 e entrou em funções como governador do BdP pouco mais de um mês depois. Polémica foi também a nomeação de Ana Paula Vitorino, ex-ministra do Mar no governo liderado por António Costa. A ex-deputada socialista foi nomeada em Agosto de 2021 presidente da Autoridade da Mobilidade e dos Transportes (AMT).

Menos mediático é o caso de Manuel Caldeira Cabral, antigo ministro da Economia de António Costa, escolhido em 2019 para vogal da administração da Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões (ASF). A presidente deste organismo é, desde 2019, Margarida Corrêa de Aguiar, ex-secretária de Estado da Segurança Social do governo PSD/CDS, liderado por Durão Barroso.

Entre os nomeados há também quem tenha sido recrutado nos gabinetes dos ministros e secretários de Estado. Para presidir a Autoridade Nacional de Aviação Civil (ANAC), o Executivo promoveu a presidente, em 2021, a vogal Tânia Simões, que foi adjunta de António Costa quando era ministro da Justiça, no governo de António Guterres.

Com o mandato de seis anos a chegar ao fim em 2023, Rogério Carvalho, vogal na administração da Entidade Reguladora da Saúde (ERS), foi assessor do ministro da Saúde do bloco central na área económica e financeira.

Entre os mais recentes nomeados para a administração da Autoridade Nacional de Comunicações (ANACOM) está também um nome com experiência na esfera do poder político: Paula Lourenço, adjunta do secretário de Estado Adjunto e da Administração Local, entre 2005 e 2009, no executivo de José Sócrates.

Para vogal do regulador da energia, o Governo propôs, no passado mês de Outubro, Ricardo Loureiro, que passou pelo gabinete do secretário de Estado da Energia, João Galamba. Quando assumir funções, junta-se a Mariana Pereira, que foi adjunta do gabinete do secretário de Estado da Energia, Jorge Seguro Sanches.

A ERSE é, de resto, apontada como a reguladora “mais politizada” quando comparada com outras duas reguladoras, a ANACOM e a Autoridade da Concorrência (AdC). “Ao longo dos mais de 20 anos de vida da entidade, 50% das nomeações para o conselho de administração correspondem a indivíduos com experiência política, na sua maioria em cargos no governo, como secretário de Estado ou membro de gabinetes governativos.”

Contudo, sobre o perfil dos administradores. o mesmo estudo ressalva que há um “equilíbrio” entre o número de “independentes” (ou não filiados em partidos políticos) e o número de nomeações de natureza partidária da mesma cor política do governo que assina a nomeação. E diz ainda que, ao nível da presidência, “existe uma tendência para que caiba a independentes, e não a antigos políticos”. *Com Filipa Matias Pereira

Vivemos num país onde a maioria socialista vive mal com a independência das instituições’

António Leitão Amaro Vice-presidente do PSD

“Portugal tem um excesso de poder no Executivo e devíamos aproveitar a revisão constitucional para corrigir esses excessos’

Álvaro Beleza Presidente da SEDES

“Existe uma tendência para nomear gente com ligações ao partido. Há um problema de proximidade excessiva entre o regulador e a política que torna o regulador demasiado permeável a influências políticas,5′ J João Paulo Batalha Vice-presidentè da Associação Frente Cívica

Mário Centeno foi uma das nomeações mais polémicas. O governador do Banco de Portugal iniciou funções um mês depois de sair do Governo

António Costa na mira

Praticamente desde que tomou posse, o Governo de maioria absoluta do PS e o terceiro liderado pelo primeiro-ministro, António Costa, tem sido sujeito a uma exposição pública e política quase constante pelo rebentar de polémicas em torno dos seus membro…

MP quer juntar corrupção no futebol

MP quer juntar ao “Cashball mais corrupção no futebol

Alexandre Panda alexandre.panda@jn.pt

Procuradora contesta decisão instrutória que retirou quatro alegadas tentativas de

€6’comprar” jogadores da Liga e recorreu. Caso começou com investigação no andebol

recurso O Ministério Público (MP) quer que os arguidos do caso “Cashball” sejam também julgados por terem tentado comprar quatro jogadores de futebol da Liga principal para favorecer o Sporting no início da época 2017/2018. A procuradora do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DIAP) do Porto recorreu da não pronúncia de um total de 11 crimes, na forma tentada. A decisão deve ser tomada nas próximas semanas pelo Tribunal da Relação do Porto.

O denunciante Paulo Silva, que servia de intermediário, o empresário de jogadores João Mira Gonçalves e o assistente administrativo principal do Gabinete de Apoio ao Jogador do Sporting, Gonçalo Rodrigues, foram acusados de 14 crimes. Mas, em maio, o Tribunal de Instrução Criminal do Porto entendeu haver indícios suficientes para pronunciar Paulo Silva por apenas três crimes de corrupção ativa, e o empresário João Mira Gonçalves e o funcionário do SCP Gonçalo Rodrigues por um crime de corrupção ativa agravada. Em causa estavam as abordagens, em abril de 2017, a dois árbitros de andebol, aliciados para prejudicar o F. C. Porto e beneficiar o Sporting no campeonato desta modalidade.

O juiz também considerou haver indícios seguros para julgar Paulo Silva por ter oferecido 25 mil euros ao então central do futebol do Grupo Desportivo de Chaves, Leandro Freire, para este “facilitar” em jogos contra os leões, deixando de fora outros 11 crimes.

A procuradora da República que está com o caso decidiu então recorrer para a Relação, pedindo que os arguidos sejam julgados por todos os crimes constantes da acusação, incluindo aqueles na forma tentada que foram invalidados pelo juiz de instrução.

O MP insiste que “os três arguidos engendraram um plano para interceder junto de juízes árbitros designados para jogos de andebol em que o Sporting fosse competidor, ou para que este fosse indevidamente beneficiado ou para que os seus competidores fossem indevidamente prejudicados, a troco de concretas quantias em dinheiro a entregar aos árbitros”. E garante ainda que o estratagema foi alargado “a jogadores de futebol de equipas de futebol contra as quais o Sporting competisse, prejudicando as suas próprias equipas a favor do Sporting, também atro- ’ co de dinheiro”.

As tentativas, vistas pelo juiz de instrução como meros atos preparatórios sem consequência penal, merecem, para o MP, ser censuradas, uma vez que apenas a última parte do plano falhou, isto é, a abordagem aos árbitros e jogadores por Paulo Silva. Todos os atos anteriores são, por isso, condutas que têm de ser qualificadas como corrupção desportiva na forma tentada, defende a magistrada.

“Tais ações levadas a cabo pelos três arguidos, em comunhão de vontade e de esforços, em obediência ao plano inicial e sem qualquer desvio a este, são verdadeiros atos de execução de crimes de corrupção ativa”, garante o MP.

O recurso do MP foi remetido à Relação há já várias semanas e espera-se, a breve trecho, uma decisão dos desembargadores. Até lá, o início do julgamento, que deverá decorrer no Tribunal de S. João Novo, no Porto, está suspenso.

Geraldes ilibado O antigo diretor desportivo do Sporting André Geraldes chegou a ser detido no âmbito do caso “Cashball”. Era suspeito de ser o cérebro do esquema, mas a investigação afastou essa possibilidade.

Quatro jogadores O MP entende que os arguidos têm de responder pela tentativa de corrupção – apesar de Paulo Silva não os ter abordado – dos jogadores Pedro Trigueira (V. Setúbal), João Aurélio (V. Guimarães), Bruno Nascimento (Feirense) e Rúben Lima (Moreirense).

Pena atenuada Por ter denunciado o caso, o arrependido Paulo Silva pode ter uma pena atenuada.

| instrução] crimes de corrupção na forma tentada não foram considerados validos pelo juiz de instrução criminal do Porto, mas o Ministério Público insiste

que foram cometidos.

Gonçalo Rodrigues era assistente administrativo principal do Gabinete de Apoio ao Jogador do Sporting na era de Bruno de Carvalho

CPAS: todos concordam com a necessidade de reestruturação mas falta saber com que custos

A reestruturação do sistema de previdência dos advogados é considerada necessária, mas é preciso encontrar uma solução que impeça uma ruptura entre diferentes gerações

A Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores (CPAS) é o sistema de segurança social que serve as duas classes e encontra-se numa encruzilhada, na altura em que cumpre 75 anos de existência, estando em causa a sua sustentabilidade.

No final do ano passado tinha 36.032 beneficiários contribuintes e, apesar de ter registado um resultado positivo de 467 mil euros, o montante recebido de contribuições (97,1 milhões de euros) foi mais baixo do que o valor de pensões de reforma pagas (103,2 milhões) e inferior ao custo global de pensões e de subsídios pagos (110,9 milhões).

Questionados, os candidatos a bastonário da Ordem dos Advogados são unânimes em considerar necessária uma reestruturação, mas ó problema é saber como pode esta ser feita garantindo direitos e evitando uma ruptura geracional.

“É, de facto, um problema muito sério, mas que. por isso, não pode ter uma solução simplista, como a consagração por referendo de um sistema de opt-out que nenhum deputado no Parlamento está hoje disposto a aceitaf, afirma ao NOVO Menezes Leitão. “Os advogados portugueses foram levados a propor uma solução referendada para a previdência que não é exequível. Votaram maioritariamente a favor da liberdade de optar pelo sistema de previdência que desejem, quando os números e as contas dos últimos exercícios da CPAS não permitem tal solução”, alerta António Jaime Martins.

Menezes Leitão aponta que há estudos em curso no Parlamento para analisar a possibilidade de integração da CPAS na Segurança Social, mas alerta que, se essa solução for adoptada, “é necessário garantir que os interesses dos advogados não são prejudicados’. “Os advogados, que são cidadãos como qualquer outro, têm de ter direito às mesmas regalias e benefícios de qualquer outro cidadão. E com a sua previdência independente”, defende Rui da Silva Leal.

Além disso, como diz Varela de Matos, tem de ser obrigatoriamente alargada a protecção na doença aos advogados com urgência e concedidas licenças de parentalidade aos advogados. “A caixa tem de ser reformada, deixando de ser apenas uma caixa de reformas e passando a ser uma caixa assistencial. para que os advogados não sejam tratados como cidadãos de segunda”, defende.

Fernanda de Almeida Pinheiro acusa que o tema é central e que tem sido “empurrado com a barriga”, evitando-se uma solução. Considera que, após o referendo de Julho de 2021 em que 53% dos votantes decidiram que os advogados deveriam poder escolher entre a CPAS ou o sistema de Segurança Social, “cabe agora à classe exigir ao poder político que cumpra com a vontade soberana dos interessados e que lance os alicerces necessários para permitir a implementação desta decisão”.

Para Paulo Valério, há que “encontrar um compromisso entre todas as gerações de advogados, permitindo corrigir as insuficiências”, como a falta de soluções de assistência quando se compara com o sistema de Segurança Social “Caso contrário, a CPAS está morta e o caminho é a integração de todos na Segurança Social”, avisa.

O problema é encontrar os termos do compromisso, sobretudo quando, alerta Paulo Pimenta, “a preocupação imediata dos advogados contribuintes, principalmente dos mais novos, não é tanto o valor das reformas que virão a receber, mas sim o valor elevado das contribuições a cujo pagamento estão vinculados, mesmo no escalão inferior. Há iniquidade no modelo vigente”.

O TC, o Chega e o PCP.

Ao contrário do ‘Chega’, cujos estatutos foram ‘chumbados’ pelo Tribunal Constitucional, por favorecerem, alegadamente, a concentração de poder em André Ventura, o PCP não tem razões de queixa e pode escolher o sucessor de Jerónimo de Sousa em ‘petit c…